As mulheres cujos filhos estão dados como desaparecidos
na guerra.
Representando as viúvas, de negro,
acompanhando o féretro do soldado morto. Funeral dos Soldados
Desconhecidos, Pintura de 1927, Sousa Lopes
Depois do fim da Grande Guerra
(1914-1918), emergiu em diversos países a ideia de render homenagem aos
soldados cujos corpos não tinham sido identificados. Em França, a
ideia surgiu de Francis Simon e de Maurice Maunoury, como uma renovação
de uma ideia anteriormente apresentada pelo príncipe Joinville depois da
guerra de 1870. A decisão de inumar
os restos
mortais de um soldado não identificado morto no "Campo de Honra", no
decurso da guerra, sob o Arco do Triunfo,
em Paris, foi tomada pelo Parlamento em 1920.
Foram exumados
oito corpos de
soldados desconhecidos de diferentes sectores da frente de batalha, os
quais foram transportados para a cidadela de Verdun. Aí foi feita
a escolha pelo soldado Auguste Thin, soldado da guarda de honra, e filho
de um combatente desaparecido em combate durante a Grande Guerra, no dia
10 de Novembro de 1920, às 15 horas, quando colocou um ramos de flores
sobre um dos oito sarcófagos dos soldados desconhecidos que se
encontravam em câmara ardente na cidadela de Verdun. O sarcófago
escolhido foi no dia seguinte, 11 de Novembro, para o Arco do Triunfo,
onde ficou em câmara ardente até ao dia 28 de Janeiro de 1921, dia em
que foi inumado ao centro do Arco do Triunfo, virado para os Campos
Eliseus. Assim a ideia de uma cerimónia
para sepultar um soldado anónimo que encarnasse todos os não
identificados, partiu dos franceses, seguidos pelos ingleses, italianos, portugueses e
americanos.
Ainda durante o ano de 1921, a
Itália, Portugal, a Bélgica e os Estados Unidos da América tomaram a
decisão de honrar o seu "soldado desconhecido", como outros se seguiram
em 1922, como a Grécia, a Checoslováquia, Jugoslávia e a Polónia.
Todas estas cerimónias foram
protocolarmente muito similares à que foi executada a 10 e 11 de
Novembro de 1920 em França. Partiu da escolha de um corpo anónimo
proveniente o campo de batalha mítico para a nação, em França foi
escolhido "Verdun", o qual foi transferido para a capital, Paris, num
edifício profano e simbólico, em París - place Denfert Rochereau -, para
uma vigília fúnebre, no dia 10 e noite de 10 para 11 de Novembro.
No dia seguinte, 11 de Novembro
de manhã, à imagem de um enterro solene, os mutilados e uma família
fictícia, uma viúva, uma mãe e um órfão, acompanharam o transporte do
soldado desconhecido a som de tiros de canhão. O cortejo fúnebre
terminou no local de repouso do soldado desconhecido, em Paris o Arco do
Triunfo. A lápide tem escrito apenas "Ici
repose un soldat français mort pour la France (1914-1918)"
Em Portugal, a 18 de Março de 1921 o
Governo autorizou a transladação de dois Soldados Desconhecidos, um da
França (Flandres) e outro da África (Moçambique), para o Panteão da
Batalha. Foi, ainda, decidido que a cerimónia seria efectuada no dia 9
de Abril de 1921 e para tal decretou esse dia como feriado nacional. (Diário
da Câmara dos Deputados, 41ª Sessão,18 de Março de 1921,
p. 21)
Ainda em Março de 1921 o Governo
português tratou, através do seu adido militar em Paris, da documentação
necessária para a transladação do Soldado Desconhecido da França para
Portugal. (PTA HM/DIV/1/36/29/11, de 1921/04/05). A 5 de Abril de 1921,
por ordem do Senado da República (Diário do Senado da República,
sessão 34ª, 5 de Abril de 1921, pp. 3-7.) foi aberto um crédito para o
Ministério da Guerra fazer face às despesas das homenagens a serem
prestadas aos Soldados Desconhecidos.
No dia 9 de Abril de 1921 foram conduzidos
em cortejo desde Lisboa a Leiria, e no dia 10 de
Abril de Leiria até
o Mosteiro da Batalha, Templo da Pátria. Os dois
Soldados Desconhecidos, vindos da Flandres e da
África Portuguesa representando os gloriosos
mortos das expedições enviadas aos referidos
teatros de operações e simbolizando o sacrifício
heróico do Povo Português. No momento da chegada
os canhões troaram e o recolhimento foi
profundo. Completou-se a suprema consagração.
A Pátria
tinha uma "Dívida Sagrada" perante aqueles que
tombaram em combate. Com absoluta justiça existe
uma dívida nacional contraída com aqueles que
pela Pátria se imolaram gloriosamente na ara do
sacrifício. É de todos, a todos cumpre
conhecê-la e saldá-la na quota parte do
seu valor. Esquecer qualquer dívida é
degradante, esquecer uma dívida de sangue é
ingratidão levada ao aviltamento.
(13)
O Soldado
Desconhecido Vindo de França
- 6 de Abril de 1921
O Soldado Desconhecido vindo da
Flandres esteve primeiramente em câmara ardente no Quartel do Regimento
francês n.º 129, no Havre.
Embarque do Soldado Desconhecido
em França. Os restos mortais foram posteriormente transportados de
França para Portugal no navio de transporte "Porto", que atracou em
Lisboa no cais de Santos no dia 6 de Abril. Entre o cabo da Roca e o
cais de Santos o "Porto" foi escoltado pelo Contratorpedeiro "NRP
Guadiana". (14)
Câmara ardente do Soldado
Desconhecido Português em França
Chegada do Soldado Desconhecido de França a Lisboa, em 17 de Março, a
bordo do vapor "Porto"
No cais de Santos esperava-o
uma guarda de honra, com coroas e palmas, numa derradeira homenagem. O
féretro do "Soldado Desconhecido" da França saiu do do navio "Porto" transportado à
mão por seis soldados de infantaria. Junto com o "Soldado Desconhecido" da
França regressaram três oficiais mortos em combate a 9 de Abril, o
Capitão Serrão Machado, morto por uma granada, e o Tenente Vidal
Pinheiro e o Alferes Carrazeda de Andrade, todos mortos por gazes tóxicos.
Foram bravos combatentes que no campo de honra tombaram para não mais se
erguerem2
O "Soldado
Desconhecido" da França foi levado para o
Arsenal da Marinha, para a casa da Balança, onde se juntou ao seu camarada de África e fica a
aguardar pelo dia seguinte, data em que os dois soldados seriam transportados para o Palácio do Congresso,
actual edifício do Parlamento em São Bento. À cerimónia estava presente
o Presidente da República António José de Almeida, o Ministro da Guerra
Álvaro de Castro e outros representantes do Governo e do Parlamento. A
Igreja encontrava-se representada ao mais alto nível pelo Bispo de Beja
e Chefe do Corpo de Capelães no front D. José do Patrocínio Dias.
Foram acompanhados pela Banda da Marinha que tocou a "Maria da Fonte" e
por uma salva de 21 tiros dos navios de guerra que se encontravam
fundeados no Tejo. (11)
O Soldado
Desconhecido Vindo de África
- 6 de Abril de 1921
A 30 de Março de
1921, às 5 horas e 45 minutos da tarde, levantou voo um hidroavião da
baía do Funchal
para ir ao encontro do navio de transporte inglês "Briton", que trazia a
urna contendo os restos mortais do Soldado Desconhecido de Moçambique.
Ainda, no dia 30 de
Março de 1921 desembarcaram no cais da Pontinha, na Ilha da Madeira, pouco depois das 8
horas da noite, os despojos mortais
do Soldado Desconhecido, que caíra, dando a vida pela pátria, nas
plagas longínquas da África Oriental (Moçambique),
na luta contra os alemães. A urna contendo os despojos, que tinha vindo
no navio de transporte inglês "Briton", da Union Castle
Mail, passou a noite no Posto de Desinfecção Marítima, sendo conduzida
no dia imediato, pela 1 hora da tarde,
para os Paços do Concelho, onde ficou depositada até o dia 3 de Abril,
data em que embarcou para bordo do
cruzador "República", encarregado de transportá-lo para Lisboa.
Ataúde do
Soldado Desconhecido vindo de Moçambique, Praça Dr.Manuel de Arriaga,
01/04/1921
(Foto Museu de
Fotografia Vicentes/Funchal)
Tanto por
ocasião da vinda da urna para os
Paços do Concelho, onde ficou em câmara ardente, como da retirada dela
para o cais, a fim de embarcar,
formaram-se luzidos e imponentes cortejos, tendo-se juntado no dia 1 de
Abril as autoridades
civis e militares, o corpo consular, alguns oficiais ingleses,
representantes das diferentes escolas e agremiações,
contingentes das forças militares da guarnição do Funchal, etc. etc..
Foram aparatosas
as manifestações que se realizaram
nesta cidade de 1 a 3 de Abril de 1921, para glorificar o modesto
soldado. O General Norton de Matos, Alto Comissário da República em
Angola, que estava de passagem no Funchal, no dia 3 de Abril de 1921, a
bordo do "Moçambique", desembarcou e integrou o cortejo do Soldado
Desconhecido.(ELUCIDÁRIO
MADEIRENSE - VOLUME II, 821)
No dia 6 de Abril chegou a Lisboa o Soldado
Desconhecido de África a bordo do cruzador "República". No
mesmo dia chegou o herói de África, Capitão Sebastião Roby morto em
combate, no navio de transporte "Zaire", que
acompanhou desde o Funchal o cruzador "República". O "Zaire" parou ao largo, tendo o Capitão Roby sido
transportado a bordo da lancha "Voador" até ao Arsenal da Marinha.
Marinheiros transportam para o
Arsenal de Marinha a urna do soldado desconhecido do cruzador NRP
República
O "Soldado Desconhecido" de África
ficou a aguardar no Arsenal da Marinha, na casa da Balança, durante a noite e no dia seguinte,
7 de Abril,
foi
transportado, junto com o seu Irmão para o Palácio do Congresso.
Os Soldados Desconhecidos em Câmara Ardente no Palácio do Congresso - 7 a 9 de Abril
de 1921
A Pátria coroando de louros um
soldado português morto em combate, Grande Guerra 1914-1928.
(Pintura Veloso Salgado, 1923. Museu Militar
de Lisboa)
No dia 7 de Abril os "Soldados
Desconhecidos" foram conduzidos do edifício do Arsenal da Marinha em
cortejo até ao Palácio do Congresso, seguindo o itinerário: Rua do
Arsenal, Rua do Ouro, Rossio, Avenida da Liberdade, Rua Alexandre
Herculano, Praça do Brasil (actualmente Largo do Rato), Rua de são
Bento, Largo das Cortes.(9)
Início do cortejo fúnebre de
transladação dos "Soldado Desconhecidos", Rua do Arsenal, junto à Praça
do Município
Das janelas da Estação do Rossio o
Presidente da República e delegações estrangeiras assistiram ao desfile.
A população de Lisboa
demorou-se junto à Estação do Rossio e do Hotel Avenida-Palace, à
entrada da Praça dos Restauradores, para
glorificar o Marechal Joffre, que escutou as ovações à janela do
Hotel.
Fim do cortejo fúnebre de
transladação dos "Soldado Desconhecidos", chegada das urnas funerárias
ao palácio de São Bento. "O Morto glorioso d'África e do Mar e o bravo
Combatente da Flandres. Foram conduzidos para o átrio do Congresso, onde
ficaram até serem transportados para a Batalha." Vd. Ilustração
Portuguesa, n.º 791, 16.4.1921, p. 244
Chegada dos armões conduzindo os
féretros, a 7 de Abril de 1921, com "o Morto Glorioso de África e do
Mar e o Bravo Combatente da Flandres". Dentro do Palácio do Congresso
foram conduzidos ao átrio, onde ficaram até partirem de Lisboa, no dia 9
de Abril , para o
Mosteiro da Batalha.(10)
Os ataúdes dos
"Soldados Desconhecidos" foram velados pelas forças de mar e de terra.
No dia 8 de Abril de 1921, na sessão do Congresso
foi efectuada uma homenagem aos
Soldados Desconhecidos. (Diário da Câmara dos Deputados,
44ª sessão, 8 de Abril de 1921, pp. 4-49.)
As Comitivas
Estrangeiras
Quando em
1921 Portugal realizou, com extraordinária pompa, a inumação dos seus
soldados desconhecidos, o da Europa e o da África, no Mosteiro da
Batalha, a França enviou-nos como representante o Marechal Joffre, a
Itália o Marechal Diaz e da Grã-bretanha o General Smith Dorien, ao
tempo governador de Gibraltar. Coube ao General Ferreira Martins, então
ainda Coronel, o dever de acompanhar o Marechal Joffre desde que ele
entrou em Portugal pela fronteira da Valência de Alcântara até ao seu
regresso a França4.
A Missão Italiana
Em Valência de Alcântara uma
comissão de oficiais portugueses foram receber a missão italiana e os
oficiais espanhóis que os acompanharam até à fronteira portuguesa. A
passagem da missão italiana por terras de Espanha teve algumas
dificuldades burocráticas para a atravessar, devido à morosidade para a
obtenção das licenças necessárias, por se tratarem de militares armados. A Missão chegou a Lisboa através
da estação do Rossio, onde foram recebidos pela população que os
esperava e os aclamou.
O Generalíssimo Diaz (Marechal) foi
homenageado pelo Presidente da República António José de Almeida e o
Generalíssimo Diaz condecorou as bandeiras portugueses3.
A Missão
Francesa
O povo de Lisboa aguardando a chegada
do marechal Joffre à Estação do Rossio, por ocasião da transladação do
Soldado Desconhecido
O Presidente da República António
José de Almeida condecorou o Marechal Joffre na recepção da Missão
francesa. No Tejo chegou o cruzador francês "Jeanne d'Arc".
A Missão Inglesa
Representada pelo General Smith
Dorrien. No Tejo chegou o cruzador inglês "HMS Cleópatra".
A Missão Americana
Representada pelo Contra-almirante Hughes da esquadra americana.
A delegação chegada a Lisboa pela estação do Rossio. No
Tejo chegou o cruzador americano "USS Olympia".
Delegação dos EUA enviada para
assistir à transladação do Soldado Desconhecido (Estação do Rossio, 9 de
Abril 1921)
Em 1921 o contra-almirante Charles
Frederick Hughes era comandante do 2º Esquadrão de Cruzadores de batalha
da Frota do Atlântico.
A Missão Espanhola
Representada pelo Almirante Pedro
Zofia. No Tejo deu entrada o cruzador espanhol "D. Affonso XIII",
O Cortejo de
Consagração dos Soldados Desconhecidos no dia 9 de Abril de 1921 - Lisboa
Ressurgindo dos
escombros, a Paz trouxe consigo senão a tranquilidade aos que a guerra
dilacerou mais profundamente mais profundamente, pelo menos uma hora de
gratidão a cada povo. Eternamente gloriosos, os que não voltaram como os
sobreviveram prestando homenagem no mesmo culto, em que o Valor os uniu
(Bertha Leite, Abril 1921).
No dia 9 de Abril,
dia comemorativo do heroísmo de Portugal perante o ataque alemão, os
"Soldados Desconhecidos" foram trasladados da câmara ardente em
que se encontravam no edifício do Parlamento para a Basílica da Estrela,
onde se efectuou uma cerimónia solene de exéquias fúnebres.
O
dia 9 de Abril de 1921 foi um dia da
consagração e de união de todos os portugueses.
Os Soldados Desconhecidos a
entrarem na Basílica da Estrela, 9 de Abril de 1921
Assistiram às exéquias fúnebres o
Chefe de Estado, as delegações estrangeiras da Itália, França,
Grã-Bretanha, Estados Unidos e Espanha, e altas dignidade civis e
militares. A missa foi celebrada pelo Cónego Anaquim, pregação pelo
Arcebispo de Évora D.Manuel Mendes da Conceição Santos e a absolvição
pelo Bispo de Beja D.José do Patrocínio dias. Existiu um verdadeiro
esforço de cooperação entre o Ministro da Guerra Álvaro de Castro e o
Bispo de Beja D. José do Patrocínio Dias, para que as homenagens fossem
verdadeiramente patrióticas e dignas dos soldados tombados em combate.(12)
O Presidente da República António
José de Almeida e o Presidente do Governo Bernardino Machado a chegarem
ao Palácio do Congresso.
Terminada a cerimónia religiosa o cortejo seguiu da
Basílica da Estrela para a Calçada da Estrela, Av. Presidente Wilson
(actual D. Carlos I), 24 de Julho, Cais do Sodré, Rua do Arsenal, Rua
Augusta seguindo para a Estação do Rossio, onde embarcaram para
Leiria.
Na maior comoção, o enorme cortejo que acompanhou os gloriosos
despojos dos "Soldados Desconhecidos", atravessou Lisboa por entre uma
multidão, que era compacta e que assim não negou o seu concurso às
derradeiras homenagens aos mortos que simbolizaram a Pátria na guerra.
A alma da Pátria, liberta das mil pequenas contingências da miséria
diária, entrou na História levando consigo os poucos despojos dos Heróis
sem nome.
Junto à fachada principal da Estação do Rossio, decorada com morteiros,
sacos de terra e uma caravela, as missões estrangeiras receberam os
féretros postadas em continência à chegada do cortejo.
De seguida os despojos dos
Soldados Desconhecidos partiram da Estação do Rossio de comboio para Leiria. Foram organizados três comboios
para levar os que quisessem acompanhar e assistir às cerimónias na
Batalha.
O Cortejo de
Consagração dos Soldados Desconhecidos no dia 9 de Abril de 1921 -
Leiria
Terminadas as
soleníssimas exéquias em Lisboa os restos mortais dos Heróis foram
conduzidos de combóio para Leiria. Daqui seguiram em cortejo para o
mosteiro de Nossa Senhora das Vitórias, a Batalha. Foi imponentíssima a jornada da
Batalha, um acontecimento histórico digno de registo.
Partiram de Leiria os ataúdes que
seguiram em cortejo rodeados pelas bandeiras e contingentes das missões
estrangeiras até ao Mosteiro da Batalha.
A
população e a guarda de honra a esperaram a chegada dos
"Soldados Desconhecidos", junto à entrada do Mosteiro.
A
entrada das 90 bandeiras desfraldadas no Mosteiro da Batalha, após a
entrada dos ataúdes dos "Soldados Desconhecidos".
Durante a entrada no Mosteiro da Batalha os canhões
troaram e o recolhimento foi profundo. Completou-se a suprema consagração.
Sala do Capítulo no Mosteiro de Santa Maria Vitória - Batalha,
onde repousam os Soldados Desconhecidos.
As fotos oficiais foram tiradas
por Arnaldo Garcez fotografo
oficial do CEP, que regressou a Portugal em 1921, ainda a tempo de
acompanhar as cerimónias de transladação do
Soldado Desconhecido. Arnaldo Garcez continuou a acompanhar
fotograficamente a actividade do exército, tendo feito ainda parte da Comissão dos Padrões de Guerra.
Repare-se no pormenor do canto
inferior direito da foto, onde se vê que inicialmente, em 1921, a laje
tumular foi colocada paralelamente à parede em que actualmente (2011) se
encontra o "Cristo das Trincheiras", virada para a entrada da sala
capitula.
Em 1958, em preparação para a
recepção do "Cristo das Trincheiras", a laje tumular foi recolocada na
posição perpendicular com a cabeceira virada para a parede, posição que
actualmente mantém.
O Bispo de Leiria, o Marechal Joffre, o
Presidente da República António José de Almeida, o General
Smith Dorrien e outros oficiais estrangeiros no Mosteiro da Batalha, no
Claustro central, junto ao túmulo dos Soldado Desconhecidos da Grande
Guerra.
O abandono em que se
encontravam os túmulos dos Soldados
Desconhecidos na Batalha. 24 de Maio de 1922
Foi ressalvado que quase diariamente aparecia nos jornais
registos sobre o abandono em que se encontrava votado pelos Poderes
Públicos os Soldados Desconhecidos no Monumento da Batalha, hoje
Templo da Pátria. O abandono efectivamente representava uma vergonha para
o País e principalmente para o Exército.
O Parlamento deliberou informar o Ministro da Guerra para
que tomasse medidas para evitar o facto vexatório em que o país se
encontrava, perante esta situação e que era observada pelos estrangeiros
e as delegações de países estrangeiros que vinham visitar a Batalha e
encontravam os Soldados Desconhecidos completamente ao abandono.
Para resolver esta situação foi votada, no Parlamento, uma verba suficiente
para completar de forma condigna a homenagem aos Soldados Desconhecidos, que são o
símbolo da heroicidade da raça lusitana nos campos da Europa, África, no
ar e no mar, durante a Grande Guerra.
Em 1922 existia alguma polémica sobre a
localização do Túmulo dos Soldados Desconhecidos, porque
para muita gente era impossível chegar ao Mosteiro da Batalha, o que contrariava de
alguma forma o culto que deveria existir a esses mortos, uma vez que se
pensava construir um monumento em Lisboa e seria uma boa oportunidade
para os transladar para a Capital. (Diário da Câmara dos Deputados,
51ª sessão, 24 de Maio de 1922, pp. 27-29)
A Inauguração do
Lampadário no dia 9 de Abril de 1924 - Batalha
Foi na presidência de
António José de Almeida que foi efectuada a transladação dos
restos mortais dos nossos soldados, mortos em França e na África,
cerimónia que teve um significativo valor patriótico e desde 9 de Abril
de 1921 o Túmulo do Soldado
Desconhecido no Mosteiro da Batalha passou a ter sempre uma guarda de
honra e uma vela acesa como sinal do respeito perene pelos que caíram no
cumprimento do dever.
A ideia de uma "Chama da Memória" foi
apresentada pelo jornalista Gabriel Boissy, em 1923, em sintonia com a
opinião pública, que pedia mais conforto moral pelos familiares perdidos
na guerra. Foi o Ministro da Guerra André Maginot que acendeu a "Chama
da Memória", a qual já mais se apagou, mesmo durante a ocupação alemã,
na 2ª Guerra Mundial. A "Chama da Memória" foi concebida como uma
cerimónia perpétua.
O monumento ao Soldado Desconhecido
da Sala do Capítulo no Mosteiro de Santa Maria Vitória, na Batalha só
recebeu o Lampadário no dia 7 de Abril de 1924. O Lampadário ou "Chama
da Pátria", para o Túmulo do Soldado Desconhecido, foi uma obra do
mestre Lourenço Chaves de Almeida. A inauguração solene do Lampadário e
o acender da Chama da Pátria deu-se no dia 9 de Abril de 1924, dia em
que se completavam 6 anos da Batalha de La Lys
5. O Lampadário foi criado em ferro forjado, ornamentada com
figuras representando soldados de todos os tempos, e a sua chama sempre
acesa é produzida com uma torcida embebida em azeite. Foi oferecido pela
5ª Divisão Militar, de Coimbra.
Foi também no ano de 1924, antes da
cerimónia de 9 de Abril, que as ossadas foram tumuladas. Na laje da
campa rasa do Soldado Desconhecido estão escritos os seguintes dizeres:
"Portugal eterno nos mares, nos continentes e nas raças, ao seu
Soldado Desconhecido morto pela Pátria".6
Na jornada do 9 de Abril de
1924,
"(...) Precisamente no momento do silêncio, o Sr. Ministro da
Guerra, o Sr. Américo Olavo, acenderá, na Batalha, junto do túmulo dos
Soldados Desconhecidos o «Lampadário da Pátria», devendo fazer uso da
palavra nessa impressionante celebração, o general Sr. Simas Machado,
comandante da 5ª Divisão militar, os representantes oficiais das Ligas
de Combatentes e da Comissão de Padrões e, por último, o Sr. Ministro da
Guerra. (CAMPOS, Mário, "A jornada gloriosa do 9 de Abril", in O Século,
n.º 15 140, de 9 de Abril de 1924, p. 5.)
A Entronização do
Cristo das Trincheiras no dia 9 de Abril de 1958 - Batalha
No sector português da Flandres, que
ficava entre as localidades de Lacouture e Neuve-Chapelle, encontrava-se
um artístico cruzeiro que dominava a paisagem da planície envolvente.
Durante os meses de campanha esse Cristo pregado no seu madeiro ali
esteve à chuva e ao vento, a atrair os olhares dos soldados portugueses.
No dia 9 de Abril de 1918, sobre aquela planície caiu uma tempestade de
fogo de artilharia, durante horas a fio, que a metralhou, a incendiou e
a revolveu. Era a ofensiva da Primavera de 1918 do exército alemão. A
povoação de Neuve-Chapelle quase desapareceu do mapa, de tão
transformada em escombro. A área ficou juncada de cadáveres e entre
estes jaziam 7.500 portugueses da 2ª Divisão do CEP mortos ou
agonizantes. No final da luta apenas o Cristo se mantinha de pé, mas
também mutilado. A batalha decepou-lhe as pernas, o braço direito e uma
bala varou-lhe o peito.
Este Cristo ficou no seu cruzeiro
durante quarenta anos erguido no mesmo local, até que em 1958 o Governo
Português mostrou o desejo possuir aquele Cristo mutilado ao Governo
Francês. Tornara-se um símbolo da Fé e do Patriotismo nacional e passou
a ser conhecido como o "Cristo das Trincheiras".
A imagem chegou a Lisboa de avião, a
4 de Abril de 1958, uma Sexta-feira Santa. Ficou em exposição e
veneração na capela do edifício da Escola do Exército até 8 de Abril,
quando foi conduzida para o Mosteiro da Batalha e colocada, a 9 de Abril à cabeceira
do túmulo do Soldado Desconhecido, na sala do Capítulo.
A imagem foi
acompanhada desde França por uma delegação de portugueses antigo
combatentes da Grande Guerra, que residiam em França, e por uma
delegação de deputados franceses, chefiada pelo Coronel Louis Christians.
As cerimónias foram apoteóticas e milhares de portugueses desfilaram
perante a imagem em Lisboa.
No dia 8 de Abril a imagem foi
transportada num carro militar para a Batalha, sem qualquer cerimonial
especial, e aí ficou exposta na sala do refeitório do mosteiro para no
dia seguinte, 9 de Abril, se efectuar a entrega oficial. No dia 9
de Abril, pelas 11 horas, começaram a concentrar-se junto ao Mosteiro da
Batalha numerosas entidades civis e militares, entre elas os
Embaixadores de Portugal em França e de França em Portugal, os Adidos
Militares da França, da Bélgica e dos Estados Unidos, as altas patentes
portuguesas do Exército, Marinha e da Força Aérea. Ao meio-dia
iniciou-se as cerimónias com a chegada do Coronel Louis Christian
(França) e o Ministro da Defesa de Portugal Coronel Santos Costa. A
guarda de honra foi prestado por um Batalão do Regimento de Infantaria
N.º 7, Leiria. O andor que transportou o "Cristo das Trincheiras" entre
a sala do refeitório e a sala do Capítulo esteve ao cuidado de
representantes da Liga dos Combatentes da Grande Guerra.
O "Cristo das Trincheiras" foi então
deposto sobre um pequeno plinto adamascado à cabeceira do túmulo do
"Soldado Desconhecido". Terminada as orações o Adido Militar Francês,
Coronel Revault d'Allonnes, conferiu aos dois "Soldados Desconhecidos"
duas Cruzes de Guerra, as quais foram depositadas sobre a campa rasa.
A fanfarra do Regimento de Infantaria
n.º 19, Chaves, tocou a silêncio no final da cerimónia, enquanto uma
Bateria de Artilharia do Regimento de Artilharia Ligeira de Leiria,
salvava com 19 tiros. (8)
A Evocação dos Soldados Desconhecidos
Ano de 1932
O Poeta Ruderico, antigo combatente
da Grande Guerra, publicou em 1932, "Hoste Lusitana, Epopeia das Armas
Portuguesas na Flandres", onde publicou um poema dedicado ao Soldado
Desconhecido. O nome Ruderico é o pseudónimo e o seu verdadeira nome
ainda não me é conhecido.
Ao Soldado Desconhecido
Meu bravo camarada: Aqui Te canto
Neste livro de Dor e de Verdade.
Recebe-o como preito sacrossanto
À ignorada e franca Heroicidade.
Ninguém sabe quem És. E no entanto,
Todos Te vêm trazer uma Saudade!
Quem me dera jazer num triste canto
Da Tua campa, humilde e sem vaidade!
Não que Te inveje a glória! Não,
descansa!
Pois que na Grande Guerra achaste a
morte,
Mereces o respeito mais profundo!
O que me pesa e dói, o que me cansa,
É não ter partilhado de igual
sorte...
_ Já que vivo, ando morto pelo mundo!
Ano de 1934
O Poeta Ménici Malheiro publicou em
1934 uma colectânea de poesias político-sociais e amorosas,
correspondente à sua criação entre os anos de 1912 e 1927, intitulada
"Entre Milhafres". Nesta editou um poema inspirado no Soldado
Desconhecido, com uma dedicatória de saudade aos capitães Alberto da
Silva Matos, Alfredo Pereira da Costa e Ambrósio Sampaio.
Ao Soldado Desconhecido
"Duice et decorium est pro patria
mori"
Tombaste, meu Irmão! tombaste
heroicamente
Em holocausto à Pátria augusta e
idolatrada;
Por certo que a pensar naquela pobre
gente
Que deixaste ao partir em lágrimas
banhada!...
Que a Paz seja contigo e a quantos
com nobreza,
No fragor da batalha, em África ou em
França,
Tombaram por amor da terra Portuguesa
Gritando ao seu Pendão um verbo de
Esperança!...
Mostraste claramente ao mundo velho e
novo
Que o sangue de Camões, Cabral, Dias
e Gama,
Jamais se extinguirá das veias deste
Povo,
Tão grande, como herói, sublime
em Glória e Fama!
Morreste p´ra viver perpetuamente em
nós
Que bem-diremos sempre Àqueles que
souberam
Honrar condignamente as cinzas dos
Avós
De que a História nos diz os feitos
que tiveram...7
Ano de
1955
Diário de Lisboa, 15
de Agosto de 1955, n.º 11744
(...) A consagração
dos Soldados Desconhecidos, o de África e o da França, afirmaria
externamente o esforço militar da Nação; torná-lo-ia presente,
consagrava-o. Internamente, refazia a unidade nacional que o tornara
possível. Necessário, porém, revesti-la de prestígio: que as
representações vindas a Portugal fossem de invulgar categoria; a elas
associar a própria Espanha, a vizinha peninsular com quem as relações
nem sempre tinham sido, nesses anos conturbados, amigáveis. Que, na
consagração, toda a Nação colaborasse.
(...) Veio o
Marechal Joffre ; veio o Marechal Diaz; vieram grandes esquadras,
contingentes militares de todos os vencedores; e algumas, como a
italiana de admirável significado histórico. Veio a representação
espanhola. Consagração externa do esforço militar português.
(...) O
Cardeal-patriarca entre o Presidente da República e o presidente do
Ministério, seguia a pé, nas ruas de Lisboa, os dois ataúdes que
continham os restos dos Soldados Desconhecidos – o de África e o da
França – a caminho da Batalha.
(...) Entre as alas
compactas do povo português, as bandeiras militares de todas as nações
aliadas, associadas, ou simplesmente amigas (algumas de renovada
amizade), os contingentes das forças que se bateram e alcançaram a
vitória – era de facto, a consagração da unidade nacional.
Ano de
1976
Poema homenageado pela Liga dos Combatentes, entregue em
cerimónia solene no Mosteiro da Batalha para ser colocado
sobre o Túmulo do Soldado Desconhecido. Poema de Oliveira San-Bento entregue na
“Impressionante cerimónia no
Mosteiro
da Batalha na 55ª Romagem ao Túmulo do
Soldado
Desconhecido”;(Jornal
“Diário dos Açores” – Ponta Delgada – 23 de Abril de 1991,
págs. 1 e 2, sob o título “Impressionante cerimónia no
Mosteiro da Batalha na 55ª Romagem ao Túmulo do Soldado
Desconhecido”;
AO SOLDADO DESCONHECIDO
Sobre o seu ataúde na Batalha.
Já não dormes aqui, - ressuscitaste!
És a Nova Bandeira; és o Troféu,
Às alturas do sol, erguido ao céu,
Para guiar a Raça que salvaste!
O sangue, puro e bom, que derramaste
Lavou a mancha negra do labéu
De medo e de traição, que se escondeu,
Enquanto, heróico e forte, batalhaste!
Águias, descei, descei, andai de rastros…
Iluminai-lhe o ataúde, ó astros,
Vinde beijar-lhe, humildes, a mortalha…
Que este é irmão daqueles que caíram
No chão de Aljubarrota e ressurgiram
Na pedra rendilhada da Batalha!
O soneto “Ao Soldado
Desconhecido” foi publicado pela primeira vez em 1921e não
em “O Clamor das Sombras”. Está hoje gravado em relevo, em
letras metálicas, e depositado no Mosteiro da Batalha, no
respectivo Museu. (Informação prestada por João San-Bento
Pontes, neto do Poeta, em 14/01/2011)