A Intervenção da
Marinha Mercante Portuguesa no Mediterrâneo
A Rota de Salónica
A Bulgária, que pertencia à aliança
das potências centrais, desde 1915 que intervinham na frente sérvia, no
sul do país e na zona da Macedónia. Tiveram vários sucessos e
conseguiram impedir que os ingleses e os franceses avançassem a partir
de Salónica (Grécia) até à Sérvia. Na época a Alemanha não se encontrava
em posição económica e militar que permitisse deslocar abastecimentos e
tropas suficientes para apoiar a Bulgária, num ataque directo sobre a
Grécia para eliminar as posições da Entente ao redor de Salónica.
Em 1916, a Alemanha reviu a situação
e apoiou um avanço búlgaro sobre a Grécia, tendo fornecido inclusive
tropas dos seu aliado. Sem derramamento de sangue, as forças gregas
entregaram aos búlgaros o Forte Rupel, no rio Struma, ao noroeste de
Salónica, em Maio de 1916. Mais tarde, mas ainda em 1916, o exército
búlgaras ocupou uma vasta área Grécia Setentrional, incluindo Drama,
Kavala e Seres. Nesta situação o porto de Salónica transformou-se no
principal porto de abastecimento de toda a Entente.
Anteriormente, em Fevereiro de 1916,
Portugal tinha feito o arresto dos navios mercantes das Potências
Centrais que se encontravam surtos nos seus portos. A beligerância
directa com a Alemanha no teatro europeu tornara-se um facto e a
necessidade de utilização dessa capacidade mercante urgente.
Em Outubro de 1916, a Entende a
partir de Salónica passou à ofensiva e conseguiu tomar aos
búlgaros parte a Macedónia Meridional – incluindo a cidade de Monastir e
a fortaleza de Tatrakan, que constituíram as únicas perdas importantes
do exército búlgaro até o final da guerra, tendo mantido sempre uma
forte resistência na Macedónia ocupada e inclusivamente substituíram as
tropas alemãs e austro-húngaras que ocupavam a Sérvia, quando a Alemanha
começou a concentrar os seus exércitos para a sua ofensiva final da
Primavera de 1918, na frente ocidental.
Neste contexto a Marinha Mercante portuguesa
contribuiu para o esforço de guerra do exército francês ao ser
requisitada para intervir nos comboios de abastecimento para aquela frente de
combate, a chamada "Frente Mediterrânea". As missões de transporte de abastecimentos: combustíveis,
munições e viveres, tinham como rota um trajecto entre o porto de
Marselha (França)e o porto de Salónica (Grécia), a qual foi mantida
desde 1916 até ao final da guerra em Novembro de 1918.
Devido à
ameaça dos submarinos no Mediterrâneo, os navios mercantes eram
organizados em comboios escoltados por contra-torpedeiros (destroyers),
como táctica para dificultar os ataques dos submarinos. Por volta de
1918 as escoltas também já se encontravam equipadas com hidrofones e
cargas de profundidade, o que começava a permitir atacar os submarinos
enquanto estes se encontravam submergidos. Contudo a utilização de
"comboios" trouxe problemas no que se relaciona com o fluxo de
abastecimentos, uma vez que os navios permaneciam muito mais tempo
parados nos portos a aguardar que o o
"comboio" fosse organizado. Este problema não se colocava aos
transportes de tropas, onde eram utilizados navios de transporte mais
rápidos que os submarinos.
O Navio Mercante "Alentejo"
O navio mercante "Alentejo", antigo "Uckermark",
de 4.399 toneladas foi incorporado nos Transportes Marítimos do Estado
em de 1916, Decreto 2.243 de 1 de Março de 1916. Foi posteriormente
designado pelo Governo Francês para o apoio logístico à frente de
combate de Salónica. O "Uckermark" era um navio recente, lançado à água
em Setembro de 1911 e pertencia à companhia alemã "Hamburg-amerika Linie".
Novembro de 1916
Existe um registo de desembarque de
material aeronáutico no porto de Salónica, em Novembro de 1916. Esteve
acostado ao porto durante os dias 12 e 13 e desembarcou a seguinte
carga: Com destino ao parque de aviação os aviões Nieuport n.º 1.011 e
1.030, 13
13
barris
"Novaria",
produto de
revestimento
de entretelas das
aeronaves
entretelas
(2.600
l),
dois barris
de
terebintina
(75 l)
e dois
barris de
óleo de linhaça
(85
l).
(9)
Julho de 1917
Existe um segundo registo, datado de 4 de Julho de 1917, que indica que
a quebra de equipamento durante o processo de descarga provocou uma
explosão seguida de incêndio. (10)
Na acção tomada pela equipagem
durante o incêndio no navio, enquanto executava o salvamento de parte da
carga que incluía explosivos, o ministro da marinha francesa ofereceu
dez reconhecimentos entre Cruzes de Guerra e Louvores, realçando em
particular o comandante do navio, o Capitão Magalhães.
Setembro de 1917
Existem algumas referências em
relação à última viagem do "Alentejo", extraídas do "Journal des Marches
et Opérations" do 63º Regimento de Artilharia, Secção 63 da 75 Automóvel
(Exército Francês)
O "Alentejo" encontrava-se aportado
em Itéa, no golfo de Coríntia, no dia 29 de Agosto de 1917, quando a
Secção 63, da 75 Automóvel, do 63º Regimento de Artilharia do Exército
Francês embarcou neste navio.
A 3 de Setembro deu-se um incêndio a
bordo do "Alentejo" já a algumas milhas de Marselha, mas a carga foi
salva e o navio chegou até ao porto de Marselha.
A 23 de Setembro, acostado ao porto
de Marselha deu-se uma explosão a bordo, derivada de uma suposta
sabotagem, e o "Alentejo" acaba por se afundar e ser dado como perdido a
24 de Setembro de 1917.
Posteriormente, e ainda em 1917, o
Governo francês manda colocar o navio a flutuar. Depois de reparado foi
colocado a navegar sob o pavilhão francês com o nome de “Victorieux”. As
fotos revelam o estado em que ficou o "Alentejo" e foram tiradas logo
após a colocação a flutuar para envio para reparação.
O Navio Mercante "Horta"
O navio mercante "Horta", antigo "Schaumburg",
um dos 33 navios cedidos à Casa Furness
Withy & Cª(Decreto
2243, de 1 de Março de 1916), foi designado pelo Governo Francês para o
apoio logístico à frente de combate de Salónica.
Partiu do porto de Cherburgo (França
- Atlântico) sozinho, com o pavilhão português, comandado pelo Capitão
Luiz Cristiano e chegou a Salónica a 17 de Janeiro de 1917. Neste porto,
enquanto aguardava pela formação do comboio de regresso foi atacado por
um bombardeiro nocturno que lhe lançou uma bomba que embateu as uns
escassos metros de onde se encontrava atracado. A 10 de Fevereiro de
1917, e formado o comboio, partiu em direcção ao porto de Marselha. A
meio caminho foi atacado por um submarino que lançou um torpedo sobre o
comboio, sem ter acertado em qualquer um dos navios que o compunha,
obrigando todos a refugiarem-se na Baía de Milo. Continuada a viagem, o
"Horta" recebeu ordem para sair do comboio e dirigir-se sozinho para
Tunes e Bizerta na Tunísia.
Em 8 de Março de 1917, largou de
Bizerta em direcção a Salónica, num comboio formado por navios de
comércio de de guerra. Por ser uma zona muito perigosa os navios de
guerra tomaram uma velocidade que o "Horta" não conseguia acompanhar,
tendo ficado sozinho, o que obrigou a navegar aos ziguezagues e de luzes
apagas de noite. Chegou a Salónica a 15 de Março. O esforço que tinha
sido imposto no andamento obrigou a que o navio entrasse em reparação e
desligasse as caldeiras no porto de Salónica, procedimento que era
proibido naquele porto. Passado o conflito que gerou esta situação entre
o comandante do navio e a intendência do porto, o "Horta" voltou a
partir a 21 de Março de 1917 para Marselha. Foi nesta viagem que a
"Horta" viu afundar-se o navio "Porto Santo", que seguia consigo no
mesmo combóio, vítima de torpedeamento.
A 12 de Abril de 1917, enquanto era
carregado com latas de gasolina por prisioneiros alemães, deflagrou a
um incêndio seguido de uma explosão. Neste acidente ou sabotagem, morreu
o tripulante Florêncio Alegria Subtil e ficaram feridos mais seis
marinheiros. Por causa esta situação o "Horta" não partiu com o restante
comboio a 13 de Abril. Os outros três vapores que constituíam o comboio
tinham sido atacados por submarinos e sofrido perdas. O marinheiro João
Fernandes Rocha foi louvado na ordem de serviço da Marinha francesa pela
sua actuação no salvamento de camaradas feridos e no combate ao
incêndio.
Durante o período de reparação do
navio em França, em Salónica houve em Agosto de 1917, um grande
incêndio, que durou três dias, que destruiu praticamente todo o centro
da cidade. Mais de 2 mil edifícios pertencentes a judeus foram
destruídos, inclusive a sede do Rabinato, 32 das 34 sinagogas e o prédio
da Alliance Israélite, assim como quase todas as escolas, clubes,
bibliotecas e sedes de instituições culturais e filantrópicas. Das 73
mil vítimas que perderam tudo, 52 mil eram judeus, que passaram a viver
em tendas improvisadas, na periferia da cidade. Milhares deles deixaram
a Grécia em direcção à França, Itália, Alexandria e Eretz Israel. O
incêndio não atingiu a zona portuária.
A 5 de Novembro o "Horta" estava
novamente pronto a partir rumo a Salónica, para transportar víveres e
material de guerra. Por esta altura o Mar Egeu já tinha a fama de ser o
"cemitério dos navios". Primeiro dirigiu-se a Sidi Abdala (Tunísia) onde
se juntou a outros navios para constituir um comboio. A 25 de Novembro
partiram e quando passavam em frente a Marsa Scirocco (Malta), foram
atacados por um submarino alemão. Após o primeiro torpedo todos os
transportes se refugiram no porto de Marsa e a escolta que era composta
por navios americanos, franceses e ingleses, mais a aviação que partiu
da ilha, pesquisaram e bateram a tiro toda a área onde se suspeitava que
o submarino poderia se ter escondido.
O "Horta" continuou a fazer o
transporte de mercadorias entre Salónica e Marselha, ou entre Bizerta e
Salónica, até que em 14 de Março de 1918 voltou a ser atacado por um
submarino.
A 9 de Agosto de 1918, o navio
navegava pelo Mediterrâneo rumo a Salónica integrado num comboio, quando
um torpedo lançado de longe atingiu o casco do vapor um pouco acima da
linha de água, fazendo uma enorme explosão. De imediato ouvia-se os
canhões dos navios de escolta a bombardear a zona onde se pensava que o
submarino se encontrava. Da explosão morreram de imediato sete
homens e mais três posteriormente devido aos ferimentos. O "Horta"
afundava-se lentamente, enquanto o caça-minas francês 1504 recolhia os
náufragos, entre eles o comandante do navio capitão Luís Cristiano, para os levar posteriormente para La Vallete
(Malta), de onde foram conduzidos para Lisboa onde chegaram em Setembro(3).
O "Horta" foi afundado pelo submarino
UC73, comandado por Franz Hagen, pertencente à flotilha n.º 1 (Mittelmeer
I Flotilla) com base em Pola1,
na Baía de Cattaro, Dalmácia. Esta base de submarinos era a segunda mais
importante base naval dos austro-húngaros e a principal para os alemães,
no Adriático. A base naval chegou a albergar 40 submarinos no início de
1917.
Outros navios nacionais que foram
afundados no Mediterrâneo:
-
"Porto Santo", afundado em 29 de
Março de 1918, U-Boat (UC37), junto a Milos
-
"Aveiro", afundado em 9 de Abril
de 1918, U-Boat (UB53), junto a Malta
-
"Madeira, afundado em 7 de
Outubro de 1918, U-Boat (UB105), junto à Sardanha
-
"Sagres", afundado em 16 de Abril
de 1917, U-Boat (UC37), junto ao Cabo Branco
-
"Tungue", afundado em 27 de
Novembro de 1917, U-Boat (UB51), junto a Porto Said
|
Intervenção da
Marinha Mercante Portuguesa no Oceano Atlântico.
A Marinha Mercante garantiu as
comunicações e os transportes de tropas entre as ilhas da Madeira,
Açores, Cabo Verde e Continente, assim como com as colónias de África.
Apoiou o esforço de guerra inglês e francês, e manteve o comércio com os
países neutros europeus e americanos.
As principais rotas mercantes, e de
transporte de tropas, a partir de Junho de 1917 passaram a utilizar o
sistema de comboios, para minimizar os ataques de submarinos. O sistema
teve bastante sucesso, uma vez que dos 16.539 navios escoltados em
comboios, apenas 154 foram torpedeados. Com este sistema de defesa os
Estados Unidos ao atravessarem as suas tropas para a Europa, através do
Atlântico, num total de 1.100.000 homens, apenas perderam 637 por
afogamento.
As principais rotas foram:
-
Estados Unidos (Nova Iorque) -
Inglaterra, via Açores, (1.619 navios)
-
Canadá (Halifax) - Inglaterra,
Atlântico Norte (556 navios)
-
Austrália/Nova Zelândia -
Inglaterra, via Panamá/Açores (1.432 navios)
-
Brasil (Rio de Janeiro) -
Inglaterra, via Cabo Verde/Dakar, (305 navios)
-
Índia/África do Sul - Inglaterra,
via Cabo Verde/Dakar, (1.017 navios)
-
Índia - Inglaterra, via Porto
Said, (344 navios)
-
Gibraltar - Inglaterra, (1.732
navios)
-
Rússia (Murmansk) - Inglaterra
(alguns navios)
Onde se transportou os abastecimentos
necessários aos civis e militares. Da Inglaterra partiram igualmente
7.005 navios em combóio, entre 1917 e 1918.
Os comboios navais eram formados por
transportes, que podiam ser de mercadorias (abastecimentos) e, ou de
passageiros (transporte de tropas). Normalmente eram escoltados por
navios de guerra, tipo cruzadores, contratorpedeiros, canhoneiras
e outros navios armados, que envolviam os navios de transporte, por
forma a detectar os submarinos. Alguns barcos chegavam a utilizar balões
com observadores, para poderem detectar mais longe as esteiras dos
submarinos e dos torpedos. Havia um dos navios de guerra que que
era o comandante do combóio e que dirigia a rota, a velocidade e as
acções de defesa. Os navios armados tinham como principal função a
defesa próxima dos transportes, enquanto os navios de guerra, que
normalmente patrulhavam o perímetro exterior do combóio, tinham como
missão o ataque directo aos submarinos(2).
Na Rota dos
Estados Unidos - Inglaterra: O Navio Mercante
"Argo"
Mas muitos navios continuavam a
viajar solitários, como o "Argo" que vinha dos Estados Unidos (Nova
Orleans) com rota marcada para Londres (Grã-Bretanha) e foi atacado pelo
submarino U46, do comandante Leo Hillebrand, em 23 de Março de 1917. O
"Argo" foi parado pelo submarino, que ordenou à tripulação que passassem
às baleeiras, tendo após identificado o navio, mandado que os
marinheiros alemães colocassem bombas a bordo e o detonassem.
O
comandante alemão deixou partir os 23 náufragos nas duas baleeiras do
"Argo". As baleeiras acabaram por se separar no mar, tendo uma delas, no
dia 26, conseguido chamar a atenção de navio hospital inglês "Goorcka",
que regressava de Salónica para Inglaterra, com feridos a bordo.
Os náufragos da baleeira foram recolhidos pelo navio, tendo procurado de
seguida exaustivamente pela outra baleeira, que não foi encontrada.
No
entretanto, a baleeira onde se encontrava o comandante chegou pelos seus
meios, também no dia 26, ao porto de Ferrol (Espanha). Os náufragos que
chegaram a Inglaterra (Avon-Mouth), foram repatriados para Lisboa,
abordo do cruzador-auxiliar "Pedro Nunes" a 12 de Maio de 1917.
Na Rota da
Índia/África do Sul - Inglaterra: O Navio Mercante "Machico"
A 28 de Junho
de 1916 o capitão Afonso Vieira Dionísio, comandante do navio "Machico",
teve ordens para transportar para a Baía de Palma (Moçambique), reforços
de tropas e de material de guerra para a 3ª expedição a Moçambique,
comandada pelo general Ferreira Gil. Chegou ao seu destino a 9 de
Agosto.
Durante o mês
de Setembro o navio efectuou transporte de tropas, munições,
abastecimentos e de doentes entre os portos de Moçambique.
Em Outubro
dirigiu-se de Lourenço Marques (Moçambique) para Madagáscar, porto de
Manjuga, para cumprir uma missão de abastecimento para as tropas
francesas na Europa. Seguiu de Madagáscar para Bordéus, com escalas na
cidade do Cabo (África do Sul) e na cidade de Lisboa. A passagem do
Índico para o Atlântico fez-se se problemas e se indicação da presença
de submarinos. Junto à costa de Angola passou a navegar com o navio
"Portugal" na sua esteira, com um distanciamento de aproximadamente 80
km.
No dia 14 de
Novembro, quando o "Machico" deixou de ter à vista Gran Canária avistou
um submarino alemão e de imediato navegou a todo o vapor para longe do
inimigo. Sofreu dois disparos próximos que não o atingiram, assim como
viram passar muito perto a esteira de um torpedo.
Toda a
tripulação, excepto o pessoal da máquina e do fogo, se dirigiu para as
baleeiras. A toda a velocidade, única manobra que lhe estava ao alcance,
afastou-se do submarino em direcção à terra para impossibilitar a
perseguição do submarino.
Comandante Afonso Vieira Dionísio
Vapor "Machico" (ex-vapor
alemão Colmar)
O capitão
Afonso Vieira Dionísio defendeu o "Machico" como quando, anteriormente
junto a Bordéus, ao comando do navio "Gaza", também tinha mostrado que
não se deixava apreender ou afundar facilmente, navegando directamente
sobre o submarino alemão obrigando-o a mergulhar de emergência, tendo
ficado inclusivamente suspeitas que o teriam danificado, dado o
aparecimento de de óleo à superfície(4).
Com o aumento
do número de disparos do submarino alemão, o comandante lançou um SOS,
com as coordenadas da posição, mas não deu ordem de lançar as baleeiras,
executando manobras defensivas, em ziguezague, como tinha treinado nos
comboios navais. O navio conseguiu alcançar 15 nós, velocidade que lhe
permitia afastar-se do submarino, mas que o ainda mantinha ao alcance
dos canhões inimigos. Entretanto, o navio "Portugal", ao ser avisado
pelo "Machico" afastou-se do local e um navio de guerra inglês indicou
ao "Machico" que o ia socorrer. O submarino alemão era o UC20 comandado
por
Franz Becker.
O "Machico"
acabou por se libertar da perseguição inimiga, não chegando a ver o
navio de guerra inglês. Tentou fundear no porto de Mogador (Marrocos),
mas não lhe foi autorizado. Encontrou um rebocador francês que o
orientou na travessia nocturna do Cabo de S.Vicente. Chegou a Lisboa a
20 de Novembro, assim como o "Portugal". Conseguiu finalmente chegar a
Bordéus no final do mês, cumprindo a sua missão. Pelo acto heróico o
capitão Afonso Vieira Dionísio recebeu, por Decreto do Diário do Governo
de 24 de Setembro de 1919, a condecoração de "Torre Espada de
Valor, Lealdade e Mérito"(5).
Ilustração Portuguesa 1916, N.563,
P.456
Na Rota Nacional
entre Moçambique e Lisboa: O Navio de Transporte "Mossâmedes"
Em Fevereiro de 1917, encontrava-se
fundeado na baía do Porto Grande, em são Vicente (Cabo Verde) o navio "Mossâmedes"
da Empresa Nacional de Navegação, comandado pelo comandante Capitão
Botelho. Vinha do Norte de Moçambique, Porto Amélia, com passageiros
civis e um contingente de quase 500 militares que regressavam a Lisboa.
Enquanto se encontrava no Porto
Grande para reabastecimento, no navio com bandeira inglesa "Paraná"
deu-se um caso de insubordinação que obrigou a intervenção de tropas
portuguesas, a pedido do Cônsul britânico, para sanar a situação.
Chegou-se a temer o contágio da insubordinação às tropas portuguesas no
"Mossâmedes", mas esta permaneceram observantes. O que aconteceu de
seguida foi que a tripulação e os civis se recusaram a seguir para Norte
(Lisboa) sem uma escolta de navios de guerra.
Como não haviam meios para efectuar a
escolta, o "Mossâmedes" foi armado com três peças de 76mm e uma peça de
47mm, que existiam de reserva em São Vicente, e ainda, guarnecida
com com um sargento e praças do exército para o manejo das peças de 76mm
e um sargento e praças da marinha para o manejo da peça de 47mm. Houve,
ainda um reforço de seis baleeiras grandes.
Como a recusa de navegar para Norte
se mantinha, ao fim de 15 dias, tripulação foi ameaçada de ser desembarcada sob
prisão para julgamento e substituída pela guarnição do "NRP Beira" que
conduziria o "Mossâmedes" até Lisboa. A recusa da
tripulação foi entretanto resolvida, através da coacção dos oficiais da
"NRP Beira" e da "NRP Ibo" que os convenceram a partir para Lisboa.
Refira-se que a possibilidade de ser atacado por submarinos alemães
durante a viagem era real e de larga probabilidade, tanto mais que
existiam alertas de presença de submarinos inimigos entre Pernambuco e
São Vicente. Por questões de segurança o "Mossâmedes" acabou por se
desviar para Ponta Delgada (Açores) antes de rumar a Lisboa. (8)
Na Rota Nacional
entre Moçambique e Lisboa: O Navio de Transporte "Moçambique"
A 25 de Setembro de 1918, partiu de
Lourenço Marques com 952 passageiros: 558 militares, 15 prisioneiros
alemães e 379 civis, e 133 tripulantes. Os militares eram tropas
repatriadas das expedições a Moçambique. O navio era comandado por
Alberto Harberts.
O navio apanhou bom tempo e mar chão
até à Cidade do Cabo, onde chegou no dia 29 de Setembro. Aí ficou
acostado até às 23h e 30mn, do dia 30 de Setembro. Por questões de
segurança, refira-se o perigo de submarinos alemães, a partida
efectuou-se durante a noite.
A viagem manteve-se sem problemas até
dia 4 de Outubro, quando apareceram os primeiros casos de gripe, que
logo tomaram a forma de pneumónica. Os sintomas eram: Fervores, bolhas
finas e grossas, focos de hepatização, epistaxis, pontadas na região
epigástrica, febre entre 39º e 40º, dores nas articulações, língua
saburrosa, tosse contínua, garganta inflamada e cefalgia. Depois de
invadidos os pulmões as vítimas vomitavam sangre negro e pus, e morriam
ao fim de poucas horas asfixiado e denegrido.
A pneumónica tinha sido apanhada no
porto da Cidade do Cabo, onde acabou por matar cerca de 600 pessoas.
A incidência dos casos de pneumónica
foram superiores no convés da 3ª classe, onde se encontravam os
soldados, não só pelas condições de higiene e pelo espaço apertado em
que os beliches se encontravam encostados, como estes homens vinham da
guerra prostrados, cansados e doentes.
A bordo
existiam apenas 2 médicos, o médico de bordo Dr. Peão Lopes e o
Capitão-médico Alexandre Rola Pereira.
No dia 6 de Outubro aconteceu a
primeira vítima mortal, António Gouveia, 1º Cabo do Regimento 29, de
Braga.
No dia 7 de Outubro mais duas
vítimas, João António de Araújo, Soldado do Regimento 29, e o
prisioneiro alemão John Baptist Paulus.
No dia 8 morreram dois soldados e a
filha menor de um passageiro de 2ª classe, Amélia Olga de 14 meses,
filha de Emílio Augusto Neves Guerreiro.
No dia 9
morreram 1 civil, 14 militares e 2 prisioneiros de guerra alemães.
No dia 10 morreram 33 militares, 1
passageiro de 3ª classe, 1 prisioneiro alemão.
No dia 11 morreram 43 pessoas e
existiam centenas de outras doentes.
No dia 12 morreram 23 pessoas,
tendo-se verificado uma melhoria geram dos doentes. Neste dia houve uma
reunião entre os médicos e comandante do vapor para decidirem sobre o
que fazer.
"Hoje reuni os
meus oficiais e os médicos e disse-lhes que era chegado o momento de
decidirmos se convinha arribar a S. Vicente ou não. Expus-lhes as
condições em que estávamos, isto é, que tínhamos somente 10 dias de
carvão, estando a 800 milhas de S. Vicente, que, segundo as instruções
que tinha, me diziam não haver carvão em Cabo Verde, nem em Dakar. Que
como era natural, aquele porto poucos socorros poderia oferecer, pois
tendo em vista o carácter infeccioso da doença existente a bordo,
estariam limitados a dar a assistência carecida. Face a essa
contingência, não podíamos sujeitar-nos pois que à mínima demora ali,
nos faltaria o combustível, que não podíamos refazer naquele porto.
Nesta conformidade disse-lhes que tinha resolvido fazer a viagem
directamente para Lisboa, poupando na derrota directa cerca de 500
milhas, tendo em consideração que os avisos de todas as estações
Radiotelegráficas davam estas zonas presentemente livres de submarinos.
Os meus oficiais e os médicos concordaram com a minha resolução,
soltando rumo directo a Lisboa." (diário de
Bordo do Comandante A.Harberts)
(11)
No dia 13 morreram 20 pessoas
No dia 14 morreram 16 pessoas,
incluindo o comissário de bordo António da Fonseca e o criado João de
Deus Vaz, que são os primeiros tripulantes a morrerem
No dia 15 morreram 9 pessoas, dois
civis e 7 soldados.
No dia 16 morreram 4 pessoas, dois
civis e dois militares. Ainda apareciam casos novos de infecção.
No dia 17 morreram 10 pessoas.
No dia 18 morreram 4 pessoas.
No dia 19 morreram 6 pessoas, dois
civis e quatro militares. Estes foram os últimas vítimas da peste.
No dia 20 de Outubro de 1918 o vapor
avista o Cabo Espichel e de seguida o Cabo da Roca. Passa por Cascais às
4 horas e 40 minutos e às 6 horas e 10 minutos fundeia perto de Belém.
Ao longo desta viagem foram deitadas
ao mar 193 pessoas: 173 soldados, 4 sargentos, 3 prisioneiros alemães,
11 passageiros e 2 tripulante. O vapor passou para perto da margem sul,
junto ao Lazareto de Porto Brandão. Alguns militares lançam-se ao rio e
fogem para Almada e os que ficam a bordo esperam mais três dias até que
vai a bordo um médico vindo de Lisboa. Quando o médico regressa a Lisboa
traz ainda consigo mais 7 mortos.
A epidemia de pneumónica termina a
bordo do "Moçambique" com um total de 200 mortos. O comandante Alberto
Harberts foi condecorado com a Torre e Espada pela coragem demonstrada e
por ter conseguido cumprir a sua missão em tão difíceis condições.
(12)
Na Rota Nacional
entre o Continente e os Açores: O Navio de Transporte "San Miguel"
No final de Julho de 1918, o navio "San Miguel" partiu de
Lisboa, rumo aos Açores, comandado pelo Capitão-tenente Henrique Corrêa
da Silva, antigo comandante da "NRP Ibo", para uma viagem que
constituiria a base de um périplo que o Alto Comissário General Simas
Machado, antigo comandante de Brigada no CEP, iria fazer em visita
oficial ao arquipélago, durante aquele Verão. Entre Lisboa e Ponta
Delgada foi comboiado pelo "NRP Almirante Paço d'Arcos", sem incidentes,
tendo chegado a 4 de Agosto.
Iniciou-se um conjunto de viagens entre ilhas, em que
algumas foram escoltadas pela canhoneira "NRP Ibo", à data já equipada
com uma peça de 76mm em caça, cargas de profundidade e uma pintura de
camuflagem artística de azul às ondas.
Os primeiros alarmes de submarinos alemães, surgiram em
Setembro de 1918, quando foram avistados três junto à ilha de Santa
Maria. A 11 de Setembro um avião americano detectou um submarino alemão
a 24 Km a Sul de Ponta Delgada e a 20 e 24 de Setembro houveram novos
alarmes. Entretanto o "San Miguel" continuava as suas viagens entre
ilhas, tendo em 3 de Outubro regressado a Ponta Delgada.
A 6 de Outubro, o caça-minas "NRP Celestino Soares", que
na altura comboiava o "San Miguel" emitiu uma
mensagem de avistamento de submarino inimigo, às 19h 39mn, mas com o
anoitecer conseguiram afastar-se do inimigo. Entretanto, foi enviado do
porto a canhoneira "NRP Ibo" em auxílio ao combóio, tendo todos
regressado sem novos alarmes.
A 13 de Outubro o "San Miguel",
quando efectuava nova viagem de Lisboa para Ponta Dengada, com escala na
Madeira, zarpou ao pôr do sol, do porto do Funchal, para se deslocar sob
a protecção da noite, comboiado pelo escolta "NRP Augusto de Castilho".
Pelas 6h e 15mn, do dia seguinte, o submarino alemão U-139,
sob o comando de Lothar von Arnauld de la Perière, abriu
fogo sobre o "San Miguel". Foram ouvidos em TSF a seguinte mensagem: "SOS
SOS SOS de San Miguel", 35 35 N 22 10 W 07 14, cannone San Miguel, SOS
SOS SOS de San Miguel, 35 35 N 22 10 W 07 14, attacked by submarine San
Miguel".
Dos navios americanos, e franceses,
que se encontravam no porto de Ponta Delgada não saiu qualquer socorro
ao comboio. Foi o "NRP Ibo", assim que obteve pressão nas caldeiras, que
partiu em socorro, mesmo com os paióis de carvão quase vazios, mal davam
para percorrer os 380 Km que o separavam da posição do "San Miguel". A
mensagem de socorro do "San Miguel" indicava que tinha fugido do
submarino em direcção a Oeste e nessa altura navegava sozinho a coberto
da noite. O "NRP Augusto de Castilho" tinha ficado para trás a combater
gloriosamente até ao fim contra o submarino inimigo, conseguindo com o
seu sacrifício salvar o "San Miguel", os 54 tripulantes, os 206
passageiros e a carga.
No dia seguinte, 15 de Outubro, a "NRP
Ibo" pelas 15 horas avistou uma coluna de fumo ao alto para o céu e às
15 horas chegou ao encontro do "San Miguel". O paquete "San Miguel"
estava salvo e foi comboiado pela canhoneira até ao porto de Ponta
Delgada, onde chegou em segurança à 1hora e 15 minutos do dia 16 de
Outubro.(6)
Os comboios navais -
Escolta formada por navios mercantes: O Navio de Transporte "Viana"
Por vezes os comboios navais, por
falta de escoltas disponíveis, eram auxiliados por navios de transporte
armados. Neste tipo de serviço encontramos o vapor "Viana", de 1.792
toneladas , antigo navio alemão "Mailand", apresado a 16 de Fevereiro de
1916 em Lisboa, e posteriormente armado com duas peças de
90mm.
Registam-se duas escoltas efectuadas,
uma a um navio mercante inglês que vinha da Austrália com 10.000
toneladas de farinha, desde Leixões para Bordeus, e um navio Grego de
Leixões para S.João da Luz, durante o primeiro semestre de 1918.
Na primeira viagem entre Leixões e
Bordeus, depois de descarregar em Bordeus seguiu para Cardiff, onde foi
integrado num grande combóio de 32 navios de várias nacionalidades,
escoltado por dois contratorpedeiros e quatro caça-minas, que seguiam
destino ao mediterrâneo.
Ficou uma nota interessante sobre a
forma como eram efectuadas as ordens para organização dos comboios. Os
comandantes dos navios mercantes recebiam as instruções em terra, numa
espécie de sala de aula com carteiras e um quadro preto, onde o oficial
responsável pela operação desenhava os esquema do combóio. No caso
documentado, o oficial de nacionalidade inglesa ia marcando com um
ponteiro as posições de cada navio, à medida que dava as instruções para
a viagem a cada comandante dos navios mercantes, finda as quais
entregava uma carta de prego a cada um dos comandantes, com instruções
expressas para apenas a abrirem se se perdessem do combóio e que nunca a
poderiam deixar cair em mãos inimigas. O oficial inglês terminava sempre
a prelecção com a seguinte frase: Em nome do Rei de Inglaterra, dos seus
ministros e em meu nome, vos desejo uma feliz viagem.
Existe um registo do navio ter
efectuado uma viagem de Lisboa para os Estados Unidos, com chegada a 17
de Maio de 1917, onde desembarcaram 3 passageiros na Ellis Island.(7)
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