Prisioneiros de Guerra

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Quando em 2006 se iniciou este site o tema "Prisioneiros de Guerra" durante a Grande Guerra não se encontrava entre os temas usualmente estudados em Portugal, tendo o tema com o centenário ganho uma nova projecção entre a comunidade académica. Hoje é possível encontrar estudos sobre o tema, alguns com especificidades muito interessantes, que auxiliam a construção do quadro de conhecimento sobre as diversas realidades observadas pelos prisioneiros de guerra portugueses na Alemanha.


Como metodologia de trabalho procurou-se efectuar uma reconstrução da realidade que envolveu esses militares e através de uma lógica explicativa enquadrar várias visões sectoriais: vivências e expectativas.


Assim para a investigação das condições de vida dos prisioneiros de guerra estabelecemos como prioritário a análise sistemática de fontes documentais literárias directas nacionais e estrangeiras, escritas antes de 1933, uma vez que pretendemos analisar sociologicamente os comportamentos, as relações entre grupos, as condições materiais na perspectiva dos prisioneiros e identificar a percepção de prisioneiros de outras nacionalidades sobre a mesma realidade. Isto tudo, antes do advento da influência nazi, e antinazi, que deforma na nossa perspectiva as considerações apresentadas actualmente sobre o comportamento da sociedade alemã durante a Grande Guerra.


Também não é de desprezar informação proveniente de fontes como a propaganda alemã, francesa e inglesa, feita em jornais, panfletos, postais, álbuns fotográficos e cinema, que foi publicada nos próprios países e em países neutros, com o intuito de apaziguar ou inflamar a opinião pública.


Outra fonte de informação importante sobre a vivência dos prisioneiros vem das comissões neutrais, que visitavam os campos de prisioneiros e recolhiam informação. Se por um lado estas visitas eram efectuadas com as melhores intenções, pouco podiam fazer para ter uma ideia aproximada sobre a vida quotidiana dos prisioneiros, já que era sempre preparadas e de curta duração.


As condições de sobrevivência à vida de cativeiro era diferente de campo para campo, não só porque existiam campos de prisioneiros diferenciados para oficias e para praças, assim como campos disciplinares com diferentes níveis de rigor de disciplina, como o disciplinar para oficiais em Ingolstadt, na Alemanha, ou para o disciplinar praças em Sedan, em França. Também não é de esquecer que parte da vida dos prisioneiros de guerra (praças) não era passada dentro dos campos de prisioneiros, mas sim fora em trabalho nos campos agrícolas, na indústria onde eram utilizados como estivadores ou operários de fábricas, ou ainda como trabalhadores nas minas. No caso dos oficiais era diferente, uma vez que não estavam sujeitos à prestação de trabalho.

O Estatuto Jurídico do Prisioneiro de Guerra

De um modo geral o público ignorava a vivência por que passavam os prisioneiros de guerra portugueses. A grande maioria dos prisioneiros portugueses passou por um período de nove meses de cativeiro, se bem que muitos estiveram mais de um ano cativos, e durante este tempo era esperado que fossem tratados de acordo com as Convenções de Genebra e os resultados das Conferências de Paz de Haia.


No final do século XIX, em sequência do trabalho de Henri Dunant, e no princípio do século XX, nas Convenções de Genebra e nas Conferências de Paz de Haia, constituíram-se os princípios reguladores para auxílio a militares feridos e tratamento de prisioneiros de guerra.


Assim, durante a guerra de 1914-18, o tratamento dos prisioneiros de guerra tinha uma regulamentação prevista e aceite de acordo com o regulamentado humanitário consagrado internacionalmente, "The Hauge Law", revisto no final da segunda Conferência de Haia, em 18 de Outubro 1907.


Como pontos mais importantes há que referir:


Os prisioneiros de guerra ficam à guarda do Estado captor;


Os pertences pessoais, excepto equipamento militar, são propriedade do prisioneiro de guerra;


Os prisioneiros de guerra podem ser internados em campos, cidades, fortalezas, e apenas em prisões em situações de segurança excepcional;


O Estado captor tem a obrigação de garantir a manutenção dos prisioneiros de guerra, em iguais condições às das suas tropas;


O Estado captor tem o dever informar sobre a identidade dos prisioneiros de guerra à sua guarda e permitir aos prisioneiros de guerra o acesso ao serviço de correios;


Os prisioneiros de guerra gozam de direitos individuais e de liberdade religiosa;


Os Estados captores podem utilizar os prisioneiros de guerra como força de trabalho, desde que não esteja relacionado com operações de guerra e devem receber de um salário;


Os oficiais estão isentos de trabalhar fora dos campos de prisioneiros e têm direito a receber um soldo idêntico aos oficiais da mesma patente no Estado captor, o qual é reembolsado pelo Governo da nacionalidade dos prisioneiros;


Os prisioneiros ficam sujeitos à lei militar do Estado captor, incluindo as sanções por falsificação de identidade, insubordinação e fuga;


Depois da conclusão da paz, os prisioneiros de guerra deverão ser entregues o mais rápido possível;


Os prisioneiros podem se libertados condicionalmente, se as leis do país o permitirem, e, nestes casos, eles são obrigados sob sua palavra de honra, e a cumprir escrupulosamente por ambos os Estados o entendimento contratado. Neste caso o próprio Estado não pode obrigar a ser aceite serviços incompatíveis com as condições acordadas.


Acresce que os civis que acompanhavam o exército, como correspondentes de guerra e fornecedores, também tinham de direito ao estatuto de prisioneiro de guerra e que as associações humanitárias de socorro aos prisioneiros gozavam de liberdade de circulação, por exemplo a Cruz Vermelha (Teixeira, 1992:95-99)


A respeito da mão-de-obra obtida através dos prisioneiros de guerra, as nações beligerantes concordavam que em princípio um prisioneiro não devia trabalhar directamente contra os seus da sua nação, razão pelo qual não eram levados a trabalhar no esforço de guerra, como abrir trincheiras, carregar munições e que deveriam só ser aplicados em trabalhos a mais de 30 Km da linha da frente. Também, existia a intenção de não colocar a vida dos prisioneiros em perigo, regra que foi muitas e deliberadas vezes quebrada (Emden, 2009:52).


Uma evidência que isto não era uma preocupação e que ambos os lados quebravam estas regras, verificou-se quando se tornou público que os ingleses estavam a empregar prisioneiros de guerra alemães junto à linha da frente, o que levou ao Governo alemão a transferir 500 prisioneiros britânicos para a frente russa, em represália directa pela actuação britânica (Emden, 2009:53).

A Logística de Acolhimento de Prisioneiros de Guerra

Quando o conflito se iniciou todos os beligerantes contavam com que tudo estivesse acabado no Natal de 1914. O prolongar da guerra trouxe inevitavelmente à superfície o problema do transporte, manutenção e alojamento dos prisioneiros de guerra. Nenhum dos beligerantes se encontrava preparado para uma guerra prolongada, nem para o acolhimento de um tão grande número de prisioneiros de guerra.


Apenas na Primavera de 1915, quase um ano depois do conflito ter deflagrado, é se concretizou uma logística associada que começou a dar resposta às necessidades imediatas e só no Verão seguinte é que a Alemanha começou a dar acesso aos campos de prisioneiros à Cruz Vermelha Internacional (CVI).  Até à intervenção da CVI não funcionava o sistema de informação que permitiu fluir a comunicação da identidade e o estado de saúde dos prisioneiros.


A solução encontrada pela Alemanha para a guarda dos inimigos capturados passou pela criação de vários tipos de campos de prisioneiros: campos para praças, campos para oficiais, campos transitórios (triagem) e campos disciplinares.


Os campos de prisioneiros eram basicamente equipados com barracas de 10m por 50m, onde se acomodavam cerca de 250 prisioneiros. Nos campos para praças não havia camas, eram fornecidos sacos de palha para dormir e o mobiliário era mantido ao mínimo, uma mesa, cadeiras, bancos e um fogão. Existia ainda uma cantina, onde podiam comprar alguns artigos de roupa ou de comida, um armazém para guardar os "colis", casa da guarda e cozinhas do campo. Cada campo tinha, ainda, estruturas sanitárias, estruturas culturais, como biblioteca e teatro, e ainda oficinas. Os campos eram cercados por uma vedação de 3m de altura, feita de arame  farpado.


Os campos de prisioneiros para oficiais, eram basicamente idênticos, mas com mais algumas comodidades, como existirem camas e salas especiais para refeições. Como os oficiais não executavam trabalhos, o tempo era passado com actividades desportivas e culturais. No final da guerra existiam 73 campos para oficiais e por causa do clima todos estes campos encontravam-se na zona ocidental da Alemanha.  

  

Foram as consequências da rápida ofensiva de 1915, onde o exército alemão se viu a braços com milhares de prisioneiros ingleses e franceses, que levou a criar um tipo de campo de prisioneiros temporário para triagem, antes de destinar o envio dos homens para os campos de prisioneiros permanentes.


Foram, ainda, criados campos de prisioneiros disciplinares, normalmente em zonas de clima difícil e perto da frente de combate, com a intenção de utilizar os prisioneiros na reconstrução das trincheiras, para carregarem os cadáveres, ou propositadamente como força de pressão diplomática e represália. As condições de vida nestes campos era muito dura e muitos morreram de cansaço e subnutrição. No entanto, mesmo nos campos de prisioneiros disciplinares existiram diferenças, uns para oficiais e outros para praças.


Desde o início os campos de prisioneiros alemães apresentavam problemas materiais, ligados com uma situação de guerra de longa duração, falta de espaço e de abastecimentos básicos de comida e agasalhos, também em parte por causa do bloqueio naval aliado e da prioridade do abastecimento ao exército e aos civis.  Era notório as dificuldades por que as populações civis passavam.

Em 1916, as potências beligerantes, na tentativa de mitigar o sofrimento dos seus militares aprisionados, fazem "Acordos de Pão",  que permitiram o envio de encomendas "colis" entre si, distribuídas pela Cruz Vermelha Internacional.  


Em 1918, A França e a Alemanha firmaram os "Acordos de Berna" em que consignaram o direito à troca de prisioneiros e guerra (Teixeira, 1992:99-101).


Captura de Prisioneiros de Guerra

O pensamento de que se tornaram prisioneiros trazia um turbilhão de sentimentos associados. Um soldado não pensava em ficar prisioneiro, pensava que podia ficar ferido, poderia ser morto, ou mesmo ter a sorte de ficar indemne, mas a ideia de ficar prisioneiro jamais lhe ocorria (Branchet, 1918:45).


O momento de transição entre a situação de soldado para prisioneiro sempre foi um momento delicado. A história está cheia de evidências de mal tratos físicos e até morte.Não há leis, regulamentos ou convenções que garantam a sobrevivência naquele momento. Quanto mais agressiva a batalha, mais difícil é largar a arma ou entrega-la ao inimigo, o qual terá a partir daí o poder de decidir sobre a vida ou morte do prisioneiro. Sobreviver a este momento depende múltiplos factores que qualquer soldado será capar de prever ou influenciar.  


Os soldados na Grande Guerra estavam, em teoria, protegidos pela Convenção de Genebra, que continha as verdadeiras primeiras regras internacionais de tratamento de prisioneiros de guerra.


Mas na verdade, muitos prisioneiros de guerra admitiram mais tarde quando libertados, que  no momento da captura pensaram que iriam morrer. Esta situação foi causada, em parte, pela propaganda nacional que transmitia aos soldados informação sobre atrocidades cometidas pelos soldados inimigos sobre soldados e civis, e assim, havia a consciência que a sobrevivência dependia da boa vontade do captor. Um inimigo agressivo durante o stress do combate tende a matar os prisioneiros, uma vez que é mais fácil matar do que remover um potencial perigo, mesmo que um soldado se apresente inofensivo de mãos no ar.


Muitos soldados no momento de rendição tentam demover o inimigo de os matar, apresentando fotos de familiares queridos ou gritando "Kamarad" e outros, cujas especialidades são mais críticas, snipers, operadores de metralhadora ou artilheiros, tendem a esconder a sua especialidade antes da rendição. Mas estas atitudes pouco influenciam, a verdade é que a sua sobrevivência depende apenas da vontade do inimigo, por exemplo: se viram muitos amigos a morrer no combate, se entendem vingar-se de uma situação anterior ou se têm ordens especificas para não fazer prisioneiros.


Uma vez aceite a rendição as probabilidades de rendição melhoram, mas se os captores mantêm uma aparente desconfiança ou nervosismo, pode acabar por ser morto. Os prisioneiros mantêm sempre uma ansiedade resultante da nova situação, tanto mais que muitos soldados nunca terão visto de tão perto o inimigo. A sensação de medo e vergonha é comum a todos os soldados no momento da captura, e é normal oferecer ou entregar objectos pessoais a fim de obter a benevolência, já que também é comum os soldados guardarem "souvenirs", como punhais, emblemas, relógios e carteiras. Havia vezes em que eram os próprios oficiais alemães que impediam o acto de obter "souvenirs", controlando o comportamento dos soldados.


Ocasionalmente alguns soldados tentavam fugir logo após captura, não por razões de patriotismo ou para voltar a lutar, mas por instituto de sobrevivência. Após o momento em que tomavam consciência que já não eram soldados e passavam a ser um prisioneiro de guerra, surgia normalmente a desmoralização e a depressão psicológica, uma vez que o treino militar não os preparava para lidar com esta situação.


Para além de saber levantar as mãos, que aliás é um movimento instintivo, os prisioneiros ficavam complemente por sua conta e nos seus pensamentos corria um sentimento de desgraça, de abandono e de raiva, ou simplesmente de alívio por saberem que sobreviveram ao conflito e que para eles a guerra estava acabada (Emden, 2009:8-10).

Relatos de Captura

Carlos Olavo Correia de Azevedo (Alferes de Artilharia - 2ª Bataria ,7ª Regimento de Artilharia, 9 de Abril de 1918)


"São 11 da manhã [9 Abril 1918](...). Não há nada mais torturante, angustia maior do que esta incerteza (...). Uma ordenança que mandei ao 1º obus com uma ordem de fogo não voltou mais; dois homens que mandei a um paiol para trazerem umas granadas não voltaram mais! Tenho a certeza de que ficaram pelo caminho feridos ou mortos! (...) Os momentos que se seguiram foram de absoluto recolhimento. Tinha a certeza de que ia morrer. Pensei naqueles que longe chorariam a minha perda: a minha família, alguns amigos seguros, todos os que sofriam a minha ausência (...). Um soldado que tinha saído veio-me dizer que há alemães no Pont du Hem, quer dizer, à retaguarda da nossa posição, vindos dos lados de Laventie. Estamos perdidos, cercados, prisioneiros! (...) Nunca me senti tão desgraçado pelo inesperado de uma situação cuja probabilidade afastei sempre do meu destino. Vencido (...) resolvi sair à frente dos soldados que tinha. Confesso que me dominava um misto de humilhação e de tristeza, por me sentir vencido, sem meios de resistência (...). Quando os alemães me aperceberam, encaminharam-se na minha direcção e o oficial que os comandava apontou-me uma pistola (...). Marchei serenamente, direito a ele, sem um gesto, sem uma palavra (...). O boche baixou a pistola e indicou-me o caminho [para a retaguarda alemã]. Segui então, direito a Neuve Chapelle, pela estrada de La Bassèe (...). Em Neuve Chapelle, parei para ser enquadrado com outros prisioneiros (...) que nos haviam de guardar até o fim do nosso destino” (Olavo, 1918:11-22).



José Maria Hermano Baptista (2º Sargento Infantaria, Secção de Metralhadoras, 5º Regimento de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


"Não nos foi possível avançar (a nossa companhia estava de apoio) porque o fogo era tanto e de tal maneira que se tornava impossível fazê-lo. Assim em vez de avançar começou a retirada das forças, não só portuguesas como inglesas (...). Como os alemães já estavam muito perto de nós ficámos todos feridos (...). Afinal os alemães não eram aqueles "terríveis Boches" que nos tinham habituado a tanto temer. Não só não nos fizeram mal como até me olhavam pesarosamente dizendo: Kaput? E lá seguiram o seu caminho avançando com as suas metralhadoras ligeiras sempre protegidos pela artilharia que lhes ia limpando o caminho” (Geraldo, 2006:56-7).



António Pereira dos Santos (1º Cabo - 3º Regimento de Infantaria, 9 Abril de 1918)


Refere que já junto à terceira linha (Linhas de Reservas) os alemães encontravam-se por todo o lado, não havendo escapatória possível. "Aqui é que estava o problema! para subirmos para cima do parapeito da trincheira e darmos-nos à prisão, eles não nos viam" dado o fumo das granadas, explosões e da neblina matinal. "Sem pinga de sangue e amarradinhos esperámos que eles se chegassem ao perto de nós, para subirmos ao parapeito e levantarmos os braços no ar, e dizer que somos bons prisioneiros". Os alemães entraram de baioneta em riste dentro da trincheira e gritaram "tout de suite Alemagne", "Come, Come to Alemagne" e "café drink Deutchland” (Santos, 2008:96).



Manuel Hermenegildo Lourinho (Tenente-médico - 10º Regimento de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que o primeiro alemão que chegou à sua frente lhe gritou "tout de suite Alemagne", o que lhe fez sentir a derrota e a aniquilação a sua personalidade. Sentia-se abandonado dentro da torrente caudalosa, tal era a multidão de soldados alemães que surgiam de todos os lados. Sentiu que deixara de ser um militar, um médico, um homem: era um prisioneiro (Lourinho, 2006:36).


A Ofensiva de Primavera alemã (Kaiserschlacht), de Março a Abril de 1918, trouxe uma situação excepcional no que se refere à captura de prisioneiros. Em 21 de Março, um dos piores dias para o exército britânico, tiveram 21.000 soldados aprisionados em poucas horas e em 5 de Abril já contavam com 54.000 capturados. O Corpo Expedicionário Português teve um dos seus piores dias em 9 de Abril, quando igualmente em poucas horas teve 6.000 soldados capturados.


Dada a dinâmica da ofensiva e a moral das tropas alemãs, os relatos indicam que os prisioneiros de guerra eram simplesmente despojados das armas e pertences e indicada a direcção que lhes era era esperado seguir, diga-se sem escolta até ao local de identificação e detenção. Simplesmente tinham de seguir a quantidade enorme de outros prisioneiros de guerra que se encaminhavam para a retaguarda alemã. Estes dias foram uma excepção.


A situação normal era ser escoltado para a retaguarda sob escolta de um ou dois guarda, dependendo da urgência da situação na frente de combate, ou dependendo do número de soldados que o comandante pudesse dispensar para levar os prisioneiros muitas vezes os prisioneiros que conseguiam andar eram aproveitados para levar feridos, camaradas prisioneiros ou inimigos para postos de socorro que ficavam de caminho. Outras vezes tinham a sorte de receber um cigarro dos soldados que avançavam para a frente de combate ou um tiro na cabeça.  O caminho para a retaguarda também não era seguro por causa do fogo de artilharia amigo, e muitos soldados britânicos e talvez portugueses tenham morrido sob o fogo da artilharia britânica que continuava a bater as zonas de retaguarda para impedir os abastecimentos da frente de combate (Emden, 2009:36).



Alexandre José Malheiro (Tenente-coronel de Infantaria, 6º Brigada de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que pelas 11 horas a barragem de artilharia inimiga já tinha passado para a sua retaguarda. Não tinham qualquer ligação com o quartel-general da Divisão e estava convicto que em breve seria feito prisioneiro. Guardou alguns manuscritos pessoais, e fotos de família e juntamente com os oficiais e praças aguardou resignadamente a chegada dos alemães. Quando a patrulha alemã chegou à casa onde se encontravam, apontaram as armas aos peitos dos portugueses e o oficial alemão que os comandava apontando também a pistola que empunhava gritou "AUS" (vamos).


A guarda dos então 25 prisioneiros foi a dois soldados alemães, um que se colocou na frente e outro na retaguarda da coluna. Ao deslocarem-se para a retaguarda alemão, ainda se cruzaram com focos de combate a alguma distância do seu caminho. Na sua opinião as tropas alemãs mantinham em combate uma postura como se tivessem em treinos, muito ordenadas.


Encontraram pelo caminho inúmeros mortos e feridos que as ambulâncias alemãs ainda não tinham podido recolher. Era uma imagem verdadeiramente assombrosa (Malheiro, 1919, 87-94).



Francisco José de Barros (Capitão de Infantaria, 4º Regimento de Infantaria, 11ª Companhia, 9 de Abril de 1918)


Refere que depois das 8 da manhã a situação encontrava-se descontrolada, com pessoal de diversos Batalhões, misturado, desorientado e em fuga para a "Linha B". A visibilidade a partir da sua posição não ultrapassava os 80m, dada a intensidade do fogo da artilharia alemã. Quando da sua posição distinguiram alguns vultos de militares a se deslocarem em boa ordem para a retaguarda, o grupo apercebeu-se que se tratavam de alemães. Mais tarde, pelas 11horas, viu nitidamente os primeiros alemães a uns 50m da sua retaguarda.


"...apontámos a espingarda com alguns escassos cartuchos que ainda possuíamos, mas era evidente a inutilidade de mais resistência. O desespero da impotência fazia chorar de raiva, Restava a morte ou a prisão...” (Barros, 1925:116-7).


Já prisioneiros, "...fomos conduzidos para a retaguarda através das sucessivas linhas inimigas que se sucediam, bendizendo a sorte dos mortos libertos que jaziam estendidos...” (Barros, 1925:118).


Seguíamos "...o nosso destino cheio de amargura, apenas a consola-lo o cício brando de balas amigas que vinham de longe...". Isto trazia-lhes a vã esperança de libertação e a indicação que ainda haviam portugueses que combatiam. Os disparos a que se refere vinham do BI 13, comandado pelo Major Gustavo de Andrade Pissarra, que se encontrava em Lacouture, com reforços do BI 15 e alguns praças ingleses que tinham retirado e que ali se juntaram aos portugueses para oferecer resistência à ofensiva alemã (Barro, 1925:119).


Relativamente a "souvenir de la guerre" refere que os oficiais que foram transportados para o posto de socorro foram despojados de bens pessoais, como no caso do relógio do Tenente-coronel Eugénio Carlos Mardel Ferreira (Barros, 1925:121).



Augusto Casimiro (Capitão de Infantaria, 13º Regimento de Infantaria, 10 de Abril de 1918)


às 11h do dia 10 de Abril um prisioneiro português entrega uma intimação dos alemães ao grupo de resistentes que s encontrava no Block-House, com a indicação de "Ou se rendem ou fazemos saltar tudo!". (Casimiro, 1922:189-97).

Carlos Olavo Correia de Azevedo (Alferes de Artilharia - 2ª Bataria, 7º Regimento de Artilharia, 10 de Abril de 1918)


Ontem depois de ter sido aprisionado no Pont du Hem, segui pela estrada de La Bassèe com destino a Neuve Chapelle. Procurei curiosamente as nossas trincheiras. Nada existia já (...), Um oficial alemão que encontrei à entrada das linhas inimigas interpelou-me (...). Benevolentemente o oficial alemão deu-me de conselho que não seguisse a estrada de La Bassèe que estava a ser ainda batida pela artilharia aliada e que tomasse antes uma trincheira de comunicação. Segui o conselho (...), espectáculo lancinante que apresentavam os feridos espalhados pelo caminho. Sensibilizou-me tanto a situação de alguns que os fiz transportar pelos meus soldados. Eram inimigos, é certo, mas o meu sentimento naquela hora de angustia, não os podia colocar fora da humanidade..." (Olavo, 1918:25).



António Pereira dos Santos (1º Cabo, 3º Regimento de Infantaria, 9 Abril de 1918)


Refere que os alemães fizeram com que ele fosse imediatamente para a retaguarda alemã, atravessando a "Terra de Ninguém". Ao terror de ser prisioneiro juntava-se o receio de morrer do fogo amigo que a defesa aliada continuava a fazer sobre o avanço alemão (Santos, 2008:97).



Francisco José de Barros (Capitão de Infantaria, 11ª Companhia, 4º Regimento de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que os alemães os levaram pela encruzilhada "...das trincheiras em grande parte rasoiradas pela metralha, ora transpondo-as, ora percorrendo-as, fomos levados a atravessar o que fora a "terra de ninguém". Refere ainda que um dos médicos do Batalhão (BI 13), assim que capturado foi conduzido para o posto de socorro alemão para auxiliar os serviços médicos a "...pensar os feridos de ambos os exércitos...” (Barros, 1925:119).



Manuel Hermenegildo Lourinho (Tenente-médico, 10º Regimento de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que foi enquadrado em formatura debaixo de escolta a cavalo (Hulanos), a qual se dirigiu para a fortaleza de Lille. (Lourinho, 2006:65).

Alguns prisioneiros ingleses referem que os Hulanos eram frequentemente provocadores e violentos e que empurravam com os cavalos e as lanças os prisioneiros ao longo do caminho (Emden, 2006:37).



Alexandre José Malheiro (Tenente-coronel de Infantaria, 6º Brigada de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que a zona denominada de "terra de ninguém", anteriormente deserta, encontrava-se transformada num formigueiro humano, com forças inimigas a virem de diversas direcções, cruzando-se com colunas de prisioneiros, que o inimigo ia recolhendo. O inimigo cruzava-se lado a lado com os prisioneiros, a quem dirigiam um olhar calmo, onde ninguém poderá ter lido o menor lampejo de indignação, ou sede de vingança pessoal (Malheiro, 1919:95).



David Magno (Capitão de Infantaria, 13º Regimento de Infantaria)


Refere que pela "Terra de Ninguém" os nossos prisioneiros, à medida que iam sendo recolhidos eram mandados seguir sozinhos até à retaguarda, onde os alemães organizavam os prisioneiros em pequenas colunas guardadas por uma escolta sumária. Os alemães seguiam para a frente de combate de forma ordenada, passando lado a lado com os prisioneiros, dirigindo-lhes um olhar natural.


Mais à retaguarda, após passarem as ruínas de Aubers, apesar do comportamento geral ser de respeito pelos prisioneiros verificaram-se acções de "souvenir", mas que comparavelmente de forma mais decente do que a forma de actuar da "célebre quadrilha da Mão Morta" que actuava em Ambleteuse (Magno, 1921:176).

Na retaguarda inimiga do inimigo a caminho da prisão

A espera no depósito de prisioneiros (campos transitórios)

Uma vez alcançada a prisão ou o recinto vedado, o qual por vezes não era mais do que uma cerca do género que se usa  para guardar ovelhas, os prisioneiros não ficavam aí retidos mais de um dia ou dois dias, uma vez que se tratavam de sítios desprovidos de quaisquer condições materiais. Aí tinham de dormir no chão, enquanto aguardavam ordens para seguirem para um campo de prisioneiros. Durante a permanência nestes locais os prisioneiros recebiam comida de muito pouca qualidade e de forma muito irregular. Quando não existia espaço nestas prisões, eram utilizados, muitas vezes, edifícios como igrejas ou fabricas abandonadas das redondezas.


Surpreendentemente e apesar da guerra de trincheiras colocar os inimigos muito próximos uns dos outros, poucos soldados tinham a oportunidade de ver um inimigo ao vivo, mesmo durante as incursões às linhas inimigas, o que levava os alemães a se deslocarem até estes locais de aprisionamento para verem soldados inimigos. Muitas vezes aconteciam trocas de pertences dos entre os prisioneiros com os soldados alemães, para obterem comida. Era nestes campos que davam os cartões de identificação para os prisioneiros preencherem com o nome, número e unidade a que pertenciam. Esta informação era posteriormente enviada para a Cruz Vermelha Internacional, que a fazia chegar ao país e às famílias do prisioneiro.


Os prisioneiros que se encontravam feridos eram separados dos restantes e eram levados para um posto de primeiros socorros, ou para um hospital para tratamentos médicos básicos (Emden, 2009:37-8). Um dos trabalhos que os prisioneiros de guerra faziam de imediato era de transportar os feridos que se encontravam caídos no caminho, cada quatro segurava uma padiola com um ferido alemão, até um posto de socorro.


A 12 de Abril de 1918, concentrava-se em Lille cerca de 3.000 prisioneiros dos quais 230 eram oficiais, à espera de serem enviados para campos de prisioneiros.



Afonso do Paço (Alferes - 3º Regimento de Infantaria, 9 Abril de 1918)


"... procurava eu transportar para o Posto de Socorro um dos meus soldados retalhados por estilhaços de granada. Não queria abandonar o meu ferido, mas os alemães não se comoveram, garantindo-me contudo que ele seria imediatamente pensado e tratado. Caminho adiante, um façanhudo, ao mostrar-lhe o meu galão de alferes, fez-me uma grande continência e encarregou-me de, com soldados portugueses que ali estavam, levar os nossos feridos.” (Santos, 2998:97).



Alexandre José Malheiro (Tenente-coronel de Infantaria, 6º Brigada de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que após ser interrogado por oficiais superiores alemães foi enviado para uns barracões onde deveria passar a noite. Nesses barracões apenas se efectuava uma contagem sumária dos homens que aí chegavam, separando-os por nacionalidade, oficiais e praças, para serem enviados de imediato para os campos de prisioneiros. Concluído o registo e dependendo do fluxo de prisioneiros, ao fim de poucos dias eram enviados, em caminho de ferro, para um dos numerosos campos de prisioneiros alemães. Todos os prisioneiros eram vacinados contra o tipo, cólera e varíola, antes de serem enviados para os campos de prisioneiros. Também indicou que existia um interprete que num fluente português lhes explicou sobre a situação e o se iria passar. É de notar que Alexandre Malheiro indica que o trato foi muito afável e foi no dialogo com o interprete que afirmou o sentimento geral de todos os prisioneiros da Grande Guerra: "A guerra para nós acabou” (Malheiro, 1919:108-24).



Francisco José de Barros (Capitão de Infantaria, 4º Regimento de Infantaria, 11ª Companhia, 9 de Abril de 1918)


Refere que quando foi interrogado num posto de comando alemão foi experimentado "...com perguntas formuladas por um oficial alemão de bigodões grisalhos, falando um português que adquirira no Brasil, mas que parecia limado na moderna educação, pois a todos tratava por «você»".  A posição de não responder a perguntas sobre questões militares não provocou qualquer situação de conflito, tendo o oficial alemão terminado o interrogatório com o comentário: "você é um oficial inteligente", respeitando a atitude e não insistindo mais. O fim do interrogatório terminou com uma continência. O Capitão Francisco Barros, acrescenta que num segundo interrogatório atrás das primeiras linhas alemãs, também não houve qualquer atrito ao não ter transmitido qualquer informação militar (Barros, 1925:119-20).



David Magno (Capitão de Infantaria, 13º Regimento de Infantaria)


Refere que o grupo de oficiais em que se encontrava o Tenente-coronel Alexandre José Malheiro foi interrogado por um alemão em português correctíssimo e que antes de partirem para Lille, lhe foi permitido pernoitarem numa barraca, que lhes deram cartões postais para puderem escrever às famílias, e que ainda lhes foi lhes chegou uma ligeira ração de pão de centeio com salsicha e água. Em Carvin um oficial alemão explicou ao grupo de oficiais portugueses prisioneiros que não era possível dispensar melhor conforto e ficou a ideia que na atitude alemã existia uma evidente moderação no seu comportamento (Magno, 1921:176).

Antes de 1918, a maior parte dos prisioneiros de guerra aliados eram enviados para as centenas de campos de prisioneiros que se encontravam dispersos pela Alemanha. A viagem incluía caminhar a pé até à estação de comboio mais próxima, onde eram colocados em vagões de gado. As condições eram deploráveis, empacotados como sardinhas em lata, sem sanitários e pouca comida. No início da guerra os comboios paravam nas cidades para que a população os visse e tivesse oportunidade dos insultar. Por vezes os comboios que transportavam os prisioneiros eram apedrejados pelos civis alemães (Emden, 2009:39).


Nem todos os prisioneiros de guerra eram enviados para os campos de prisioneiros na Alemanha. Um pequeno número ficava em França para ser usado como mão-de-obra barata, para carregar abastecimentos, reparar edifícios e estradas, ou trabalhar nos campos agrícolas.


Em 1918, com o bloqueio naval aliado, a falta de produtividade industrial derivada da escassez de matérias primas e a fome derivada da baixa produção agrícola, levou a uma aumento exponencial de emprego de prisioneiros de guerra. Esta situação foi muito mais acentuada após a ofensiva alemã da primavera, que lhes proporcionou um enorme número de prisioneiros ingleses (54.000) e portugueses (6.500). À data do Armistício foi estimado que um sexto dos prisioneiros britânicos estivessem a trabalhar em França e na Bélgica e os restantes empregues na Alemanha em trabalhos agrícolas em quintas, ou na indústria.



António Pereira dos Santos (1º Cabo - 3º Regimento de Infantaria, prisioneiro em Stalluponen, 1918)


Refere que em 9 de Agosto de 1918, um civil prussiano foi procurar um carpinteiro no campo de prisioneiros onde estava e que o comandante do campo o enviou. Posteriormente foi autorizado a permanecer na casa do civil, sob juramento de honra que não fugiria, o que ele garantiu. "porquanto é sagrado, que só se iria embora de casa dele, quando ele o mandasse, ou a guerra tivesse acabado” (Santos, 2008:113).


Após o início da retirada do exército alemão, no Verão de 1918, os prisioneiros de guerra foram obrigados a acompanhar a retirada do exército em direcção à Alemanha. Sofreram caminhadas forçadas, castigos cruéis e foram negligenciados na alimentação e na higiene. Muitos prisioneiros de guerra foram contagiados com a gripe pneumónica que se espelhara pela Europa em 1918, fazendo centenas de mortes entre estes. Um Cabo do exercito britânico que tinha sido feiro prisioneiro com mais 2.000 soldados em Maio de 1918, refere que cinco meses mais tarde apenas restavam 292 companheiros desse grupo inicial (Emden, 2009:54).



David Magno (Capitão de Infantaria, 13º Regimento de Infantaria)


O transporte dos oficiais portugueses entre campos de prisioneiros não seguiu o mesmo padrão de tratamento que Richard Van Emdem indica no seu livro ""Prisioners of the Kaiser". Fica uma imagem diferente, no relato do que observaram no caminho entre Rastatt e Breesen, e na passagem por Hamburgo indicam não só o apoio prestado pela Cruz Vermelha Germânica, como as condições favoráveis do "luxuoso dormitório" onde pernoitaram (Magno, 1921:188).

Do depósito para os campos de prisioneiros

Os prisioneiros eram forçados a depender da comida fornecida pelos guardas alemães, o que implicava a inexistência de alternativa a um estado constante de fome. A fome levava os prisioneiros a uma depressão física e psicológica, que por vezes levava a que se confrontassem entre eles. O problema da falta de comida eram o que mais desmoralizava os prisioneiros.


Existiam regras que definiam que os prisioneiros deviam de receber a mesma alimentação que a do exército captor, mas isso nunca aconteceu. Havia ainda uma diferenciação entre o tratamento dos soldados ingleses, no início da guerra, da dos restantes países, porque os soldados ingleses ao serem profissionais eram vistos pelos alemães como mercenários atitude alemã era ainda mais conflituosa quando se apercebia que o prisioneiro inglês era um combatente voluntário contra o Kaiser. Mais tarde foi o bloqueio económico que a Armada Britânica efectuava, que implicou a diferenciação de tratamento dos prisioneiros ingleses em relação aos prisioneiros de outras nacionalidades.


Há que realçar que em 1918 a Alemanha mal podia alimentar as suas tropas e civis, o que dificilmente deixava disponível comida para os prisioneiros. As fracas rações disponibilizadas levaram ao aparecimento de diversas doenças intestinais e de estômago (Emden, 2009:105-8).


Nos campos os prisioneiros com mais sorte conseguiam trabalho nas cozinhas, onde era preparada e aquecida a comida. Formavam-se filas de um homem para a entrada do refeitório, onde comiam ou de onde levavam para a barraca. Para além do caldo, por vezes era distribuído um pedaço de pão “negro” para dividir entre cada 6 prisioneiros.


Para os prisioneiros que trabalhavam fora dos campos a alimentação era ainda um problema maior. Era-lhes fornecida uma ração para 24 ou 48 horas, que devido à fome existente os levava a pensar se deveriam comer tudo logo e sofre a agonia da fome posteriormente, ou ir comendo ao longo do tempo e estar sempre com fome. Olhar para a comida e não comer era também uma tortura.


Para os que estavam sujeitos a trabalhos pesados, comer ou não era a diferença entre sobreviver  mais um dia, ser punido por não conseguir trabalhar ou até acabar no hospital. Muitos dos que ficavam no campo surpreendentemente passavam o dia a pensar na fome e a falar sobre ela, e muitas vezes deitados nos seu barracões a falar sobre as comidas preferidas ou o que iriam comer quando voltassem para casa.  Como era aplicada censura sobre a correspondência saída do campo era difícil comunicar a situação de fome às famílias e autoridades, optando muitas vezes por subterfúgios difíceis de entender pelos guardas alemães, ou mesmo códigos.


Os prisioneiros também tinham a percepção que o comportamento dos guardas prisionais não era homogéneo. Existiam dois grupos: os oficiais e os sentinelas que vigiavam o campo, sendo que existia alguma comunicação e simpatia entre os sentinelas e os prisioneiros. Os comandantes, e outros oficiais superiores, eram normalmente velhos oficiais dados como inadequados para o serviço na frente, os oficiais subalternos encontravam-se ali por razões físicas ou psicológicas, e os sentinelas porque pertenciam à reserva territorial e por viverem próximo dos campos de prisioneiros com as suas famílias, tinham sido incorporados compulsivamente como guardas prisionais.

A Vida no Campo de Prisioneiros

Caricaturas de Guardas Prisionais Alemães
Caricaturas de Guardas Prisionais Alemães

Manuel Hermenegildo Lourinho (Tenente-médico - 10º Regimento de Infantaria, 9 de Abril de 1918)

Refere que na correspondência trocada com a família enviou uma foto, onde se encontrava a olhar para uma imagem de uma revista onde várias pessoas se encontravam sentadas à mesa a comer, e que esta mensagem foi entendida pela sua mãe como "aqui banqueteamo-nos ... mas só com os olhos". Outra mensagem que conseguiu passar o censor, onde indicava que era necessário mandar uma encomenda para "o irmão do professor da Chança", que era ele próprio (Lourinho, 2006:117).

A falta de comida era efectivamente o grande problema que os prisioneiros tinham de atravessar. A Fome levava por vezes a situações de desespero e de violência, não só contra os guardas alemães, mas mesmo entre prisioneiros, até da mesma nacionalidade. O roubo de comida da cozinha ou dos armazéns era uma das poucas oportunidades para conseguir um complemento alimentar, mas a punição poderia ser violenta dependendo do campo. Normalmente esta situação findava assim que as encomendas da Cruz Vermelha Internacional começavam a chegar com regularidade.  Para os que não estavam registados a fome apenas acabaria com o Armistício.     

A sobrevivência dos prisioneiros internados em campos de prisioneiros deve-se em muito à acção da Cruz Vermelha Internacional, que fazia chegar encomendas aos prisioneiros, com comida e agasalhos. Para os ingleses que tiveram prisioneiros de muito longa duração, a dependência dos "colis" foi total, o que levou a que o envio se tornasse uma indústria. Em Portugal o envio de "colis" dependeu de iniciativas privadas, como a Associação Cruzada das Mulheres Portuguesas, Cruz Vermelha Portuguesa, o Triângulo Vermelho Português e o jornal "O Século" que muito contribuíram para ter chegado encomendas aos prisioneiros. O Estado criou o Comité de Socorro aos Militares e Civis Portugueses Prisioneiros de Guerra, como expressão organizadora das diversas iniciativas, com a função principal de coordenação das acções humanitárias com as estruturas doas outros Estados aliados.


Essencialmente existiam dois tipos de encomendas, comida e roupa. O serviço de encomendas inglês chegou a ser tão regular que em alguns campos os prisioneiros ingleses deixaram de comer a comida fornecida pelos guardas alemães e até dar a prisioneiros de outras nacionalidades, como no caso dos russos que em contrapartida lhes faziam serviços de limpeza e manutenção das barracas.  


Os guardas alemães, tal como os prisioneiros de outras nacionalidades, invejavam a quantidade e a qualidade da comida que os ingleses recebiam, tanto mais que o bloqueio aliado piorava cada vez mais as condições de vida da população e do exército alemão. Por vezes, verificaram-se situações em que os guardas trocavam vegetais frescos por comida, tabaco, sabão ou café dos prisioneiros.


Nem todas as encomendas enviadas pelas Estados Aliados não chegavam ao seu destino, nem todos os prisioneiros estavam registados, razão pelo qual muitos portugueses foram dados inicialmente como mortos e posteriormente regressaram a Portugal, após o Armistício. Nem todos os prisioneiros receberam cartões de registo quando da captura, ou tiveram a possibilidade de enviar cartas para casa. A Cruz Vermelha Internacional visitava regulamente aos campos de prisioneiros e tomava notas sobre os soldados não registados, mas esta informação levava semanas a ser processada e a chegar ao seu país, altura em que já poderia ter sido transferido para outro campo.



José Maria Hermano Baptista (2º Sargento Infantaria, Secção de Metralhadoras, 5º Regimento de Infantaria, 9 de Abril de 1918)


Refere que em 22 de Agosto de 1918 recebeu a primeira carta de Portugal. Esta fora escrita por sua mãe em 14 de Julho, onde indicava que até aquela data consideravam morto e que tinha sido através da Cruz Vermelha [Internacional] que tinha recebido a notícia de que se encontrava vivo e onde estava (Geraldo, 2006:60).


Isto levou a situações em que muitas das encomendas não chegassem aos destinatários, o que levou a título de exemplo ter-se encontrado no campo de prisioneiros de Soltau, 200.000 "colis" em armazém por entregar, quando do Armistício (Emden, 2009:123).


Muitas foram as razões que se puderam apontar para os prisioneiros não terem recebido as encomendas, desde o comportamento dos guardas de campos onde a disciplina era mais brutal e era utilizada a distribuição de "colis" como factor de repressão e de manutenção de disciplina, até situações de ineficiência logística, descuido, roubo e incompetência. Muitas vezes os "colis" eram abertos, e até faltavam coisas, mas isto também se deve ao comportamento dos ingleses que no início dissimulavam mapas e bússolas dentro das encomendas, com a finalidade de facilitar a fuga aos prisioneiros.


Se parece incrível que que os alemães tenham permitido que as encomendas com comida chegassem aos prisioneiros, também se deve considerar que foi uma forma de diminuir a pressão sobre o problema de alimentar mais de 2 milhões de prisioneiros desde quase o início da guerra. Impedir os comboios humanitários teria trazido à Alemanha uma situação internacional insustentável, assim como repercussões directas na opinião publica dos Estados Unidos da América. Também há que considerar que existiam prisioneiros alemães na Grã-Bretanha, que necessitavam, também, de receber encomendas, e os alemães não pretendiam ter uma retaliação nesta matéria.


Por último, a situação generalizada de fome na Alemanha levou à execução de roubos de "colis" dos armazéns por parte dos guardas, e ao aparecimento de civis, mulheres e crianças, a pedir comida aos prisioneiros (Emden, 2009:124).

As Encomendas "colis"

O Final da Guerra

Os prisioneiros portugueses capturados em Abril de 1918, tiveram de imediato a noção que o exército alemão não estava bem. Ao serem levados para trás das linhas de combate alemãs deparam-se com as insuficiências logísticas e materiais alemãs, bem visíveis no ar subnutrido dos solípedes e na quantidade de jovens de 16 anos de uniforme. Era evidente que os alemães já pouco mais tinham que a tropas utilizadas naquela ofensiva de primavera.



Carlos Olavo Correia de Azevedo (Alferes de Artilharia - 2ª Bataria ,7ª Regimento de Artilharia, 9 de Abril de 1918)


"O que ali passava era uma tropa à bont de ressource, constituida por uma mistura de adolescentes e de velhos, com uma tralha de viaturas atrás que impressionou deploravelmente os meus olhos habituados ao luxo da organização inglesa. (...) Puxando um carro de companhia passou uma parelha que me fez rir: ao lado de um cavalo, um burro fazendo esforços para acompanhar o passo largo do companheiro que, de outro lado da lança, marchava desdenhosamente. (...) Velhos camiões, arrastavam-se penosamente pelas estradas que o movimento do material as rodas dos carros e as chuvas tinham cortado de sulcos e semeado de covas” (Olavo, 1918:21).


Quando a ofensiva alemã terminou no Verão de 1918, os aliados tomaram a ofensiva e alemães começaram a retirar. Com o exército os prisioneiros também retiraram para o interior da Alemanha.  Com a transformação da guerra de trincheiras em guerra de movimento, os alemães na sua retirada não ficavam parados muito tempo e as estradas ficaram cheias de tropas, prisioneiros e civis em fuga.


Em Setembro começou a chegar, com mais insistência, rumores que os Aliados estavam a avançar e que os alemães estavam a perder a guerra. Nos campos de prisioneiros onde existiam encomendas de comida armazenadas a situação não foi tão grava e os prisioneiros apenas tinham de esperar pela paz. Para outros prisioneiros a situação tornou-se muito crítica com a desestruturação da economia e rotura dos circuitos de comunicação. Outro problema surgiu com a gripe pneumónica, que se alastrava pela Europa e que estava a matar prisioneiros a um ritmo alarmante, dada a debilidade física e de resistência em que se encontravam.


Com o início da guerra civil na Alemanha,  muitos comandantes e guardas de campos de prisioneiros tornaram-se menos agressivos e até complacentes. Por fim os guardas acabaram por desaparecer e os campos acabaram por ficar abandonados aos prisioneiros (Emden, 2009:138).



A Libertação


Os prisioneiros que se encontravam em França e na Bélgica receberam a notícia através dos civis locais, ou então através dos oficiais alemães, que simplesmente os informaram que a guerra tinha acabado e que eram livres de ir embora. Esta situação não era inesperada para os prisioneiros, os quais se estavam a aperceber da situação complicada em que o exército alemão se encontrava nas últimas semanas de guerra. A situação transformou-se num simples abandono dos prisioneiros nos campos de prisioneiros e na partida dos guardas para Este em direcção à Alemanha. Por outro lado os prisioneiros por iniciativa própria iniciaram a caminhada para Oeste em direcção às linhas aliadas. Por inúmeras vezes durante a retirada os alemães e os prisioneiros, cruzaram-se ao longo das mesmas estradas.


Para os prisioneiros que se encontravam na Alemanha, junto às fronteiras junto da França ou da Holanda, a notícia do fim da guerra foi inesperada, uma vez que as notícias sobre a guerra na Alemanha eram censuradas e não existia informação sobre a retirada alemã.


Para os prisioneiros que se encontravam em campos de prisioneiros no interior da Alemanha a notícia do fim da guerra chegou muito mais tarde e para aqueles que trabalhavam em quintas isoladas acabou por nunca chegar.


Nos termos do Armistício, a Alemanha estava obrigada a libertar de imediato todos os prisioneiros sem reciprocidade. Foi um princípio louvável, mas de repente ficaram centenas de milhares de prisioneiros dispersos por toda a Alemanha sem saberem como regressar.


Os prisioneiros que se encontravam em França e na Bélgica, durante a sua marcha para casa foram bem recebidos pelas  populações locais, que os apoiaram, tanto em alojamento como em comida. Os prisioneiros recolhidos pela guarda avançada dos Aliados chegaram ao porto de Calais, transportados de comboio, logo ao fim quatro dias após o Armistício.


Para os prisioneiros que estavam na Alemanha e que decidiram ir sozinhos para a França, houve situações em que houve conflitos graves entre estes e a população civil alemã.


A Alemanha encontrava-se numa situação de revolução, ou pelo menos de grava desordem social e civil, o que levou a que muitos prisioneiros ao acordarem no dia 12 de Novembro, o campo de prisioneiros estivesse abandonado pelos guardas e de portas abertas. Mas a situação mais corrente foi a dos comandos dos campos indicarem aos prisioneiros para aguardarem instruções para o repatriamento.


O repatriamento foi lento e desorganizado, não só pela situação social da Alemanha, mas também como forma de pressão sobre os Aliados, uma vez que lhes tinha sido retirado grande parte do material rolante, por exigência das contrapartidas do Armistício. Para muitos prisioneiros não houve alternativa a ter que aguardar pelo repatriamento no campo de prisioneiros. Em Fevereiro de 1919 ainda existiam prisioneiros britânicos a aguardar repatriamento dentro da Alemanha.


A Cruz Vermelha Internacional em Janeiro de 1919 percorreu os 21 Distritos Prisionais localizados na Alemanha em busca de prisioneiros esquecidos.


As rotas de regresso dos prisioneiros fizeram-se pelos portos de Calais, Roterdão, Hamburgo e Copenhaga.  Muitos dos prisioneiros que não se encontravam em condições físicas de regressar, estiveram primeiro em campos de recuperação para ganharem peso antes de voltar a casa (Emden, 2009:150-2).



O Regresso


O regresso dos primeiros prisioneiros de guerra britânicos a casa foi efectuado em festividade, ou pelo menos com o respeito por quem tinha sofrido estoicamente o cativeiro, mas a euforia do pós-guerra desvaneceu rapidamente e os prisioneiros que regressaram em Janeiro e Fevereiro já não receberam qualquer acolhimento em especial.


A maior parte dos civis e militares não viu as condições em que chegaram os prisioneiros vindos do interior da Alemanha, mas aqueles os observaram, referiram que as condições em que os prisioneiros viveram foram as piores condições humanas existentes em toda a guerra.


Muitos prisioneiros não sobreviveram ao cativeiro e mesmo alguns que foram internados nos campos de recuperação em França e na Holanda, também não o conseguiram. Muitos prisioneiros quando chegaram a casa encontraram as famílias de luto por si. Na Grã-Bretanha a desmobilização de todos os prisioneiros de guerra regressados não foi imediata, e alguns após a licença de dois meses, regressaram ao serviço militar por mais algum tempo.


Os prisioneiros de guerra alemães que se encontravam em Inglaterra só foram repatriados após a assinatura do Tratado de Versalhes, em 28 de Junho de 1919.


Os danos psicológicos derivados da situação de prisioneiros, os danos físicos provocados pela insuficiência alimentar no sistema digestivo e os danos provocados pelas condições de trabalho no sistema respiratório, levaram muitos a uma esperança de vida menor ou até ao suicídio. Muitos viram a morrer nos seguintes 10 ou 20 anos de doenças directamente relacionadas com as condições de cativeiro (Emden, 2009:174-6).

Campos de Internamento de Prisioneiros na Europa

O Corpo Expedicionário Português (CEP), no período em que esteve em França (1917-18) teve 6.678 prisioneiros, dos quais 6.585 foram feitos no dia 9 e 10 de Abril de 1918, durante a Batalha de La Lys (68 prisioneiros antes de 9 de Abril , 6.585 nos dias 9 e 10 de Abril e 25 após 10 de Abril até ao armistício em 11 de Novembro 1918).

A 2 de Março de 1918, no sector de Chapigny, o inimigo efectuou um raid de grande envergadura, onde utilizou um batalhão de infantaria de elite sobre o Batalhão de infantaria 4. O inimigo teve aproximadamente 200 baixas, fundamentalmente devido a fogo de artilharia e de metralhadora, mas o Batalhão sofreu 63 prisioneiros, incluindo 3 oficiais (Malheiro, 1919:87-94)


De acordo com Nuno Severino Teixeira , durante os treze meses de combate anteriores à Batalha de La Lys os portugueses efectuaram uma dezena de ataques às linhas alemãs e destas acções resultaram 627 baixas nas tropas portuguesas (107 mortos, 358 feridos e 162 prisioneiros) e 123 baixas nas tropas alemãs (8 mortos, 56 feridos e 59 prisioneiros). O resultado da Batalha para os portugueses cifrou-se em 1.341 mortos, 4.626 feridos, 1.932 desaparecidos e 7.740 prisioneiros.


Ao contrário do que a propaganda inglesa passou para o mundo, a resistência da 55ª Divisão inglesa, que fazia a ligação à direita com a 2ª Divisão portuguesa, foi esmagada pelo avanço alemão deixando que estes ultrapassem as defesas da line B, e através das trincheiras de comunicação executassem um movimento de envolvimento para atacar os portugueses de lado e por detrás(Fraga, 2010:409~420).


No relatório apresentado pelo Major Guilherme Correia de Araújo, comandante do Batalhão n.º 10, de Bragança, datado de 22 de Abril de 1918, p.13-14, relata que o inimigo já tinha ocupado a line A  e que os ingleses à sua direita, referindo-se a tropas inglesas da 55ª Divisão, fugiam chorando e que tinham deixado os alemães entrarem nas trincheiras de comunicação. Refira-se que os ingleses ao fugirem da zona entre o canal de La Bassèe e a localidade de Ferme Du Bois, a Sul da 2ª Divisão portuguesa, abriram uma brecha de aproximadamente 4.5 Km, por onde os alemães se infiltraram. A Norte da 2ª Divisão portuguesa as defesas inglesas, constituídas por tropas da 50ª Divisão, tal como o que aconteceu às tropas portuguesas, foram rapidamente ultrapassadas pelas forças alemãs no primeiro embate.  

Muito dos portugueses foram apanhados de surpresa, com o aparecimento dos alemães vindos da retaguarda. Esta situação foi presenciada por Ernie Stevens, do 20º Middlesex Regiment, também aprisionado pelos alemães em 9 de Abril de 1918, que deixou testemunho de ter observado, junto a uma localidade chamada Laventie, um grande número de soldados portugueses estendidos no chão de barriga para baixo e virados para a retaguarda. Ele remarca que as nossa tropas tinhas sido apanhadas de surpresa pela retaguarda e ceifadas pelos alemães (Emden, 2009:55).


Segundo relata o livro ”Noticias Históricas das Guarnições Militares de Tomar, do Coronel do Exercito, Luís Nogueira, pág.120 - ”Por falta de munições ficaram prisioneiros das tropas alemãs, os militares do R.I.15: 7 oficiais e 31 praças de pré”.


É de referir que durante a primeira parte da ofensiva alemã "Operação Michael", entre 21 de Março e 5 de Abril de 1918, foram capturados 54.000 prisioneiros da Força Expedicionária Britânica e que destes 21.000 foram capturados em poucas horas durante o primeiro dia (Emden, 2009:36).


No final da guerra acredita-se que existiriam 140.000 prisioneiros britânicos internados em campos de prisioneiros na Alemanha dos quais cerca de 3.000 estariam internados para tratamento na Suíça, ao abrigo de uma convenção assinada entre a Inglaterra e a Alemanha.  


Campo de Prisioneiros de Breesen

Para os alemães Breesen era um Campo de Prisioneiros para Oficiais

Neste Campo encontravam-se oficiais portugueses feitos prisioneiros no dia 9 e 10 de Abril de 1918, nas localidades de Neuve Chapelle, La Couture, Pont du Heme, Vieille Chapelle, Le Touret e Lavantie.

A chegada dos oficiais portugueses a Breesen deu-se a partir de Julho e em Outubro de 1918, um mês antes do fim da guerra. A quase totalidade dos oficiais veio do campo Friedrichsfeld, onde os alemães concentraram os prisioneiros da sua última ofensiva.


Em 11 de Novembro de 1918 estavam internados neste Campo 262 oficiais.

Felisberto Alves Pedroso, Coronel

Diocleciano Augusto Martins, Coronel

João Carlos Craveiro Lopes, Tenente Coronel

Alexandre José Malheiro, Tenente Coronel

Eugénio Carlos Mardel Ferreira, Tenente Coronel

José Sande Lemos, Tenente Coronel

Gustavo de Andrade Piçarra, Major

Máximo Marques, Alferes de Artilharia 3

Henrique  dos Santos, Capitão



Na foto sentado à esquerda o Alferes Mariano Moreira Lopes, do Batalhão de Infantaria 16.

Na primeira fila sentado:  3-Capitão Joaquim Simões da Costa, 4-Alferes Mariano Moreira Lopes

Na terceira fila de pé:  2-Alferes Simões da Costa; 1-Capitão Fachada

Oficiais portugueses prisioneiros em Breesen procedendo à limpeza da louça e talher após acabarem a refeição.

1-Coronel Pedroso; 2-Tenente-coronel Alexandre Malheiro; 3-Capitão Camilo de Oliveira

 

Dois oficiais prisioneiros  em Breesen, pai e filho: Capitão Joaquim Simões e Costa e Alferes João Simões e Costa.

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Campo de Prisioneiros de Fürstenberg

Para os alemães Fürstenberg era um Campo de Prisioneiros para Oficiais.


O Capitão Henrique  dos Santos, da 6ª Brigada foi aprisionado em Neuve Chapelle, no dia 9 de Abril de 1918. Mais tarde em 10 de Outubro de 1918 é que é transferido para Breesen, onde os alemães concentraram os Oficiais portugueses.  


Campo de Prisioneiros de Fuchsberg-bei-Uchte

Para os alemães Fuchsberg era um Campo de Prisioneiros para Oficiais.


O Tenente-coronel Alexandre Malheiro refere que os portugueses foram generosamente socorridos pelos camaradas franceses que connosco partilharam os alimentos disponíveis (Malheiro, 1919:103).


Campo de Prisioneiros de Friedrichsfeld

Para os alemães Friedrichsfeld era um Campo de Prisioneiros para Praças.


Em Agosto de 1918 estavam internados neste Campo mais de 5.000 Praças e Oficiais. Só em Outubro é que é efectuada a transferência dos Oficiais para Breesen.


Deste campo existe informação sobre a vivência do 2º Sargento Miliciano em 22 de Maio de 1918, José Maria Hermano Baptista, que foi ferido na Batalha de La Lys, a capturado pelos alemães.


Depois de ter passado algum tempo hospitalizado em Wesel foi transferido para o campo de prisioneiros de guerra Friedrichsfeld, onde permaneceu de Maio a Dezembro de 1918. Nas suas memórias lembra esse período de forma muito especial e apresenta a sua imagem dos militares alemães, diz‑nos:


"Afinal os alemães não eram aqueles "terríveis Boches" que nos tinham habituado a tanto temer. Não só não nos fizeram mal como até me olhavam pesarosamente dizendo: Kaput? E lá seguiram o seu caminho avançando com as suas metralhadoras ligeiras sempre protegidos pela artilharia que lhes ia limpando o caminho".



Internados no campo:


Alberto C. Santos,2º Sargento de Infantaria

Manuel A. Cunha, 2º Sargento de Infantaria

João L. Cabeleira, Soldado de Infantaria

Manuel Barbosa, Guarda Fiscal ao serviço do CEP


Campo de Prisioneiros de Dülmen

Para os alemães Dülmen era um Campo de Prisioneiros para Praças.

Em 24 de Agosto de 1918 estavam internados neste Campo 300 praças.

Este campo ficava localizado na Westfalia.


Também se encontravam aqui ingleses capturados a 9 de Abril durante a ofensiva alemã.


Campo de Prisioneiros de Merseburg

Para os alemães Minden era um Campo de Prisioneiros para Praças.


Em Outubro de 1917, recebeu grande parte dos prisioneiros italianos capturados entre Tagliamento e Piave. Para preparar o campo para receber um numero aproximando de 3.150 prisioneiros, tiveram de empilhar os prisioneiros franceses, russos, ingleses, belgas, portugueses e romenos, amontoados  por barracas (Blanchet, 1918:22-23).


Este campo ficava localizado na Saxónia.


Campo de Prisioneiros de Minden

Para os alemães Minden era um Campo de Prisioneiros para Praças.

Essencialmente utilizado para prisioneiros britânicos.


José dos Santos, Sargento-ajudante, (Infantaria n.º 1).


Campo de Prisioneiros de Karlsruhe

Para os alemães Karlsruhe era um Campo de Prisioneiros para Oficiais da Marinha.


Na Revista "Ilustração Portuguesa", n.º 647, de 15 de Junho de 1918, é indicado o nome do Alferes Eduardo Djalme d'Azevedo, como um dos prisioneiro portugueses internados neste campo. Não é indicado a arma e a unidade deste Oficial. O seu nome faz parte da lista de oficiais que foram transferidos para Breesen em 10 de Outubro de 1918.


O Campo, pelas fotos apresentadas, não apresenta uma superlotação e tenta transparecer um ar organizado onde se dá aos prisioneiros algumas condições, como por exemplo a existência de um espaço para teatro e uma biblioteca.


O Alferes Eduardo Djalme d'Azevedo, do Batalhão de Infantaria n.º 32, foi capturado em 25-10-1917 (PT/ AHM, D1/S35/CX1333, relação de prisioneiros de Karlsruhe), quando cumpria um raid às linhas inimigas. Américo Olavo no seu livro "Na Grande Guerra" refere que isto terá sido devido à dificuldade que existia em as patrulhas encontrarem as suas linhas quando se encontravam na "Terra de Ninguém" em noites de neblina ou nevoeiro.

Campo de Prisioneiros Münster I, II, III e IV

De acordo com a descrição feita por Mr. Dresel, no seu relatório de visita ao campo de Münster, datado de 24 de Março de 1916, indicava que o campo era constituído por duas grandes zonas rectangulares, que alinhavam barracas de ambos os lados. Cada uma das zonas tinha a cozinha, zona de lavagens e de banhos, e ainda uma área cultivada pelos prisioneiros. Os prisioneiros estava divididos entre as duas zonas, ficando de um lado os Britânicos e do outro os franceses. Do lado Britânico ainda ficavam outras nacionalidades mas em barracas separadas.


Nas barracas as camas eram do tipo beliche e aparentemente sobrelotadas. A luminosidade era fraca e a luz eléctrica era dada apenas por duas lâmpadas no interior da barraca de dimensões aproximadas de 57m x 14m.  Apresentavam janelas apenas num dos lados, o que não facilitava a ventilação.


Ao longo da guerra as estruturas foram melhorando e os campos que foram construídos mais tardiamente já apresentavam melhor ventilação.


Os prisioneiros britânicos apresentavam-se bem vestidos, muito devido à recepção regular de “colis” da Inglaterra. Quanto à alimentação os prisioneiros conseguiam ser alimentados quase apenas pelas encomendas recebidas, dispensando regularmente a comida fornecida pelos guardas.


Os americanos, enquanto neutros e através da Young Men's Christian Association (YMCA), construíram no campo um edifício que continha uma Igreja, um teatro, uma biblioteca e outras salas. Todas as semanas um Reverendo vindo de Nova Iorque, pertencente à International Committee of the Association ,prestava serviços religiosos no campo.


Muitos dos prisioneiros eram levados a trabalhar nas minas de carvão, que ficava junto dos campos II e III. O campo IV estava reservado a prisioneiros russos. Os campos I, II e III eram considerados campos de registo (triagem)  de prisioneiros, ou seja, eram basicamente campos de passagem.



Em Outubro de 1918 verificava-se o registo da seguinte lista de prisioneiros:


Franceses - Oficiais 3


Franceses – Praças 9.702


Russos – Oficiais 1


Russos – Praças 6.354 


Belgas – Praças 424 


Ingleses – Praças 3.343 


Sérvios  - Praças 42 


Italianos – Praças 752


Portugueses – Praças 285


Civis – 40.


Campo de Prisioneiros de Stalluponen

Para os alemães Stalluponen era um Campo de Prisioneiros para Praças.

Situado na Prússia Oriental era essencialmente utilizado para prisioneiros russos, romenos, italianos, alguns franceses e 9 praças.

António Pereira dos Santos,   1º Cabo, (Infantaria n.º 3).


Campo de Prisioneiros de Lazarett III

Para os alemães Lazarett III era um Campo de Prisioneiros para Praças.

Existe registo dos seguintes militares internados neste campo de concentração, o qual se localizava em Hamburgo.

Adriano de Almeida, Soldado, 4ª Companhia de Infantaria 2

António da Costa, Soldado, 2ª Companhia de Infantaria 8

António Duarte Campos, Sargento, 4ª Companhia de Infantaria 2

João Baptista Damião, Soldado, 4ª Companhia de Infantaria 2  

José de Carvalho, ??????   , 4ª Companhia de Infantaria 8  

Manuel Caetano, Soldado, 10ª Companhia de Infantaria 17


Campo de Prisioneiros de Parchim

Para os alemães Parchim era um Campo de Prisioneiros para Praças.

Em Outubro de 1918 estavam internados neste Campo 76 praças.

De acordo com William Doegen, o número de prisioneiros registados em Parchim em Outubro de 1918 era de 55.193, distribuídos por várias nacionalidades: Franceses, Russos, Belgas, Ingleses, Sérvios, Romenos, italianos, Americanos, Montenegrinos, Portugueses e civis.

Nos registos efectuados pelo Inspector do IX Corpo de Exército Alemão, General Von Nessler encontra-se a indicação que se encontravam internados, à data, 76 militares portugueses.

António Alves da Santa, Cabo, 3ª Companhia de Infantaria 19

José Bernardes, Sargento,  ???????

Bernardes Carvalho, Soldado, Engenharia 2

João José da Costa Jr., Soldado, ?ª Companhia de Infantaria 8

António Pinto Faria, Cabo, 2ª Companhia de Infantaria 6

João José da Fonseca, Soldado, ?ª Companhia de Infantaria 13

António Freire, Soldado, 2ª Companhia de Infantaria 14


Campo de Prisioneiros de Güstrow

Para os alemães Güstrow era um Campo de Prisioneiros para Praças.

Em 20 de Agosto de 1918 estavam internados neste Campo 45 praças.

Abel Martins Teixeira, 1º Cabo nº 119 ( Corpo da Polícia de Macau )

Zacarias Ribeiro Almeida, Soldado

Eduardo Manuel, Soldado

Porfírio de Paiva, Sargento-ajudante

Augusto da Silva Martins, Sargento

João Cardoso de Oliveira, Sargento

José Maria Marques, Cabo


Campo de Prisioneiros de Schneidemühl

Para os alemães Schneidemühl era um Campo de Prisioneiros para Praças.Estava localizado na zona oriental da Alemanha, actualmente Polónia.

Inicialmente recebeu prisioneiros russos, mas mais tarde e principalmente depois do armistício russo 1917, passou a internar prisioneiros de todas as nações aliadas, o que incluiu portugueses

Soldado português no Campo de Prisioneiros de Merseburg 1918, junto a outros de outras nacionalidades (segundo a contar da direita).

O soldado de Infantaria, João Ferreira Neves, tinha 27 anos (1918) quando foi cativo no campo de prisioneiros de Merseburg. Era natural do lugar de Cagido, concelho de Santa Comba Dão, Distrito de Viseu e era alfabetizado. Foi capturado a 9 de Abril de 1918, em La Lys foi internado em Merseburg, com cerca de outros 2.000 soldados portugueses capturados na mesma data.


Nos arquivos da RTP é possível ouvir a voz deste soldado a cantar duas quadras alusivas ao seu cativeiro. Letra:


As grades desta prisão,

Lá de fora metem medo.


Que fará quem está cá dentro,


A cumprir o seu degredo.




As cordas da minha guitarra


São de ouro acastanhado,


São cabelos que eu roubei


Das tranças da minha amada.



A gravação foi obtida durante os estudos antropológicos da comissão científica alemã, Königlich Preussische Phonographische Kommission, criada em Outubro de 1915, que durou até 1918.


Os cientistas alemães, etnólogos, linguistas e musicólogos,  aproveitava a oportunidade de ter milhares de homens de outras nacionalidades à sua disposição para proceder a um estudo fonético. Regstaram os modos de falar e de cantar de vários povos estrangeiros, alguns deles de países distantes e algo exóticos para os padrões da época. Registaram mais de 250 línguas e dialectos. Hoje é possível ter acesso a gravações efectuadas pela comissão, encontrando-se um espolio de 1.650 discos, guardados no  Berliner Lautarchiv, uma instituição ligada à Humboldt Universität, de Berlim. A história do arquivo encontra-se resumida num artigo de Jürgen Mahrenholz, que a pedido da RTP procurou os registos de gravações feitas com prisioneiros portugueses.


Fonte: RTP

http://www.rtp.pt/noticias/portugal-na-1-grande-guerra/voz-de-prisioneiro-portugues-na-primeira-guerra-mundial-foi-gravada-no-cativeiro_v740609


Fonte: AKG-Images, AKG121349, Museum Sammlung Archiv, Berlin

Lautarchiv -  Berlim

Agostinho Martins - PK1469 (1, 2 e 3)

João Neves - PK1465 (1, 2 e 3)

Ilustração Portuguesa, Série II, n.º 644, 24 de Junho de 1918, p.482

Ilustração Portuguesa, Série II, n.º 644, 24 de Junho de 1918, p.481

A Grande Fuga

Os Prisioneiros, o Trabalho e a Propaganda

Na propaganda portuguesa é apresentado o tratamento dado aos prisioneiros de guerra alemães como muito cuidado e contrastante com o tratamento que os alemães davam aos prisioneiros aliados. É posta a tónica que os prisioneiros aliados eram forçados a trabalhar, sob um terror constante, em trabalhos muito diferentes do que faziam na sua vida civil e para os quais não estavam adaptados. reforça ainda a escassez de alimentos.


Em contrapartida indica que, em França, os prisioneiros alemães eram seleccionados de acordo com as suas aptidões, de acordo com as respectivas profissões, evitando tanto quanto possível a depreciação moral dos prisioneiros. Muitos eram enviados de comboio para a retaguarda para trabalhar na agricultura (Ilustração Portuguesa, n.659).


O Impacto Social

Para avaliar a repercussão sociedade civil e nas famílias dos prisioneiros de guerra, há que tomar o censo de 1911 que indicava a existência de 1.411.327 famílias em Portugal metropolitano, de onde provinha a quase globalidade dos militares enviados no Corpo Expedicionário para França.


Tomando como referência os números apresentados por Portugal na Conferência de Paz de Paris de 1919, é indicado a mobilização de 108.100 militares, 35.623 perdas e 6.000 prisioneiros de guerra, o que de acordo Nuno Teixeira representa representou 1 prisioneiro em cada 182 famílias e um morto ou ferido em cada 13 famílias (Teixeira, 1992:103).


Dada a inexistência de números oficiais para o total de baixas, as várias de fontes de referência agregam os números de forma variada, pelo que na nossa análise, e porque a incidência é sobre os prisioneiros, os números relativos a  desaparecidos são incluídos nos mortos em combate. Assim utilizámos as seguintes critérios:


Mortos em Combate - incluem os soldados que morreram em combate, enquanto prisioneiros, de feridas e desaparecidos;


Prisioneiros - incluem os soldados identificados e aprisionados pelo inimigo e que fora repatriados no final do conflito;


Feridos - incluem os feridos e gaseados em combate e os doentes que ficaram incapazes para o serviço militar ou morreram em consequência dos ferimentos ou doença, excluindo especificamente os mortos pela gripe pneumónica, e;


Pneumónica -  incluem os mortos directamente derivados da gripe.

Fica, então, generalizada a definição de Mobilizados - todos os soldados que integraram as forças militares e de Baixas - todos os mortos, prisioneiros, feridos e pneumónica.


No entanto, o relatório britânico produzido pelo British War Office apresentou 7.022 mortos contabilizados até 31 de Dezembro de 1919, repartindo 1.689 em França e 5.333 em África. É, ainda, considerado adicionalmente a existência de  12.318 desaparecidos e prisioneiros incluindo números de África. Ao nível de baixas na população civil é indicado a existência de um aumento de mortes em relação ao nível anterior à guerra de aproximadamente 220.000 ocorrências, repartindo em 82.000 mortes causadas por fome e 138.000 mortos causadas pela gripe pneumónica (World War casualties).


Um outro relatório elaborado pelo War Department, dos Estados Unidos da América, indica um número estimado de 7.222 baixas para os militares portugueses.


Repatriamento

Foi publicado no LusoJornal (on-line), em 27 de Dezembro 2021, um artigo da autoria de António Marrucho intitulado: I Guerra Mundial: Gravação inédita do Soldado do CEP Agostinho Martins.


LusoJornal dá aos seus leitores um presente, aqui vamos divulgar pela primeira vez a voz de um dos dois soldados portugueses, gravada durante a catividade na Alemanha. Trata-se de um documento raro e nunca até hoje explorado. Trata-se da voz do soldado do Corpo Expedicionário Português Agostinho Martins.


Até hoje conhecia-se apenas um documento sonoro com a voz de um soldado português da I Guerra mundial, a voz do soldado João Antunes Neves.


Foi no documentário “Portugueses nas trincheiras” de Sofia Leite e António Louçã, para a RTP1, de novembro de 2008, com a colaboração do falecido Afonso Maia, que pela primeira vez a gravação da voz do soldado João Antunes Neves foi divulgada.

Tanto João Antunes Neves como Agostinho Martins, eram casos relativamente raros no CEP: embora sendo ambos originários de pequenas freguesias do interior de Portugal, os dois tinham estudos e sabiam ler e escrever.


Agostinho Martins nasceu a 8 de maio de 1895 em Barreiros, uma ex-freguesia do concelho de Viseu, tendo sido batizado a 19 do mesmo mês na igreja de Santa Marinha da mesma freguesia. Era filho de Filipe Martins e de Maria de Jesus.


Para a época, Agostinho Martins casou tarde, com quase trinta anos, a 30 de abril de 1925 com Maria Eugénia, da ex-freguesia de Cepões, do mesmo concelho de Viseu. O casal, proprietários, terá vivido toda a vida na freguesia do marido, Barreiros.

Agostinho Martins faleceu a 29 de dezembro de 1974 em Barreiros, precisamente três anos antes da esposa.


Os dados conhecidos através da ficha do CEP não são muito volumosos. Sabemos que fez parte do Batalhão de artilharia 7, terceira bateria, tendo como placa de identidade, soldado n° 4945. Embarcou em Lisboa a 15 de março de 1917 tendo aí regressado a 5 de fevereiro de 1919.


Das observações na ficha do CEP temos simplesmente como indicações: “Nada consta até 28 de fevereiro de 1918, desaparecido em 9 de abril, sendo feito prisioneiro. Presente a 19 de janeiro de 1919”.


Agostinho Martins foi, por conseguinte, feito prisioneiro no primeiro dia da Batalha de La Lys, tendo regressado do campo de prisioneiros em meados de janeiro de 1919.


Em outubro de 1915, uma comissão chamada “Königlich Preussische Phonographische Kommission” foi criada. Já quase no final da guerra, esta comissão gravou as vozes de soldados de diversas origens linguísticas e geográficas. Os quase 1.650 álbuns foram gravados em 1918 em 70 campos de prisioneiros, gravações que estão atualmente sob a custódia do Berliner Lautarchiv, instituição ligada à Humboldt Universität, de Berlim.


A voz do soldado Agostinho Martins foi uma das muitas gravações feitas pela comissão de cientistas alemães – etnólogos, linguistas, musicólogos “Königlich Preussische Phonographische Kommission” – que visitou 70 campos de prisioneiros, para registar as formas de falar e cantar dos vários povos estrangeiros, alguns deles de terras longínquas e algo exótico para os padrões da época, oportunidade única. Nos campos de prisioneiros controlados pela Alemanha, mais de 250 línguas e dialetos eram aí faladas.

Foi no Campo de Merseburg, visitado pela comissão a 8 de agosto de 1918, que as gravações dos dois soldados portugueses foram feitas, entre as centenas de outras.


A gravação da canção de João Antunes tem uma duração de somente 18 segundos. De Agostinho Martins temos três gravações: uma de 22 segundos, outra de 57 e uma terceira de 1 minuto e 15 segundos.


Nestas gravações, Agostinho Martins cita um poema cujas palavras mudam um pouco de uma gravação para outra. Supomos que o poema declamado por Agostinho Martins é da sua própria autoria.


Da escuta das três gravações algumas palavras não nos foram possíveis identificar, contudo compreende-se o fundo do pensamento/malandrice de Agostinho Martins ao falar das meninas, de quem provavelmente tem saudades, começando por: “Estas meninas de agora trazem o diabo a adivinhar”, terminando por: “Elas não podem parar nem sequer um quarto de hora. Se estivessem doentes muito embora, mas não estão para dançar”.


A menina, Maria Eugénia, com quem Agostinho Martins acabou por casar era da aldeia vizinha, tendo o casamento sido dissolvido 49 anos depois por falecimento do ex-soldado.  


Fonte: LusoJornal, Edição On-Line 27 Dezembro 2021

https://lusojornal.com/i-guerra-mundial-a-gravacao-inedita-do-soldado-do-cep-agostinho-martins/?fbclid=IwAR2BlKL2WaZrH1zbEyh7mGaBXnZJb_s_bZQXJ8dKfJo6e_YL4rqTgZMbv5w



Voz do soldado João Neves gravada em 1918, Merseburg

Voz do soldado Agostinho Martins gravada em 1918, Merseburg

Lautarchiv -  Berlim: Agostinho Martins - PK1469 (1)

Lautarchiv -  Berlim: João Neves - PK1465 (2)

Lautarchiv -  Berlim: Agostinho Martins - PK1469 (2)

Lautarchiv -  Berlim: Agostinho Martins - PK1469 (3)