Para cima

Raid Alemão - 14 de Setembro de 1917

Em 14 de Setembro de 1917, pela madrugada os alemães efectuam um Raid com 54 homens sobre o Batalhão de Infantaria 7, de Leiria.


O Alferes Gomes Teixeira ao tomar conhecimento do ataque deu ordens rigorosas aos seus homens para deixarem os alemães progredirem até dentro da trincheira e quando estes lá se encontravam, efectuou um ataque à baioneta e granada causando a morte do oficial alemão e de três outros soldados.


Foram ainda feitos vários prisioneiros, facto que foi altamente apreciado pelo Comando britânico (Martins, 1934a:267).


Bibliografia


Almeida, Humberto de (1919), Memórias dum Expedicionário a França, com a 2ª Brigada d'Infantaria, 1917-1918, Porto, Tipografia Sequeira.


Amaral, Ferreira do (1923), A Batalha do Lys, A Batalha D'Armentières ou o 9 de Abril, Lisboa, Tipografia do Comércio


Martins, Ferreira (1934a), Portugal na Grande Guerra, Vol. I, Lisboa, Empresa Editorial Ática


Martins, Ferreira (1934b), Portugal na Grande Guerra, Vol. II, Lisboa, Empresa Editorial Ática



Madrugada de 14 de Setembro


O Raid a Infantaria 7 - Ao Valente Alferes Teixeira


Este batalhão, que foi mais do que nenhum outro deveras martirizado, praticou um acto duma heroicidade tal, que é a página mais brilhante e gloriosa da 1ª Divisão do C. E. P. em França!


Pena foi que mais tarde, levado por uma alucinação deprimente, por um acto inconsciente, depauperado pela lama moral, mais prejudicial e perniciosa que a lama da terra, se tivesse revoltado, nublando um pouco a sua admirável conduta nas trincheiras da Flandres ...


No entanto eu, que os conheci naquela resplandecente manhã de raid, que os vi titânicos e grandes, que os vi gloriosos e fortes, que os vi admiráveis e épicos atirar num gesto formidável e grandioso os guerreiros saxónios derrotados e esmagados para dentro das suas cavernas, que vi como estrebuchou nas históricas ruinas de Neuve-Chapelle o leão saxónico batido e vencido pelo soldado de Leiria, cansado por seis meses consecutivos de trincheiras, não posso deixar de os saudar e de os relembrar numa saudosa recordação !


Lembro-me bem ...


Os ingleses andavam furiosos por não terem identificações. Havia dias que o boche tinha feito a rendição naquela frente e não se sabia ainda qual a Divisão com que nós tínhamos de haver.

Dias antes, na ânsia de obter prisioneiros, tinha-se determinado um ataque em toda a frente da Divisão. Uma Brigada ainda chegou a atacar ... mas o boche tinha evacuado a primeira linha... fomos obrigados a recuar e sofremos algumas baixas.

Nessa memorável madrugada o inimigo começou a bombardear a frente ocupada pelo Batalhão de Infantaria 7!

Este bombardeamento contínuo e formidável deixava prever um ataque terrível da infantaria.

Com efeito, depois duma barragem infernal e mortífera, depois de pavorosamente reduzidas as trincheiras de Neuve-Chapelle ocupadas por aqueles soldados lusos, o boche saiu das suas linhas, o boche avançou ameaçador aos gritos horríveis de Hoch ! Hoch! e caiu ferozmente sobre os valentes soldados de Infantaria 7, tão cansados e tão experimentados pelas agruras desta guerra de feras! ... O Alferes Gomes Teixeira, uma criança de dezanove anos, estava á frente do pelotão que defendia o ponto atacado.  

O boche atacou-o e envolveu-o! .. .


A luta foi horrível, foi de canibais e ferozmente encarniçada !


Um boche, um latagão, com a cruz de ferro caiu sobre a guarnição duma metralhadora Lewis, arrancou-a das mãos dos soldados, vitorioso saltou o parapeito e fugia com aquele troféu para as sua trincheira! ... Mas o 2º Sargento R... viu tudo .... salta também o parapeito e cai terrível sobre o boche! Atira-lhe uma valente estocada, mata-o e arranca-lhe o que nos pertencia!...

Um capitão alemão salta sobre o 2º Sargento e aperta-o pelas costas! Assim abraçados, debateram- se durante minutos até́ que o capitão cai redondamente, varado por uma bala certeira atirada por um pequeno galucho português.

Feitos destes se esboçaram naquela luta desigual, de maneira que a resistência foi grandiosa de heroicidade e sublime sacrifício ... Aí, queridos soldados da minha Pátria, mostrastes de quanto sois capazes e evidenciastes bem alto que, quando vos saibam aproveitar, vós sois capazes de tocar e alcançar as raias do Impossível !

Quem diria, soldados bem-ditos deste meu Portugal querido, que vós, cansados, extenuados e desprotegidos, havíeis de dar um tal exemplo de heroicidade épica ao vosso camarada “Tommy”, que vos olhava altivo e com superioridade!


O vosso camarada kaki, bem vestido, bem alimentado, com rum a todas as horas e whisky a todos os momentos, com tudo que necessitava, levado para as linhas em camiões, com três pares de meias para evitar o resfriamento dos pés, com amiudados repousos, com munições aos montes . . . não repeliram o boche e deixaram levar prisioneiros! ...


E vós, soldados de Portugal ?!...


Cobertos de lama, com um pão para ... quatro, com um mísero fardamento para todos os serviços, enlameados exteriormente pela execranda lama das trincheiras e interiormente pela injustiça e despreocupação dos que estavam ao abrigo das intempéries e sofrimentos desta guerra única, atiraste-vos valentes e galhardos contra aqueles que vos queriam esmagar e massacrar! E vós vencestes, repelistes as hordas aguerridas da Saxónia, mandastes sete deles para os quartéis generais ingleses que assim obtiveram as ambicionadas identificações, destrocastes as furiosas ondas de assalto dos fortes saxónicos, que deixaram as nossas linhas juncadas de cadáveres!


É certo que nos mataram alguns homens, mas não nos levaram ninguém!...

Quem tal diria? ...

Como vós serieis o nosso orgulho, se não abusassem das vossas forças! ...

Às sete horas, ao entrarmos na Winchester-Trench, passavam, de olhos no chão, sete prisioneiros no meio de tropas portuguesas a caminho da Brigada.

Eles atestavam bem o valor do soldado luso !


(Humberto, 1919: 83-7)