A História do NRP Guadiana
Contratorpedeiro NRP Guadiana
Introdução
Quantos milhares momentos de história haverão ainda por divulgar e que são parte integrante da memória da nossa Marinha de Guerra?
Como uma gota está para o oceano, propomos com este trabalho contribuir para a divulgação da história do contratorpedeiro NRP Guadiana, o que se justifica não só pela comemoração do seu centenário, como também pela importância da sua actuação como navio de escolta durante a Grande Guerra.
Tivemos como objectivo primário a recolha de informação sobre a actividade deste contratorpedeiro, no período compreendido entre Dezembro de 1917 e Novembro de 1918, por forma a reconstruir uma memória baseada numa linha cronológica que permitisse enquadra-lo no espaço e no tempo.
Procuramos o estado do conhecimento deste contratorpedeiro, através de uma pesquisa bibliográfica no catálogo da Biblioteca Nacional de Portugal e no acervo da Biblioteca-Museu República e Resistência onde se encontra o espólio bibliográfico do jornalista Carlos Ferrão, tendo-se firmado a convicção da originalidade do objectivo proposto.
O núcleo principal da investigação baseou-se na informação recolhida junto do Arquivo Central da Marinha e do arquivo fotográfico do Museu de Marinha, o que nos permitiu recriar a esperada linha cronológica, quase contínua, onde se desvendou uma intersecção entre acontecimentos nacionais e a participaçãull ‹o do contratorpedeiro nos mesmos.
Desde o seu lançamento à água, em 1914, passando pelos momentos que antecedem a declaração de guerra alemã, em 1916, até à sua intervenção nas escoltas a navios de transporte de tropas ao serviço do Corpo Expedicionário Português e, ainda, a sua participação no 5 de Dezembro de 1917, no Tejo, foram ocasiões que marcaram as referidas intersecções entre a História da Marinha e a História da República.
Foram-se revelando outros temas ao longo da investigação, que pela força de âmbito do trabalho, pelo tempo disponível para o completar, se demonstraram secundários e foram abandonados. No entanto houve duas questões que sobressaíram e que são ficaram por registar: os problemas mecânicos do contratorpedeiro e o antagonismo entre oficiais do Exército e oficiais da Marinha.
Por último, referimos que o artigo realizado não esgota o tema, mas apenas contribuir para a abertura do mesmo e que poderá ser considerado um ponto de partida para o aprofundamento da história dos contratorpedeiros portugueses e, ainda, para a compreensão do esquema defensivo das linhas de comunicação marítimas durante a Grande Guerra.
Episódios na Grande Guerra
O lançamento à água no Arsenal de Lisboa em 1914
Poucos dias depois de ter sido lançado à água o NRP Douro, começou no Arsenal da Marinha[1], a 22 de Fevereiro de 1913, a construção de um novo contratorpedeiro, o NRP Guadiana.
As denominações de Guadiana[2], registada a 7 de Fevereiro de 1913, tal como anteriormente o de Douro, terão sido certamente influenciadas pelos nomes dados aos destroyers do mesmo projecto produzido na Grã-Bretanha, que ficaram conhecidos pela denominação de Class River[3].
Arsenal da Marinha (Lisboa). Construção do contratorpedeiro NRP Guadiana
(Data: Set/1913, Arquivo Museu de Marinha, Ref: Arquivo Fotográfico: SN/16026)
A estrutura do NRP Guadiana foi produzida na Grã-Bretanha, pela Yarrow, e montada mais tarde em Lisboa a partir de secções anteriormente pré-fabricadas nos estaleiros de Scotstown, no distrito de Glasgow na Escócia[4].
Foi lançado à água 19 meses mais tarde, a 21 de Setembro de 1914, numa cerimónia[5] no Arsenal da Marinha com a presença do Presidente da República Manuel Arriaga, o Presidente do Ministério Bernardino Machado, o ministro da Marinha Augusto Eduardo Neuparth, entre outras personalidades[6].
Chegada do Presidente Manuel Arriaga ao Arsenal da Marinha
(Ilustração Portuguesa, N449, p. 390)
Da cerimónia ficou registado que no momento do lançamento do contratorpedeiro à água, o Presidente da República colocou a mão na quilha do navio para dar ao mesmo o impulso de estilo e que proferiu as seguintes palavras[7]:
“Parte! Oxalá que na tua patriótica missão consigas ampliar as tradições gloriosas dos nossos maiores!”
Vista da carreira, onde são visíveis algumas presas e escoras
(Ilustração Portuguesa, N449, p. 390)
NRP Guadiana a entrar nas águas do Tejo (21/09/1914)
(Data: 21/09/1914, Arquivo Museu de Marinha, Ref: Arquivo Fotográfico: CX74/022539)
Retirada do Presidente da República no final da cerimónia
(Ilustração Portuguesa, N449, p. 390)
Assim, o contratorpedeiro NRP Guadiana foi o segundo navio da classe Douro a entrar ao serviço da Armada. Iniciou a sua actividade em 1915, que manteve até 1936, data em que foi abatido ao efectivo. Esta classe de contratorpedeiros acabou por juntar quatro navios: Douro (1913), Guadiana (1915), Vouga (1920) e Tâmega (1924), tendo sido a interrupção da produção entre 1914 e 1919 em muito causada pelas contingências de guerra, que desviou a capacidade de produção dos estaleiros de Scotstown directamente para o esforço de guerra inglês.
Características do Navio
Deslocamento: 670 tons
Comprimento: 73,15m
Boca: 7,16m
Pontal: 4,27m
Propulsão: 2 turbinas a vapor Parsons com 11.000cv, 3 caldeiras Yarrow e 2 veios
Velocidade máxima: 27 nós (alcançou em testes de esforço 28 nós)[8]
Velocidade cruzeiro: 15 nós
Autonomia: 1.600 milhas (15 nós)
Paióis: 146 toneladas de carvão
A autonomia do contratorpedeiro permitia escoltar navios até aos arquipélagos da Madeira e Açores, ou ainda até ao Porto de Desembarque (PD) do Corpo Expedicionário Português de Brest, em França. Não tinha autonomia para se deslocar directamente até ao arquipélago de Cabo Verde, necessitando para isso de proceder a um reabastecimento na Madeira. Em tempo de guerra a situação tornava-se mais complicada, não só pela redução energética do carvão disponível[9], como pela necessidade de executar rotas mais complexas ou utilizar velocidades variáveis e superiores à de cruzeiro que limitavam a sua autonomia.
O seu armamento era composto por artilharia moderna, torpedos e minas, e a guarniçãull ‹o do NRP Guadiana, em 1915, no seu completo estado de armamento compunha-se de um Estado-maior com cinco oficiais e um Corpo de Marinheiros, a cinco Brigadas, com 79 praças, num total de 83 homens.
Ainda em relação ao comando do navio encontrava-se excepcionalmente previsto que quando o NRP Guadiana viesse a fazer parte de um agrupamento de contratorpedeiros ou contratorpedeiros e torpedeiros, o comandante poderia vir a ser um Capitão-de-fragata, e que nesse caso assumiria também o comando do próprio agrupamento. Esta regra veio a ser publicada mais tarde, na Portaria n.º 7.079, de 16 de Abril de 1931.
Durante a Grande Guerra o Estado-maior do contratorpedeiro teve como comandantes[10], um primeiro-tenente entre 28 de Maio e 21 de Julho de 1916, três capitães-tenentes entre 27Julho de 1915 e 10 de Outubro de 1917, novamente um primeiro-tenente entre 10 de Outubro e 16 de Novembro de 1917, seguido por um capitão-tenente entre 16 de Novembro de 1917 e 9 de Março de 1918, e por último um capitão-de-fragata entre 9 de Março de 1918 e 26 de Janeiro de 1920.
A integração na Divisão Naval de Defesa em 1915
Desde que foi lançado à água, em Setembro de 1914, até que foi incorporado na dotação da Armada, a 10 de Maio de 1915, passou sete meses em acabamentos e testes.
Teve como seu primeiro comandante o 1º Tenente José Eduardo de Carvalho Crato, que assumiu oficialmente o comando do navio a 28 de Maio de 1915, poucos dias depois de terminada a revolução de 14 de Maio[11].
Na madrugada de 14 de Maio, algumas das unidades navais que se encontravam no Tejo, comandadas pelo Capitão-de-fragata Leote do Rego, lançaram o sinal de revolta e deram início a uma insurreição no Arsenal da Marinha, com o apoio do Quartel de Marinheiros de Alcântara. A revolta foi violenta, tendo as tropas fiéis ao Governo de Pimenta de Castro enfrentado fogo dos navios até cerca das quatro horas da tarde, só terminando com a queda do Governo. Finda a violência ficaram no terreno 101 mortos e 913 feridos, desses 250 em estado grave[12].
Durante toda a investigação não encontrámos evidências que colocassem o contratorpedeiro dentro da acção que decorreu nesse dia no Tejo, nem nos dias seguintes quando existiu um receio genuíno de uma possível intervenção espanhola, com a chegada de uma esquadra de quatro navios, o couraçado España, o cruzador "Río de la Plata" e os torpedeiros "N.º3" e "N.º 5" a 18 de Maio[13].
No mês seguinte, e devido ao estado de guerra iminente, foram tomadas mediadas urgentes para que o contratorpedeiro viesse a ser integrado nas forças operacionais, o que aconteceu a 14 de Junho de 1915, sob o comando do 1º Tenente José Eduardo de Carvalho Crato[14], o qual o manteve até 21 de Julho de 1915. Foi então que o NRP Guadiana fez a sua viagem inaugural ao serviço da Armada entre Lisboa e o porto de Leixões.
1º Tenente José Eduardo de Carvalho Crato
(Fonte: Marinha de Guerra Portuguesa e a Maçonaria, p. 181)
A 5 de Julho o NRP Guadiana passou a integrar a Divisão Naval de Defesa e Instrução[15] comandada pelo Capitão-de-fragata Leote de Rego, onde se reuniu aos cruzadores NRP Vasco da Gama, NRP Adamastor e NRP Almirante Reis, à data navio-chefe da Divisão, aos contratorpedeiros NRP Douro e NRP Tejo, torpedeiros NRP N.º1 e NRP N.º 2, submersível NRP Espadarte e ao vapor NRP Lidador.
A 21 de Julho de 1915 o comando do contratorpedeiro foi transferido para o Capitão-tenente Agnelo Portela, o qual o manteve até 19 de Abril de 1916.
Capitão-tenente Agnelo Portela
(Álbum de Oficiais, n.º 17, pág. 32, N.º 5457)
Entre Agosto e Novembro de 1915 foram efectuadas missões de patrulha e de soberania nas águas do Algarve e ainda se deslocou até ao porto de Leixões.
A requisição de navios em Lisboa a 23 de Fevereiro de 1916
A 17 de Fevereiro de 1916, o Governo Português recebeu um pedido do Governo Britânico “em nome da aliança” para a “requisição urgente de todos os barcos inimigos estacionados em portos portugueses”, o que levou a que alguns dias mais tarde, em 23 de Fevereiro, Portugal apreendesse todos os navios mercantes alemães e austríaco-húngaros fundeados em portos nacionais e em particular no Tejo[16].
Nesta operação dirigida pessoalmente pelo Capitão-de-fragata Leote do Rego, comandante da Divisão Naval de Defesa, o NRP Guadiana comandado pelo Capitão-tenente Agnelo Portela, integrou a flotilha composta pelo contratorpedeiro NRP Douro, como navio-chefe, e os torpedeiros N.º 1 e N.º 2., tendo acompanhado de perto o acto de posse dos navios mercantes surtos no Tejo pelos oficiais e praças distribuídos pelos vapores: Albatroz, Cabo da Roca, Cisne, Josefina, Sempre a Andar e Trafaria[17].
Na consequência deste acto a Alemanha declarou formalmente guerra a Portugal a 9 de Março de 1916.
A 15 de Abril de 1916, o Capitão-tenente Agnelo Portela aceitou o convite formulado por Leote do Rego, para ocupar o lugar de Superintendente da Majoria Geral da Armada[18], lugar de Comandante Interino da Divisão Naval, tendo deixado o comando do contratorpedeiro a 19 de Abril.
Capitão-tenente Afonso Júlio Cerqueira
(Álbum de Oficiais, n.º 17, páull ‡g. 77, N.º 5738)
Neste mesmo dia, o Capitão-tenente Afonso Júlio Cerqueira[19] assumiu o comando do NRP Guadiana, o qual o manteve até 10 de Outubro de 1917. O novo comandante até ao final de 1916 retomou genericamente as missões de protecção e vigilância da Barra do Tejo, com patrulhas na zona sul da Barra, com a excepção de uma missão de escolta até ao Algarve em Agosto[20].
As missões de escolta ao serviço do CEP em 1917
Com a necessidade imediata de fazer transportar o Corpo Expedicionário Português (CEP) para França, o NRP Guadiana passou a integrar o corpo de unidades de escolta, em companhia com o contratorpedeiro NRP Douro, aos cruzadores-auxiliares NRP Gil Eannes e NRP Pedro Nunes no transporte de homens e material de guerra para o porto militar de desembarque em Brest, França.
Uma vez em França o contratorpedeiro também se deslocou por vezes a portos ingleses, não só para a acompanhar os nossos cruzadores-auxiliares como para proceder a reabastecimento.
Mesmo inserido no serviço de escolta aos transportes de tropas para França, também efectuou serviço de escolta[21] a navios de transporte de tropas para o teatro de guerra em África, como no caso do comboio aos vapores África e Lima. Nestas missões para sul apenas dava protecção entre a saída da Barra do Tejo até onde deixava de ser provável a localização de submarinos inimigos em caça. Assim, na missão de Abril de 1917, o contratorpedeiro NRP Guadiana após terminar a escolta até 185 milhas a 65º SW da Barra do Tejo, dirigiu-se para Vila Real de Santo António, tendo os vapores África e Lima continuado viagem sozinhos para África.
Apesar do comandante Max Valentiner já ter atacado o Funchal a 3 de Dezembro de 1916, com o U-38, onde afundou a torpedo os navios franceses Surprise e Kangoroo e também o navio inglês Dacia, esse ataque foi uma situação muito excepcional, por causa da autonomia dos submarinos alemães que dificilmente se conseguiam deslocar, ou permanecer na época em zonas a sul das Canárias.
Na sua missão de Maio de 1917 o contratorpedeiro executou um serviço de escolta intensivo e partilhado entre o acompanhamento do NRP Pedro Nunes, que o escoltou de Lisboa até Brest e um apoio próximo ao NRP Gil Eannes que se desloucou entre França e a Inglaterra, e ainda efectuou a escolta deste último no regresso a Lisboa durante as primeiras 270 milhas, ou seja, mais uma vez auxiliando a passagem do cruzador-auxiliar pela zona de maior perigo de ataque de submarinos alemães junto a França. Retornou mais uma vez a França para se ir encontrar com o NRP Pedro Nunes em Brest e posteriormente escolta-lo de regresso a Lisboa, onde ambos chegam a 12 de Junho de 1917.
O encalhe no Cabo Raso a 31 de Julho de 1917
A 31 de Julho de 1917, quando regressava da sua 6ª missão a Brest, o NRP Guadiana encalhou abruptamente a cerca de 100m ao norte do Cabo Raso[22], devido a dificuldades de orientação provocadas pelo intenso nevoeiro que se fazia sentir desde a sua passagem pelas Berlengas.
A zona do Cabo Raso com as suas rochas aguçadas, que se estendem e escondem junto à superfície, ou pelo menos a uma pequena profundidade mar a dentro, até muitos metros para além da margem, tem sido um palco de muitos encalhes ao longo dos anos[23], mesmo depois da instalação da nova lanterna do farol do Forte de São Brás, em Cabo Raso no ano de 1915, que passou a iluminar todo o horizonte marítimo e ainda a emitir um sinal sonoro, de trompete de ar comprimido, com sons de três segundos, de 30 em 30 segundos[24].
O acontecimento teve repercussões nos meios de comunicação, sendo interessante transcrever, em especial o do artigo de O Século, do dia 1 de Agosto de 1917.
NRP Guadiana em 18/07/1917, no Golfo da Biscaia
Tirada a partir do NRP Gil Eannes
(Data: 18/07/1917, Arquivo Museu de Marinha, Ref: Arquivo Fotográfico: SN/16018)
Jornal “O Século” de 1 de Agosto de 1917
Ao Norte de Cabo Raso Encalhe do Contratorpedeiro «Guadiana»[25]
Foi impressionante e comovente a retirada do barco de entre os escolhos onde o nevoeiro o metera. Pelas 3 horas de ontem [31/07/1917], os moradores da vila de Cascais foram acordados pelas repetidas badaladas do sino existente no edifício dos paços do concelho, sino que serve para fazer o necessário alarme quando se trata de incêndio ou de naufrágio e são reclamados socorros.
Logo tudo, pôs em movimento e, constando que havia encalhado, a pouca distância de Cabo Raso, um navio, logo se prepararam o barco salva-vidas, o escaler da alfândega e o material dos bombeiros voluntários, sendo aqueles lançull ados ao mar com as respectivas tripulações e seguindo as viaturas pela estrada nacional, em direcção ao farol.
Este fica a uns 12 quilómetros da vila e nele habita o faroleiro João Alexandre, que, ao dar-se o sinistro, estava junto da buzina de alarme. Sentindo um violento estampido no mar, perto do farol, saiu, e munindo-se de uma lanterna, porque a noite estava muito escura, tratou de prestar os socorros que podia, até à chegada dos barcos referidos e do material dos Bombeiros.
O encalhe dera-se às 2,30 e o barco encalhado foi o contratorpedeiro NRP Guadiana, da nossa marinha de guerra, comandado pelo Capitão-tenente Júlio Afonso Cerqueira, com 104 homens de tripulação [83+21], incluindo os oficiais e os sargentos.
O barco vinha do norte da França, até onde foi comboiar o transporte “Pedro Nunes”, e foi surpreendido no alto mar por violenta tempestade, navegando a meia força e com grandes precauções por causa do nevoeiro cerrado que caíra.
O NRP Guadiana, entrando pelas rochas, uns 200 metros ao norte do farol, a 50 metros da estrada, fez dois rombos, um à proa e outro a meia-nau, sofrendo grandes avarias e ficando cheios de água em dois compartimentos estanques da proa.
O sítio onde se deu o encalhe é conhecido pela Salmoura, subindo logo os oficiais à ponte e pondo-se a tripulação a postos para efectuar a salvação do navio. Com a chegada do salva-vidas de Cascais e do material dos bombeiros, comandados pelo Sr. Teotónio Segurado, foram passadas correntes e espias ao NRP Guadiana, de onde começaram a retirar bagagens, enxergas e instrumentos de bordo, que eram conduzidos para o farol, para onde também foram vários sargentos e marinheiros, a fim de aliviarem o navio encalhado.
Cabo Raso. Encalhe do contratorpedeiro NRP Guadiana
(Data: 29/07/1917, Arquivo Museu de Marinha, Ref: Arquivo Fotográfico: CX495/19915)
Semanário “Ilustração Portuguesa” de 17 de Agosto de 1917
O encalhe do «Guadiana»[26]“…por causa do nevoeiro cerrado, o contratorpedeiro «Guadiana», que vinha do norte de França, até onde foi comboiar o transporte Pero d'Alenquer[27], encalhou a pouca distância do Cabo Raso.“
Em auxílio do contratorpedeiro vieram o rebocador NRP Bérrio, o navio de salvação NRP Patrão Lopes, o lança-minas NRP Vulcano e o navio patrulha N.º 4.
Na figura seguinte são visíveis os caça-minas que chegaram mais tarde, para protecção do contratorpedeiro contra um eventual ataque de submarinos alemães e para auxiliar o na missão de salvamento.
Apesar do rombo à proa e a meia-nau, o contratorpedeiro apenas sofreu um alagamento parcial dado que a guarnição conseguiu fechar as portas estanques a tempo. Apenas o primeiro e segundo compartimentos ficaram alagados, assim como o sexto a meia-nau.
O contratorpedeiro acabou por ser desencalho na preia-mar do dia seguinte, às 12h 10mn, com o auxílio do NRP Bérrio e do NRP Patrão Lopes[28].
O NRP Guadiana encalhado no Cabo da Raso (Salmoura)
(Ilustração Portuguesa, N599, p.134, fotografo Antóull —nio Alves Mesquita)
Até à Barra do Tejo, o NPR Patrão Lopes seguiu sempre atracado ao NRP Guadiana, efectuando o esgotamento da água dos compartimentos, tendo entregado o contratorpedeiro aos rebocadores do Arsenal às 15 horas, e este entrando pouco depois no dique.
Mais tarde no auto de ocorrência[33] lavrado, em 13 de Agosto de 1917, pelo Capitão-de-fragata José Dionísio Carneiro de Sousa e Faro, sobre o encalhe do contratorpedeiro NRP Guadiana, no dia 31 de Julho de 1917 no Cabo Raso, foi concluído que o nevoeiro era bastante denso, a ponto de não se avistar o farol da Berlenga, não obstante o navio ter evidentemente passado dentro do seu alcance, que pelas 5h 30mn e as 6h 30mn verdadeiras (Greenwich), que não havia corrente até àquelas horas e que às 11 horas verdadeiras o comandante deitou rumo de 4º SE da agulha dando resguardo aos Cabos da Roca e Raso.
O contratorpedeiro terá passado pelas 12h 40mn perto do farol do Cabo da Roca, que não era visível mas cujo clarão tinha sido suficiente para o comandante Cerqueira marcar 50º SE da agulha e identificar que ainda se encontrava a norte do paralelo do farol do Cabo da Roca.
Passados 10 minutos, às 12h 50mn, o tempo clareou um pouco e o comandante mandou marcar o rumo por 88º SE da agulha do farol do Cabo da Roca, alterando a ordem pouco depois para se marcar o rumo para 29º SE da agulha do mesmo farol, tendo então acendido os faróis de navegação do navio e reduzindo o andamento de 14 nós para 8 nós aproximadamente.
Nesta altura o comandante julgava ter passado mais perto do Cabo da Roca do que acusava o cruzamento do seu caminho estimado com a sua última marcação de confiança, razão pela qual decidiu reduzir o andamento e deitar para estibordo, ou seja afastar-se da costa. Foi então que ouviu os homens da proa lhe gritarem que se ouvia uma buzina, seria a do Forte de São Brás, e que parecia ver-se rebentação. De imediato o comandante ordenou que se parassem as máquinas e se andasse à ré, mas já não conseguiu evitar que o navio encalhasse.
Também o Capitão-de-fragata José Dionísio Carneiro de Sousa e Faro chegou no final do inquérito à conclusão que a causa do encalhe teria sido indiscutivelmente do nevoeiro intenso e persistente que havia na hora do acidente, e que o comandante se encontrava em cima da ponte e tinha exercido a vigilância indicada em tais casos. Foi ainda considerado que apesar do comandante ter ordenado guinar para estibordo ao passar pelas Berlengas, não tenha sido uma manobra suficiente para aquele tipo de contratorpedeiros e que a manobra efectuada nunca implicaria um desvio final suficiente, razão pela qual o navio tinha descaído para cima da terra mais de 5 milhas entre as Berlengas e o paralelo do Cabo da Roca.
No que se refere à operação de desencalhe, a qual foi presenciada pelo próprio Capitão-de-fragata José Dionísio Carneiro de Sousa e Faro, houve o reconhecimento que o comandante Júlio Cerqueira tinha tomado todas as previdências necessárias para safar o navio e que manteve a mais rigorosa disciplina e espírito levantado na guarnição durante a missão de salvamento.
A tempestade no Golfo da Biscaia a 13 de Novembro de 1917
Em Outubro de 1917, o contratorpedeiro estava de volta, apto a cumprir novas missões. O comando do navio foi então entregue ao 1º Tenente António Ferreira de Campos Navarro, o qual o manteve até 16 de Novembro de 1917.
Nesta operação o NRP Patrão Lopes que estava melhor equipado, com bombas de água, amarou ao costado do NRP Guadiana para esgotar a água que ia entrando ao longo do trajecto até aos diques do Arsenal da Marinha, onde deu entrada na tarde de 2 de Agosto de 1917 para fabrico.
No Arsenal da Marinha as reparações do rombo à proa e meia-nau tiveram início assim que o navio chegou, tendo sido calculado um tempo mínimo de reparações de 15 dias[29].
No relatório[30] do Capitão-tenente Dias Newton, comandante do 3º grupo de patrulhas do Tejo, efectuado no dia 2 de Agosto de 1917, foi indicado que às 18 horas do dia 31 de Julho tinha recebido a notícia do encalhamento do NRP Guadiana, vinda do Forte de São Julião da Barra. Seguiu de imediato para o local com o NRP Bérrio e o NRP Vulcano, tendo dada ordem para o NRP Patrão Lopes suspendesse e também seguisse para o local.
O NRP Bérrio foi o primeiro a chegar ao Cabo Raso, pelas 18h 30mn, onde encontrou o NRP Guadiana encalhado a uns 150m[31] ao norte do farol do Forte de São Brás, numa reentrância da costa formada entre a Ponta da Moura e o Cabo Raso. Quando chegou ao local já se encontravam junto ao NRP Guadiana as seguintes embarcações: o “Macedo e Couto”, a traineira “Guarda-marinha Janeiro” e o salva-vidas de Cascais[32]. Já perto das 19h chegou o NRP Patrão Lopes e sucessivamente foram chegando o NPR Vulcano, o NRP Kionga, o rebocador “Cabo da Roca”, dois caça-minas e o torpedeiro N.º2.
A operação de desencalhe foi instruída pelo comandante Júlio Cerqueira que determinou que apenas se tentaria o desencalhe com a maré-alta, razão pela qual se esperou pelas 12h 10mn para dar início à operação. Na manobra de desencalhe o NRP Bérrio puxou o contratorpedeiro na direcção WNW, o rebocador “Cabo da Roca” aguentou o navio para norte, a fim de se evitar que este descaísse sobre as pedras e o NRP Patrão Lopes encostou-se ao contratorpedeiro para lhe esgotar a água dos compartimentos inundados. Quando o contratorpedeiro começou a balançar, o que indicava que já era possível liberta-lo, foi desencalhado pelos puxões do NRP Bérrio e do rebocador “Cabo da Roca”, tendo ficado liberto às12h 15mn do dia 1 de Agosto.
NRP Guadiana no dique do Arsenal da Marinha em reparações
(Data: Agosto 1917, Arquivo Museu de Marinha, Ref: Arquivo Fotográfico: CX90/003076)
1º Tenente António Ferreira de Campos Navarro
(Álbum de Oficiais, n.º 10, pág. 7, N.º 1762)
A 7ª missão do contratorpedeiro foi efectuada como escolta do NRP Pedro Nunes. Sem problemas entre Lisboa e Brest, foi no regresso entre Brest e Lisboa, quando voltava a escoltar o cruzador-auxiliar NRP Pedro Nunes que foi apanhado por uma forte tempestade no Golfo da Biscaia[34].
O mar encontrava-se tão difícil que levou a que o contratorpedeiro se separasse do NRP Pedro Nunes. Perto da 21h 30mn teve de acender a caldeira n.º 3, única que ficou em serviço depois de perder toda a pressão nas caldeiras n.º 1 e n.º 2, por causa da agitação do mar. A situação apresentou tal gravidade, devido aos danos sofridos nas caldeiras e no convés, que o comandante, 1º Tenente António Navarro, acabou por decidir arribar o navio durante a tempestade no porto de Belle IIe[35].
Depois do contratorpedeiro chegar a Lisboa, o comando foi entregue ao Capitão-tenente João Carlos da Silva Nogueira a 16 de Novembro de 1917, o qual o manteve até 9 de Março de 1918.
Capitão-tenente João Carlos da Silva Nogueira
(Álbum de Oficiais, n.º 15, pág. 29, N.º 4237)
A Revolução de 5 de Dezembro de 1917
A 5 de Dezembro de 1917, um forte núcleo de tropas do Exército e numerosos civis, chefiados pelo Major Sidónio Pais, professor universitário e antigo ministro de Portugal em Berlim, iniciaram uma revolução contra a situação política e económica em que o País se encontrava, com a intenção de proclamar uma República Nova que acabasse com as lutas entre os partidos políticos, entre os cidadãos e ainda se obtivesse a paz externa[36]. A oportunidade de revolta coincidiu com a presença do Presidente do Ministério Afonso Costa, em Paris, e encontrava o então ministro da Guerra, Norton de Matos, como chefe interino da presidência do ministério.
A reacção do Governo do Partido Democrático foi fraca perante o ataque dos revolucionários do Major Sidónio Pais, tendo sido verificado uma maior resistência por parte da Marinha, sob o comando de Leote do Rego, na qual os navios da Armada mantiveram duelos de artilharia com as batarias dos revolucionários localizados em terra.
O Capitão-tenente João Carlos da Silva Nogueira, que tinha sido nomeado poucos dias antes, manteve-se leal a Afonso Costa e em especial ao comandante da Divisão Naval de Defesa, Leote de Rego. As forças de resistência à acção do Major Sidónio Pais centraram o seu comando no Arsenal da Marinha, de onde saíram os marinheiros que participaram na luta em terra, e de onde foram coordenadas as unidades navais NRP Guadiana, NRP Cinco de Outubro, Vasco da Gama e NRP Gil Eannes[37].
Após o anoitecer de 5 de Dezembro e até noite dentro, os holofotes de vários navios da Divisão Naval de Defesa, incluindo os do NRP Guadiana, mantiveram-se apontados sobre a cidade[38]. O sangue-frio e a contenção com que os marinheiros nos navios da Divisão Naval se mantiveram, apesar de estarem a ser bombardeados a partir do Parque Eduardo VII e não rompessem com fogo sobre a cidade, deveu-se ao carisma de Leote do Rego[39].
Esta actuação veio a ser reconhecida pelo Major Sidónio Pais, que devido à lisura do procedimento mantido pela Divisão Naval de Defesa durante os combates, manteve em liberdade o Capitão-tenente Júlio Cerqueira, antigo comandante do NRP Guadiana e então comandante das forças da resistência de Marinha que atacaram as suas posições no Parque Eduardo VII[40].
Navios junto ao Terreiro do Paço a 8/01/1918
(Ilustração Portuguesa, 1918, Nº622, p.56)
Pelas 9 horas da manhã do dia 6 de Dezembro, os navios de guerra começaram a cruzar fogo com a artilharia em terra. O primeiro navio a responder ao fogo de terra foi o aviso NRP Cinco de Outubro, seguido pelo NRP Gil Eannes, que fizeram tiro sobre posições em Campolide. O contratorpedeiro NRP Guadiana, que se encontrava em frente ao Terreiro do Paço, foi o que mais fogo sustentou, tendo mesmo que se fazer ao largo por causa das granadas lhe estarem a cair muito próximo, inclusivamente chegando a ser atingido no casco. Por último o NRP Vasco da Gama acabou também por abrir fogo sobre a cidade.
Às 10h 20mn o cruzador NRP Vasco da Gama, o aviso NRP Cinco de Outubro, o cruzador-auxiliar NRP Gil Eannes e o contratorpedeiro NRP Guadiana, começaram a fazer várias evoluções desde a frente do posto de desinfecção, em Alcântara, até Tejo acima, tendo aparecido à mesma hora soldados do Regimento de Infantaria 16, do Regimento de Artilharia.1, e marinheiros e alunos da Escola de Guerra vindos do Bairro Alto, que desembocaram na Travessa do Poço para o Largo da Trindade e atacaram o Quartel do Carmo[41].
Perto das 15 horas as partes alcançaram um armistício que interrompeu os bombardeamentos, mas não tendo conseguido chegar durante as negociaçõull ›es a um compromisso final o tiroteio recomeçou em ambos os lados[42]. Ainda durante a tarde, o NRP Guadiana bombardeou novamente as posições ocupadas pelo Major Sidónio Pais, na Rotunda, mas teve que manobrar evasivamente entre a posição frente ao Terreiro do Paço, onde se encontrava fundado, e o Seixal por causa do fogo de artilharia vindo de terra. Neste duelo o contratorpedeiro acabou por ser atingido novamente, o que o levou a descer o rio e ir atracar num cais em Alcântara, próximo do Quartel da Marinha.
Os bombardeamentos das unidades navais causaram estragos, principalmente no Rossio, Restauradores, Calçada da Glória, avenidas da Liberdade e António Augusto de Aguiar, Praça do Brasil (hoje largo do Rato) e ruas Alexandre Herculano e S. Filipe Nery. O arco da rua Augusta também foi atingido por uma granada que lhe partiu a cimalha. Em consequência destes bombardeamentos navais não se poderá deixar de referir que se registaram feridos e mortos em terra[43].
No dia seguinte, a 7 de Dezembro, o ministro da Guerra, Norton de Matos, foi recebido em Belém pelo Presidente Bernardino Machado, tendo apresentado então a demissão colectiva do Governo de Afonso Costa. O Presidente ainda tentou um recurso com o Partido Unionista, mas este também se escusou a encontrar uma solução institucional. Perante esta situação o Presidente teve de reconhecer que a revolução do Major Sidónio Pais, de 5 de Dezembro de 1917, tinha triunfado[44].
O Capitão-de-fragata Leote do Rego, ainda como comandante da Divisão Naval de Defesa, desembarcou na doca de Belém e dirigiu-se ao Palácio Presidencial para conferenciar com o Presidente da República, mas este comunicou-lhe que o Governo já se encontrava demissionário e que a vitória dos revolucionários se encontrava consumada. Ao regressar ao NRP Vasco da Gama, Leote do Rego passou primeiro pelo NRP Guadiana, onde comunicou ao comandante do contratorpedeiro Capitão-tenente João Carlos da Silva Nogueira a demissão do Governo e a sua própria decisão em se demitir. Entretanto, Leote do Rego foi exonerado do comando da Divisão Naval de Defesa e do comando do cruzador NRP Vasco da Gama[45] pelo governo revolucionário.
Durante a tarde, as forças do Campo Entrincheirado de Lisboa (CEL) fizeram um ultimato aos navios da Armada: ou estes cessavam fogo, ou a artilharia do Campo Entrincheirado de Lisboa os atacaria. A resposta das unidades navais não foi imediata, o que levou a que ainda houvesse alguma troca de tiros, não tendo o fogo de bordo feito o mínimo prejuízo às forças do Campo Entrincheirado de Lisboa[46].
A 8 de Dezembro a resistência armada tinha terminado[47]. Tudo tinha acabado, Norton de Natos e Leote do Rego embarcaram no cruzador-auxiliar britânico HMS Woodnut que tinha chegado no dia anterior ao Tejo e que os conduziu posteriormente a Gibraltar. O comando da Marinha passou para o Almirante Álvaro Ferreira e o comando do cruzador NRP Vasco da Gama para o Capitão-de-fragata José Carlos da Maia.
A 9 de Dezembro, Machado Santos apresentou-se a Sidónio Pais, chegado de Viseu onde se encontrava preso. Ao cair da noite chegou o momento de solicitar ao Presidente Bernardino Machado a sua renúncia, o que foi feito pelo Capitão Cameira e o Tenente Teófilo Duarte, que se deslocam a Belém para esse efeito a pedido do Major Sidónio Pais.
A 10 de Dezembro, o cruzador-auxiliar HMS Woodnut largou do Tejo com o ex-ministro da Guerra e o ex-comandante da Marinha. Entretanto na cidade do Porto tinham sido efectuadas as prisões de ex-Presidente do Ministério Afonso Costa e do ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Augusto Soares, que tinham chegado de França[48].
Parada da vitória da Rotunda, em 10 de Dezembro de 1917
(Maurício de Oliveira, O Drama de Canto e Castro, 1944, p.52)
Neste mesmo dia Sidónio Pais, acompanhado por Machado Santos e Eduardo Maria Soares, estive presente na parada de vitória, em que as únicas forças em parada que desfilaram desarmadas foram as forças da Marinha. Esta situação veio a ser um dos rastilhos para uma nova revolta no Quartel de Marinha de Alcântara, pouco menos de um mês depois.
A 12 de Dezembro foi publicado em Diário do Governo, assinado por Sidónio Pais, a composição de um novo Governo em que o próprio assumia a Presidência dos Ministérios e os Negócios Estrangeiros, Machado Santos ficava como ministro do Interior e Feliciano da Costa ministro do Trabalho, e ainda oficializava a destituição do ex-Presidente Bernardino Machado.
Estava terminada Revolução de 1917 de Portugal, a revolução marcadamente mais sangrenta da 1ª República, com um saldo de 350 mortos e cerca de 1.000 feridos ao fim de três dias de combates circunscritos à zona de Lisboa.
Esta revolução acabou por colocar a Marinha numa posição militar e politicamente derrotada na frente interna, face à sua posição de poio ao governo deposto, e que implicou momentos difíceis que tiveram início na situação humilhante de serem obrigados a desfilar desarmados na parada de vitória de Sidónio Pais a 10 de Dezembro.
Tratados desde aí com desconfiança pelo Exército, os marinheiros aquartelados em Alcântara acabaram por se revoltar a 7 de Janeiro de 1918, quando lhes foi ordenado que entregassem as munições que se encontravam a mais nesse aquartelamento. Na realidade no Quartel da Marinha de Alcântara encontravam-se armazenadas mais do dobro da dotação de cartuchos da unidade[49].
Amotinados os marinheiros saíram do Quartel de Alcântara e dirigiram-se para a doca de Conde de Óbidos onde conseguiram também amotinar a guarnição do NRP Vasco da Gama, tendo largado o cruzador para o meio do rio Tejo, e encerrado o comandante, o Capitão-de-mar-e-guerra Augusto Eduardo Neuparth, num camarote. É de referir que o seu filho era um dos oficiais de artilharia em serviço nas batarias do Alto do Duque, pertencentes ao Campo Entrincheirado de Lisboa, que foram encarregadas de dominar o navio revoltado. No entanto a intervenção da artilharia colocada no Castelo de São Jorge na tarde de 8 de Janeiro foi suficiente para dominar os revoltosos[50], acabando a guarnição do cruzador por se render[51].
O comandante do NRP Guadiana apesar da sua posição contra as forças de Sidónio Pais, a 5 de Dezembro, não tinha perdido o comando do contratorpedeiro e quando do motim de 7 de Janeiro, ele e a sua guarnição colocaram-se à margem do mesmo. O motim de 7 de Janeiro tratou-se de um motim essencialmente de praças, sem apoio global da Armada, desde logo votado à derrota.
No dia 9 de Janeiro o Capitão-tenente João Carlos da Silva Nogueira recebeu ordens para partir do Tejo em missão com destino a Leixões, onde chegou a 11 de Janeiro. Daí partiu em escolta ao NRP Gil Eannes até Brest, onde permaneceu até 16 de Fevereiro de 1918.
O desfile em Brest de 14 de Fevereiro de 1918
Em Brest, a 14 de Fevereiro, realizou-se no Cours Dayot uma distribuição de medalhas a oficiais, praças e civis que se distinguiram pelos serviços prestados. A distribuição foi presidida pelo Almirante Moreau, Governador da Praça de Brest, perante uma multidão presente.
Houve uma revista às tropas em parada, as quais eram constituídas pelas guarnições portuguesas do NRP Guadiana e do NRP Gil Eannes, contingentes de marinheiros de navios americanos, contingentes de marinheiros de navios-escola franceses e soldados ingleses, americanos e franceses. Nesta cerimónia a representação superior do comando militar português ficou a cargo do comandante do Porto de Desembarque (PD), Barão Cadoro[52].
Almirante Moreau em continência aos marinheiros portugueses
(Ilustração Portuguesa, 1918, N630, p.213)
Na figura observa-se o Almirante francês Moreau a retribuir a continência dos marinheiros portugueses do NRP Guadiana. O desfile foi efectuado perante os oficiais generais presentes e dos oficiais convidados, que no caso português coube a honra ao comandante do contratorpedeiro Capitão-tenente João Carlos da Silva Nogueira e ao comandante do cruzador-auxiliar Capitão-tenente Isaías Dias Newton[53].
Em ambas as figuras vêm-se os marinheiros portugueses em parada, sob o comando do Guarda-marinha Alberto Xavier, que abriu o desfile diante dos oficiais portugueses e estrangeiros presentes[54].
Marinheiros portugueses a desfilar em Brest
(Ilustração Portuguesa, 1918,N.º630,p.213)
Poucos dias depois, a 18 de Fevereiro, o contratorpedeiro zarpou de Brest, tendo chegado a Lisboa a 28 de Fevereiro. A 9 de Março, o comando do navio foi entregue ao Capitão-de-fragata Adriano Teixeira Sarmento Saavedra, que o manteve até 26 de Janeiro de 1920
Capitão-de-fragata Adriano Teixeira Sarmento Saavedra
(Álbum de Oficiais, n.º 9, pág. 21, N.º 1654)
A escolta ao NRP Vasco da Gama de 12 Março de 1918
No relatório, datado de 22 de Março de 1918, elaborado pelo comandante do contratorpedeiro, o Capitão-de-fragata Adriano Teixeira Sarmento Saavedra, são relatados os acontecimentos ligados à missão de 11 de Março, em que o NRP Guadiana foi indigitado para proceder à escolta do cruzador NRP Vasco da Gama até Ponta Delgada.
Para a deslocação do cruzador NRP Vasco da Gama para os Açores contribuiu o problema de confiança existente entre o Governo da República Nova e o pessoal da Armada. O afastamento do cruzador do estuário do Tejo começou com a ordem para o NRP Vasco da Gama se deslocar defronte de Belém, onde se encontrava fundeado, para a baía de Paço de Arcos, o que foi efectuado com o suporte do patrulha N.º 3.
Como a manobra já só teve início durante a noite (23h 07mn, 11/03/1918), acabou por obrigar a fundear o cruzador defronte do Dafundo por não ser possível ver as baleeiras balizadoras das barragens internas. Nesta manobra o patrulha N.º 3 rebocou (8h 30mn, 12/03/1918) também o contratorpedeiro NRP Guadiana para junto do cruzador. Na manhã seguinte (9h 40mn, 13/03/1918) ambos os navios foram fundear na baíull ’a de Paço de Arcos.
Pelas 10 horas (7 horas tempo verdadeiro) o NRP Vasco da Gama suspendeu em direcção à Barra, seguindo-lhe na esteira o NRP Guadiana. Logo após a saída da Barra o contratorpedeiro começou a demonstrar dificuldade em acompanhar a velocidade do cruzador, em muito por causa das condições do mar que lhe provocava um balanço muito violento.
A marcha do NRP Guadiana foi progressivamente diminuindo, enquanto o cruzador aguentava as condições do mar sem dificuldade. O comandante Sarmento Saavedra acabou por comunicar ao NRP Vasco da Gama que tinha de regressar por estar em perigo de começarem a fermentar[55] as caldeiras o que implicaria condições de marcha ainda piores.
Quando o contratorpedeiro chegou à baía de Cascais 15h 35mn (12h 35mn tempo verdadeiro) contabilizavam a perda da manivela do freio do cabrestante, as tampas de dois paióis de carvão, o turco de vante do gasolina e respectiva escora. Sem escolta o cruzador acabou por também regressar, tendo fundeado mais tarde na baía de Cascais. O NRP Guadiana, uma vez que tinha acabado de efectuar um cruzeiro de cerca de 540 milhas tinha necessidade de se reabastecer de carvão e água, o que o levou o comandante a solicitar autorização para entrar a Barra o que lhe foi negado.
Só no dia seguinte, 14 de Março, o comandante do contratorpedeiro obteve autorização para entrar as barragens exterior e interior, e ir fundear defronte a Paço de Arcos onde foi abastecido.
Ficou então prevista nova partida dos dois navios para essa noite (14/03/1918), o que só o puderam fazer após os faróis da Barra acenderem às 22h 20mn (19h 20mn tempo verdadeiro). Foi então que as duas unidades formaram o comboio, com o contratorpedeiro colocado na esteira do cruzador e nesta formação saíram da Barra. É de referir que em ambas as noites em que saíram a Barra os projectores do Forte de São Julião e de Santo Amaro de Oeiras não largaram ambos os navios, dificultando a manobra e ainda expondo desnecessariamente os mesmos aos olhares de um qualquer eventual submarino inimigo que se encontrasse na zona. Neste relatório foi ainda feita uma referência à luminosidade nocturna indicando que se tratavam de noites de lua nova e que quando se encontravam fundeados na baía de Cascais o mesmo procedimento com os holofotes também tinha acontecido. Este procedimento criava nas guarnições um sentimento de revolta por estarem a ser tratados como inimigos da Nação.
Na manhã de 15 de Março os dois navios saíram de novo a Barra em direcção a Ponta Delgada, passando a formação do comboio a ter no NRP Guadiana à frente, navegando em zig-zag. Na madrugada seguinte (16/03/1918) o contratorpedeiro voltou a ter problemas nas caldeiras, tendo fermentado a n.º 2, sendo inclusivamente necessário apagá-la e acender a n.º 3, situação que levou o comandante Sarmento Saavedra a ter de comunicar ao cruzador que era inviável manter-lhe a escolta até ao destino.
Apesar de todos os percalços verificados na missão, na opinião do comandante Sarmento Saavedra o seu contratorpedeiro era um navio muito seguro no mar, mas os defeitos nas caldeiras, que já eram conhecidos e tinham sido expostos em relatórios anteriores, estavam a trazer consigo uma situação demasiado frequente de inoperacionalidade, tanto mais relevante porque a Marinha apenas dispunha do contratorpedeiro NRP Douro com capacidade para igualmente cumprir as missões de escolta aos comboios para França.
Entre outras questões técnicas expressas no relatório é afirmado a existência de um problema com a qualidade do carvão, que em princípio era transversal a todos os depósitos de abastecimento nacionais, cuja péssima qualidade levava a consumos 40% superiores ao previsto, com uma idêntica diminuição da autonomia das unidades navais[56].
Ao meio-dia de 16 de Março fermentou a caldeira n.º 1, a de alta pressão, obrigando o contratorpedeiro a regressar de imediato em direcção a Cascais. O cruzador NRP Vasco da Gama acabou por seguir sozinho para Ponta Delgada sob o comando do Capitão-de-mar-e-guerra Augusto Eduardo Neuparth.
O NRP Guadiana veio a fundear em Cascais às 2h 30mn (17/03/1918). Esperou então pelo do nascer do sol para se se dirigir para Belém, mas ao passar defronte ao Forte de São Julião, foi mandado fundear defronte a Paço de Arcos o que fizeram. Esperaram até à tarde e só às 15h 25mn é que receberam nova ordem para irem amarrar à bóia defronte a Belém e para que entregassem os percutores das peças[57] ao comando do Campo Entrincheirado de Lisboa, o que também o fizeram.
Com este procedimento é remarcado o nível de falta de confiança que o Governo da República Nova depositava nas guarnições da Armada, ao ponto de ameaçar não só porque os vigiavam incessantemente de dia e de noite, como os ameaçavam de abrir fogo sobre estes caso qualquer um tentasse forçar a entrada na Barra, e ainda impunham a inutilização das peças de artilharia enquanto fundeados dentro do perímetro interno da Barra.
A última missão de escolta ao serviço do CEP em Abril de 1918
A 23 de Abril o NRP Guadiana encontrava-se fundeado diante de Caxias. Nesse dia recebeu ordens para se dirigir para a Barra onde suspendeu enquanto aguardou pelo NRP Pedro Nunes, navio que iria escoltar até Brest. Enquanto aguardava a chegada do cruzador-auxiliar foram-lhe entregues os percutores das suas peças de artilharia.
Passaram juntos as baleeiras balizadoras das barragens internas e externas com a ajuda de um piloto a bordo do NRP Guadiana, o qual foi de seguida largado em Cascais. Os dois navios juntaram-se de novo perto do farol da Guia, seguindo o NRP Pedro Nunes pela amorada de estibordo, ou seja entre o NRP Guadiana e terra.
Pelas 22h 25mn já perto do farol das Berlengas, o NRP Pedro Nunes indicou ter uma avaria nas máquinas que o impedia de prosseguir, o que obrigou ambos a regressarem a Cascais, onde fundearam às 2h 10mn, do dia 25 de Abril de 1918. Já em Cascais o NRP Guadiana pediu autorização para entrar no Tejo para abastecimento, o que lhe foi negado, mantendo-se fundado na baía de Cascais.
No dia seguinte (26/04/1918) pelas 18h 15mn o contratorpedeiro voltou a sair, sem ser reabastecido, com o NRP Pedro Nunes numa formação em linha atrás deste. Após passar em frente do farol do Cabo Mondego, a formação começou a navegar em zig-zag, como manobra de prevenção anti-submarina. Quando chegou a noite o NRP Pedro Nunes passou para a frente da formação e pelas 21 horas ambos passaram junto ao Cabo Finisterra.
Já no Golfo da Biscaia levantou-se um temporal, tendo uma vaga causado a avaria do aparelho de sinais luminosos do contratorpedeiro. Pelo rádio foi indicado ao NRP Pedro Nunes que deveria continuar a navegar em zig-zag, ou serpenteado, mas de forma a não perder de vista o contratorpedeiro, no entanto pouco tempo depois o cruzador-auxiliar desapareceu do horizonte do contratorpedeiro, mas foi mantido o contacto rádio.
No dia seguinte, 28 de Abril, como o NRP Pedro Nunes já se encontrava muito para Noroeste do ponto de encontro combinado seguiu sozinho até Brest e o contratorpedeiro continuou a navegar o resto do dia, só tendo avistado terra na manhã do dia seguinte, junto ao farol de La Vieille.
Como o comandante Sarmento Saavedra não sabia se a entrada da zona junto ao farol de Raz de Sein se encontrava minada, decidiu contornar a zona, a oeste do farol de Ar Men. Passou junto ao Farol de Chaussée de Sein, depois pelo farol de Pierres Noires e quando já tinha navegado 5 milhas para dentro do farol de Ar Men, a cerca de 30 milhas sudoeste do porto de Brest, aproximou-se um torpedeiro francês que lhe ordenou que içasse a bordo a bandeira de visita de saúde e indicou que a guarnição se encontrava impedida de comunicar com terra[58].
Rota alternativa do NRP Guadiana em Raz de Sein
Pouco tempo depois de chegados ao porto de Brest veio a bordo o comandante do Porto de Desembarque do CEP, o Barão de Cadoro, que reafirmou que a guarnição do contratorpedeiro tinha que se manter de quarentena durante 14 dias, apesar de trazerem carta de saúde limpa. O mesmo foi indicado ao NRP Pedro Nunes, que só chegou a Brest na noite de 29 de Abril, tendo por isso ficado fundeado no porto exterior e só sido rebocado na manhã seguinte para o porto interior.
Em termo de justificação foi alegado que a razão de tal medida derivava de uma imposição do Governo Francês, sobre o qual pendia a ameaça americana de abandonar o porto de Brest se aparecesse alguma epidemia, o que iria trazer graves constrangimentos por parte do apoio militar prestado pelos americanos à França. É interessante remarcar que a preocupaçãull ‹o se fundamentava na falta de higiene existente no porto de Brest, a qual impossibilitaria debelar a propagação de uma qualquer epidemia (tifo) que aparecesse[59]. No entanto e apesar das guarnições de ambos os navios estarem impedidas de desembarcarem, as mercadorias transportadas foram sendo descarregadas na mesma.
Esta questão irritou o Capitão-de-fragata Sarmento Saavedra que registou no seu relatório o descontentamento que a situação lhe trazia, remarcando que ficava comprovado que o direito e a razão de nada garantiam para que os fracos fossem tratados com justiça, fossem estes indivíduos isolados, ou constituídos em agrupamentos, ou mesmo nações. O ressentimento sobre a situação era grande e chegou a questionar se seria por ser a ajuda portuguesa pequena em relação às necessidades militares da França e que duvidada da capacidade dos franceses para entenderem a enorme dimensão do esforço nacional perante as capacidades militares de Portugal[60].
No dia 4 de Maio foi detectada uma nova avaria no motor de NRP Guadiana que impediu durante todo o dia que o navio se deslocasse até junto do NRP Pedro Nunes. Esta situação gerou outro constrangimento ao comandante Sarmento Saavedra quando obrigou a que este, mais dois outros oficiais de bordo e duas praças, tivessem de se deslocar num bote até ao cruzador-auxiliar e tivessem sido interceptados por um gasolina francês que os questionou sobre a razão de circular no porto interior sem autorização e qual o destino[61].
No dia seguinte, a 5 de Maio, o comandante do NRP Pedro Nunes, o Capitão-de-fragata Alberto Carlos Aprá, apresentou ao Capitão-de-fragata Sarmento Saavedra, um documento facultado pelo comandante interino do Porto de Desembarque do CEP, Barão de Cadoro[62], onde evidenciava que não existia uma decisão da Prefeitura Marítima de Brest para que as guarnições portuguesas fossem sujeitas a um período de quarentena, o que o comandante Sarmento Saavedra aproveitou para redigir um ofício à Prefeitura Marítima onde protestava sobre a situação, mas para o qual recebeu uma resposta que o obrigava a manter a quarentena.
No dia 9 de Maio, o NRP Guadiana requisitou o reabastecimento para partir no dia 11 de volta a Lisboa, a comboiar o NRP Pedro Nunes, estando efectivamente ambos os navios abastecidos, municiados e com os avisos de guerra actualizados a 10 de Maio.
A 11 de Maio, às 14h 30mn (T. M. Legal de Greenwich), o NPR Guadiana e o NRP Pedro Nunes largaram a bóia e dirigiram-se para a baía exterior do porto de Brest, seguindo o contratorpedeiro na frente, e daí para o mar em direcção a Raz de Sein.
Pelas 17h 45mn, pouco tempo após ter passado junto a Raz de Sein, aqueceram as chumaceiras de suporte e de impulso da turbina de baixa pressão de marcha à vante a bombordo (turbina n.º 2). Foi ainda tentado manter a marcha à vante com as outras duas turbinas, procurando aguentar os 11 nós, mas a hélice da turbina avariada movia-se arrastando o veio respectivo e a produzir um ruído característico de tal avaria. A situação tornou-se crítica e o contratorpedeiro passou a navegar a uma velocidade variável, nunca superior a 6 nós, seguindo apenas com a hélice do veio da turbina de estibordo a funcionar (turbina n.º 3). Pela gravidade da avaria, e já sem confiança na máquina, o comandante Sarmento Saavedra tomou a decisão de rumar em direcção a Lorient.
Questionou então o comandante do NRP Pedro Nunes sobre se pretendia continuar viagem ou acompanhar o NRP Guadiana, tendo o comandante do cruzador-auxiliar decidido acompanhar o contratorpedeiro. Já de noite o comandante do NRP Pedro Nunes perguntou se poderia fundear na baía de Audierne e seguir no dia seguinte sozinho de volta para Brest, ao que o comandante do contratorpedeiro anuiu uma vez que não necessitava de auxílio e conseguia seguir caminho sozinho. Assim o NRP Pedro Nunes continuou para norte e desapareceu no horizonte.
Dada a baixa velocidade a que seguiu só pela manhã do dia seguinte, 12 de Maio, é que o NRP Guadiana avistou o norte de Belle Ile. Jáull ‡ perto da ilha de Groix comunicou ao posto semafórico aí localizado que tinham uma avaria a bordo e que necessitavam de reboque, tendo vindo posteriormente dois rebocadores ao seu encontro junto à Barra que o rebocaram para o porto interior de Lorient.
Após entrar no porto de Lorient ficou amarrado numa bóia no meio do porto. Entretanto várias embarcações deslocaram-se até junto do contratorpedeiro a solicitar informação sobre a avaria e qual a sua proveniência, e mais uma vez conhecido que eram portugueses receberam a ordem de hastearem a bandeira de quarentena. Ainda durante essa tarde, os mecânicos da guarnição do contratorpedeiro tentaram reparar a avaria, tendo conseguido desmontar as chumaceiras avariadas e procurado substituir o bronze de baixo, que aparentemente parecia ser a principal razão da avaria, já que era evidente que o desgaste tinha feio desaparecer todo o metal antifricção que o guarnecia.
No dia seguinte, 13 de Maio, vieram a bordo quatro mecânicos franceses para examinar a peça avariada, a qual foi levada a terra para ser novamente coberta com bronze antifricção. Em resultado da vistoria os mecânicos foram ainda da opinião que era necessário verificar se existiam outras causas para a avaria, tendo para tal tirado a tampa da turbina para examinar o seu interior.
Também durante a tarde, pelas 17 horas, chegou a bordo um médico civil, acompanhado por um oficial também francês, que verificou a carta de saúde e o estado de saúde de todos os homens, um por um, tendo no final autorizado o fim da quarentena e a deslocação a terra.
Foi então arreada a bandeira amarela, sinal de quarentena, e de seguida se deslocado o comandante Sarmento Saavedra a terra para apresentar cumprimentos às autoridades marítimas. Uma vez chegados à Prefeitura Marítima de Lorient, estes ficaram admirados com a presença dos portugueses, porque não tinham dado ordem de livre-trânsito, nem recebido instruções de Paris para tal[63].
A Prefeitura Marítima ordenou então que o comandante e todos os outros membros da guarnição em terra regressassem imediatamente para bordo, içassem a bandeira amarela e ficassem incomunicáveis até nova ordem. Para garantir o cumprimento da ordem, ao anoitecer pelas 20 horas, um vapor tripulado por marinheiros do Arsenal de Lorient foi a amarrar perto do NRP Guadiana, onde ficou durante toda a noite a exercer vigilância sobre a guarnição do contratorpedeiro.
No dia 14 de Maio o comandante Sarmento Saavedra solicitou assistência a bordo, tendo o cônsul português aí se deslocado e posteriormente levado o correio da guarnição para terra. Este facto ainda causou maior perplexidade ao comandante, uma vez que as autoridades francesas permitiam a entrada e saída de pessoas no contratorpedeiro, mas não permitiam a saída da guarnição, tornando nula a eficácia da quarentena.
Quando no dia 15 de Maio, foi efectuada nova inspecção médica à guarnição, foi confirmada a inexistência de qualquer foco de tifo, mas acabou por ser deliberado enviar cinco praças para o hospital de Port-Louis, com o diagnóstico de sarna, e uma praça para o hospital de Lorient, com diagnóstico de adenite inguinal. Terminada a quarentena foi ordenado pela Prefeitura Marítima de Lorient, finalmente, o reboque do NRP Guadiana para o Arsenal e amarrado ao pontão n.º.2.
Foi então finalmente possível ao comandante ir cumprimentar oficialmente o Prefeito Marítimo Vice-almirante Aubry, o Major General Contra-almirante La Porte e o director das construções navais o Contra-almirante Pluyette. Nesta ocasião o comandante Sarmento Saavedra não deixou de se referir à questão da quarentena, considerando-a tão incómoda como desmedida, tendo os oficiais franceses justificado a situação pela obrigação de cumprir ordens recebidas directamente do seu Governo.
A 18 de Maio o comandante Sarmento Saavedra, ciente que a sua estada seria prolongada no porto de Lorient, voltou a comunicar a sua posição e a situação do navio ao comandante do Porto de Desembarque do CEP e a solicitar que a correspondência dirigida à guarnição do NRP Guadiana passasse a ser remetida para Lorient. Foi então que recebeu um telegrama cifrado que indicava que por ordem do “comandante” deveria seguir para Lisboa, não existindo qualquer referência a que “comandante” se referia e ainda mais estranho por se tratar de uma ordem emitida via CEP, cuja hierarquia funcional era nula, e não pelo comando naval.
Esta situação trouxe à toma o choque entre o Exército e Marinha, maltratada desde 5 de Dezembro, mas após o esclarecido do equívoco, o “comandante” referido no telegrama seria o “comandante do NRP Pedro Nunes”. Foi efectivamente o comandante Alberto Carlos Aprá a efectuar a solicitação, convencido que o NRP Guadiana se encontrava em condições de navegar e que teria sido este a solicitar ao comandante do Porto de Desembarque do CEP a transmissão aquela ordem[64].
Findo o período de quarentena voltou a ser possível centrar todos os esforços na reparação do navio. Se bem que desde 12 de Maio se se encontrava detectada a causa da avaria, era agora necessário deslocar o contratorpedeiro para uma oficina onde existissem ferramentas apropriadas para a reparação das turbinas, o que não existia no Arsenal de Lorient.
Ficou então por determinar para onde se teria de deslocar o NRP Guadiana, se até ao Arsenal de Saint-Nazaire onde existia uma fábrica de turbinas, ou até os estaleiros de Scotstown, em Glasgow, onde as turbinas tinham sido fabricadas.
Entretanto, no Arsenal de Lorient sob a supervisão do oficial maquinista do contratorpedeiro, foi aberta a turbina de baixa pressão de bombordo (turbina n.º 2) e limpa, tendo sido retirado do fundo da mesma perto de 50Kg de cascão. Nesta reparação o pessoal do Arsenal de Lorient também acabou por retirar a chapa de equilíbrio da turbina que se encontrava solta e por desligar a quartelada do veio da respectiva hélice. Ficou então que o navio em condições de se deslocar pelos próprios meios, mas com especiais cuidados de navegar junto à costa, ou com socorro eficaz, por existir o perigo eminente de acontecer o mesmo à turbina de baixa pressão de estibordo (turbina n.º 3), o que imobilizaria de vez o navio[65].
No relatório do comandante Sarmento Saavedra é referido que o problema da produção de cascão no interior das turbinas já tinha sido reportado anteriormente pelo oficial de máquinas do contratorpedeiro. Os rotores do navio não estavam equilibrados e o seu funcionamento originava um grau de vibração anormal, por consequência um aquecimento derivado do atrito com o aparecimento de um elevado volume de cascão.
Em resultado da inspecção feita à turbina bombordo pelos mecânicos do Arsenal de Lorient foi concluído que houve muita sorte em o rotor não ter excedido a folga entre as palhetas do rotor e do stator[66], o provocaria a inutilização permanente da turbina. Os mecânicos franceses ainda recolheram evidências de situações de temperatura excessiva nos anéis da chumaceira, que teriam sido a causa directa da última avaria. O facto de quando no Arsenal da Marinha, em Lisboa, encontraram uma chapa caída dentro da turbina de bombordo a terem retirado, em vez de a ter reposto no devido lugar, causou o desequilíbrio estrutural verificado na turbina.
Os mecânicos franceses consideraram a decisão imprudente, mesmo tendo em conta a pressão existente para que o navio fosse colocado a navegar o mais rapidamente possível para cumprir as escoltas para França. Essa decisão tinha colocado a guarnição perante um risco desnecessário em cenário de guerra, uma vez que as turbinas não estavam capazes de darem o rendimento máximo em caso de combate.
Para solucionar de vez o problema na turbina de baixa pressão de bombordo era requerido que esta fosse descravada do convés, e face ao historial do navio, os mecânicos franceses indicaram que era de se esperar que mais tarde, ou mais cedo, se verificasse uma idêntica avaria na turbina de baixa pressão de estibordo. Como no Arsenal de Loirent não haviam os aparelhos necessários para equilibrar as turbinas do NRP Guadiana, foi então equacionada a transferência do navio para o Arsenal de Saint-Nazaire, mas havia o problema de conseguir uma vaga nesse estaleiro, porque neste porto se encontrava uma importante base naval americana com um enorme tráfego e porque o pessoal téull Žcnico francês que aí se encontrava e tinha a capacidade de executar este trabalho, se encontrava a trabalhar no porto de Bordeaux e só regressaria no final de Junho.
A 5 de Junho, com a intenção de conseguir encontrar uma alternativa, o comandante Sarmento Saavedra reuniu-se com o Prefeito Marítimo de Lorient, tendo ficado acordado que se iria recorrer alternativamente às instalações do porto de Nantes para repara o contratorpedeiro, mas após contactos com o engenheiro francês da superintendência de Nantes, foi indicado que em Nantes não existia capacidade para reparar as turbinas Parsons[67] que equipavam o NRP Guadiana. No Arsenal de Nantes apenas existia equipamento para reparação de turbinas Curtis e Rateau, pelo que seria necessário mais uma vez aguardar por vaga no estaleiro em Saint-Nazaire.
No dia 8 de Junho, um engenheiro inglês da fábrica das turbinas Parsons que se encontrava em Lorient foi a bordo do contratorpedeiro ver a turbina de bombordo. Este ficou espantado por em Lisboa se ter deixado sair o navio sem a chapa de equilibro da turbina. Em resultado da vistoria o engenheiro inglês da Parsons veio a indicar que as reparações necessárias poderiam ser efectuadas não no Arsenal de Nantes mas sim nos estaleiros de Chantiers de Bretagne, também em Nantes.
Comunicada a situação ao Ministério da Marinha em Portugal e obtida a necessária autorização a 12 de Junho, o comandante Sarmento Saavedra preparou o navio para partir a 15 de Junho para Nantes.
As reparações no arsenal do porto de Nantes em 1918
Zarpou então o contratorpedeiro do porto interior de Lorient, no dia 15 de Junho às 6h 30mn, propulsionado pelos seus próprios meios, levando a bordo dois mecânicos, um do Arsenal de Lorient e outro dos estaleiros de Chantires de Bretagne, e ainda um piloto para conduzir o navio até Quiberon, onde foi tomado outro para seguir para Saint-Nazaire.
O contratorpedeiro seguiu por uma rota a sul das ilhas de Quiberon por causa das minas e por prevenção, não acontecesse outra avaria que o obrigasse a fundear. Chegado a Quiberon o primeiro piloto foi substituído pelo piloto de Saint-Nazaire, e posteriormente acabou por chegar ao porto exterior Saint-Nazaire às 12h 25mn. Aí ficou a aguardar pelo piloto de Nantes até às 14h 5mn, tendo então seguiu pelo rio Loire acima e amarrado defronte a Chantiers de Bretagne às 17h 30mn.
No dia 17 de Junho comandante Sarmento Saavedra foi apresentar cumprimentos ao Contra-almirante De Marguery, comandante superior dos portos do Loire. Quando no dia seguinte foi apresentar cumprimentos ao Comandante da Marinha, verificou uma situação desconfortável quando observou que no exterior do edifício do Comando Naval, existia uma padiola formada por bandeiras dos países aliados, sendo que a bandeira portuguesa era ainda a da monarquia. Durante a ocasião dos cumprimentos teve o cuidado de referenciar a situação, ao que o oficial francês prontamente indicou que se iria efectuar a substituição, afirmando ainda se tratar de um lamentável equívoco. Na verdade só passados mais de dez dias é que a bandeira foi substituída.
Os trabalhos de reparações tiveram início logo a 17 de Junho. O navio foi desarmado e colocadas todas as munições de artilharia e ogivas de combate dos torpedos em terra num depósito para o efeito, onde se mantiveram até ao final dos trabalhos de fabrico. A 22 de Junho foi retirado a cobertura da turbina de alta pressão e no dia 29 de Junho o rotor da turbina foi retirado e desembarcado para os estaleiros em terra, continuando progressivamente a desmontagem das outras turbinas e o descravar das mesmas. Os trabalhos de reparação continuaram até 30 de Setembro, quando foram feitas provas de alto mar com o NRP Guadiana, tendo este saído ao mar nesse dia de manhã e voltado ao fim da tarde para dentro do porto de Nantes. Foi durante esta reparação que o contratorpedeiro recebeu a sua pintura de guerra, que se pode observar na figura seguinte.
Por último não pode deixar de ser referido que durante o longo período em que o NRP Guadiana se encontrou em reparação em Nanes, recebeu o apoio logístico do NRP Celestino Soares[68] que lhe transportou material de guerra e abastecimentos desde o porto de Leixões.
Nestas missões de apoio do caça-minas, que duraram entre 11 Julho e 4 Agosto de 1918, foram efectuadas ao todo 15 viagens[69].
Findo o longo período de reparações, o contratorpedeiro regressou finalmente a Lisboa, onde chegou no dia 10 de Outubro de 1918, encontrando-se no dia do Armistício, 11 de Novembro de 1918, no Tejo amarrado à bóia do Quadro Naval de Guerra (QNG).
Contratorpedeiro NRP Guadiana no Tejo no final da Grande Guerra
(Data: Out/1918, Arquivo Museu de Marinha, Ref: Arquivo Fotográfico: CX74/2415)
Conclusão
A importância do contratorpedeiro NRP Guadiana durante a Grande Guerra foi marcante. Um dos dois únicos navios verdadeiramente modernos[70], ao nível de outros navios da sua classe em forças navais estrangeiras, era capaz de enfrentar de igual, ou em superioridade, qualquer submarino alemão.
Entrou ao serviço como Navio da República Portuguesa (NRP), integrado na Divisão de Defesa Naval e Instrução, a 14 de Junho de 1915, após terminada a crise da Revolução de 14 de Maio de 1915, que trouxe a presença de uma esquadra espanhola no Tejo e mais uma vez demonstrou a fragilidade da força naval nacional.
O seu primeiro momento histórico deu-se a 23 de Fevereiro de 1916, quando integrado na força comandada pelo Capitão-de-fragata Leote do Rego, participou na acção de requisição dos navios alemães surtos no Tejo, tenho no entanto sido a sua maior contribuição para o esforço de guerra, a sua participação na força de escolta aos navios de transporte de tropas para França.
Veio a sofrer, em 1917, um grave acidente quando encalhou junto ao Cabo Raso, causado pelo intenso nevoeiro que pairava ao longo da costa portuguesa desde as Berlengas até Lisboa, tendo voltado ao activo após alguns meses em fabrico no Arsenal da Armada, em Lisboa, retomando o serviço de escolta aos navios de transporte de tropas para França.
Em 5 de Dezembro de 1917 participou activamente na defesa do Governo de Afonso Costa contra as forças revolucionárias do Major Sidónio Pais, abrindo fogo sobre vários locais da cidade de Lisboa, tendo sido a única vez que fez fogo real durante todo o período da Grande Guerra.
Ao fim de três anos de utilização intensiva e sem qualquer período perlongado de manutenção, o contratorpedeiro acabou por ter, em 1918, grandes problemas mecânicos nas turbinas, agravado por uma deficiente reparação de uma avaria anterior na turbina de bombordo, que o obrigou a ficar retido durante quase cinco meses nos estaleiros Chantiers de Bretagne, em Nantes, e de onde partiu a 5 de Outubro de regresso a Lisboa.
Em resultado da investigação foram ainda obtidas evidências que a partir de 5 de Dezembro de 1917 a Marinha passou a ser vista como um inimigo do Governo, sob uma constante desconfiança que inclusivamente colocava desnecessariamente em perigo as unidades navais e as suas guarnições, sobressaindo o rigoroso controlo de entradas e saídas da Barra e a inoperacionalização das peças de fogo dentro da Barra.
Nos relatórios do comandante Sarmento Saavedra sobressai o seu ressentimento perante a atitude do Exército, fosse em Portugal com o Campo Entrincheirado de Lisboa (CEL) ou em França com o Corpo Expedicionário Português (CEP), tendo também ficado impressionantemente visível o seu patriotismo e a defesa dos interesses da Nação.
Por último, não é possível deixar de referir que todos os comandantes que passaram pelo contratorpedeiro NRP Guadiana e as respectivas guarnições cumpriam as missões que lhe foram destinadas, até ao limite das capacidades pessoais e do NRP Guadiana durante a Grande Guerra.
Notas
[1] Oliveira (1971), p.33. Maurício de Oliveira indica que a construção terá iniciado a 22 de Janeiro, o que será certamente um lapso . Na foro pode-se observar a inscrição numa placa exposta na frente do navio onde pode ser lido “Destroyer 22-2-917 Guadiana”.
[2] Ordem da Armada, n.º 3, Série A, 1 de Abril de 1913, por Despacho da Majoria General da Armada, de 7 de Fevereiro de 1913.
[3] De acordo com registo da Royal Navy os destroyers da River Class foram os primeiros destroyers verdadeiramente oceânicos. Quase a totalidade dos 36 navios da River Class construídos na Grã-Bretanha, foram equipados com caldeiras convencionais, excepto três: HMS Eden, HMS Stour e HMS Test. Para além destes apenas os navios portugueses foram equipados com turbinas.
[4] http://www.navypedia.org/ships/portugal/pr_dd_guadina.htm
[5] Ilustração Portuguesa, 1914, N449, p. 390
[6] Guimarãis (2000), p. 109
[7] Ilustração Portuguesa, 1914, p.390
[8] Mendes (1989), p.35-7
[9] Relatório do Comandante Capitão-de-fragata Adriano Teixeira Sarmento Saavedra, de 22 Março 1918, p.2
[10] Mendes (1989), p.36-7
[11] Mendes (1989), p.35
[12] Fraga (2001), p.195. O jornal "A Capital" de 21 Maio de 1915 indica que o custo da ditadura se somou em 101 mortos e 913 feridos.
[13] O torpedeiro "N.º 5" chegou mais tarde porque se reteve em Huelva para abastecimento antes de seguir em direcção a Lisboa. “Jornal ABC de 19 de Maio de 1915”.
[14] 1º Tenente José Eduardo de Carvalho Crato foi promovido a Capitão-tenente em 25/04/1918.
[15] Inso (2006), p.19
[16] A requisição dos navios inimigos não foi simultânea, mas foi contínua conforme foram chegando os telegramas às diversas autoridades portuárias e navais dos locais.
[17] Inso (2006), p.22
[18] Inso (2006), p.31-2
[19] Oliveira (1944), p. 93. “Aqui não se mata ninguém”, frase do comandante Afonso Cerqueira, no alto da Serra do Monsanto, depois da vitória das forças republicanas sobre as forças monárquicas em 1919.
[20] Documentação avulsa 1914-31, Guadiana.
[21] Na época o termo utilizado para escolta, independentemente do número de navios a escoltar era “comboiar”
[22] Oliveira (1971), p.34
[23] Outros encalhes no mesmo local junto ao Cabo Raso: Lord Antrim (29/06/1914), Cuiabá (19/07/1937), Hildebrand (26/09/1957) e Juanita de Chacartegui (26/06/1961).
[24] “Lista de Faróis, sinais sonoros e bóias luminosas no continente e ilhas adjacentes, 1915”, pág. 11.
[25] Fonte: O Século, de 01/08/1917, Lisboa, Biblioteca Nacional E-P-91-Jn-008
[26] Ilustração Portuguesa, N 599, de 13 de Agosto de 1917, pág. 143
[27] O nome Pero d'Alenquer em troca do verdadeiro nome do navio terá sido um erro, ou propositado com a finalidade de ocultar informação sobre a localização do cruzador-auxiliar NRP Pedro Nunes. Na realidade o NRP Guadiana escoltava o NRP Pedro Nunes desde Brest.
[28] Oliveira (1971), p.34
[29] Ilustração Portuguesa, 1917, N599, p.134
[30] Do dia 6 de Agosto de 1917, Manuel dos Santos Fradique, Chefe do Estado-maior Interino, enviou cópia do relatório do Capitão-tenente Dias Newton ao Comandante da Divisão Naval a relatar a ocorrência da operaçãull ‹o de desencalhe do NRP Guadiana.
[31] A distância ao Forte de São Brás varia um pouco de fonte para fonte, variando entre 100 e 200m do Cabo Raso para norte em direcção ao Cabo da Roca.
[32] No relatório o Capitão-tenente Dias Newton refere o serviço prestado pelo salva-vidas de Cascais como relevante para o salvamento do NRP Guadiana.
[33] Relatório do comando da Divisão Naval à Majoria General da Armada, de 13 de Agosto de 1917 (Confidencial)
[34] Mendes (1989), p.39
[35] Inso (2006), p.82
[36] Oliveira (1944), p.49
[37] Freire (2010), p.53
[38] Torres (1917), p.7
[39] Torres (1917), p.80
[40] Torres (1917), p.80
[41] Torres (1917), p.8
[42] Torres (1917), p.10
[43] Mendes (1989), p.10
[44] Oliveira (1944), p.50
[45] Oliveira (1967), p.63
[46] Torres (1917), p.16
[47] Freire (2010), p.53
[48] Oliveira (1944), p.52
[49] Relatório do Contra-almirante Borja de Araújo.
[50] Oliveira (1944), p. 55.
[51] Poucos dias depois, foi publicado o Decreto 3.851, de 29 de Janeiro de 1918, que “deportou” para as colónias 428 praças do Corpo de Marinha, implicados no motim de 7 de Dezembro. Muitos foram incorporados no Batalhão Expedicionário a Moçambique.
[52] Major Carlos de Faria de Milanos (Barão de Cadoro) - Capitão de Cavalaria nº 8. Ascendeu a Capitão em 1911 e fez parte do Corpo Expedicionário Português, com o qual embarcou para França a 28 de Maio de 1917. Neste ano foi promovido a Major e comandou interinamente a Base de Desembarque, em Brest. Foi promovido a Tenente-Coronel, em 1918, exerceu várias comissões na Direcção da Arma de Cavalaria e no Ministério da Guerra. Usou o título de 2.º Barão de Cadoro por Autorização de D. Manuel II de Portugal no exílio.
[53] Ilustração Portuguesa, 1918, N630, p. 213
[54] Ilustração Portuguesa, 1918, Nº630, p.213
[55] Fermentar as caldeiras (Thermal Shock) significa perda de pressão devido a um fenómeno termodinâmico de expansão irregular dos gases sob altas pressões, com variações irregulares de temperatura.
[56] Relatório n.º 2, de 22 de Março de 1918, redigido pelo Capitão-de-fragata Adriano Teixeira Sarmento Saavedra, onde refere o problema do abastecimento e da qualidade do combustível (carvão) e ainda os problemas crónicos da turbina do contratorpedeiro
[57] Esta situação é também referida pelo Capitão-tenente Henrique Monteiro Corrêa da Silva (Paço d'Arcos) nas suas memórias de Guerra no Mar, quando indica que “...a Marinha era ferida de todas as formas. Sucediam-se as ofensas, os vexames, as repressões injustas...” e também refere que “...tinha ordem para entregar os percutores das peças no Arsenal do Exército...” p. 210.
[58] O contratorpedeiro tinha estado anteriormente em Fevereiro em Brest e nessa data não tinha sido colocado qualquer entrava à livre circulação dos marinheiros portugueses em terra.
[59] Martins (1934), p.77. Existe outra referência à questão da epidemia de tifo, ou pelo menos ao medo de uma epidemia de tifo. O General Garcia Rosado, em telegrama datado de 13 de Setembro de 1918, dirigido ao Secretário da Guerra pedia que houvesse uma intervenção do Governo português junto dos aliados para que cessasse o mais breve possível a proibição de envio para França de tropas vindas de Portugal, por medo do tifo.
[60] Relatório de 8 de Junho de 1918, pelo comandante do NRP Guadiana, o Capitão-de-fragata Sarmento Saavedra.
[61] Refira-se que a atitude do comandante terá sido intempestiva dada que existia uma ordem de quarentena em vigor, que impedia a livre circulação das guarnições portuguesas em Brest.
[62] Carlos de Faria de Milanos, Major do Exército em 1917, usou o título de 2.º Barão de Cadoro. Embarcou para França a 28 de Maio de 1917 e comandou interinamente o Porto de Desembarque, do CEP em Brest. Em 1918 foi promovido a Tenente-coronel.
[63] Esta postura por parte das autoridades francesas, relacionada com a imposição de quarentena a todas as guarnições de navios portugueses, mantinha-se porque o Governo Português ainda não tinha cessado a comunicaçãull ‹o de existência de tifo em Portugal.
[64] A quarentena imposta à guarnição NRP Pedro Nunes terá terminado simultaneamente, razão pela qual este navio terá pedido naquela data ao NRP Guadiana para o escoltar de volta a Lisboa.
[65] O sistema de propulsão do NRP Guadiana era composto por três turbinas, uma principal de alta pressão e duas secundárias de baixa pressão, ambas ligadas à de alta pressão que as alimentavam. A turbina de alta pressão por si só não conseguia propulsionar o navio por falta de evacuação de pressão, quando as duas turbinas de baixa pressão se encontrassem avariadas, uma vez que era por estas que se efectuava a evacuação do vapor.
[66] As lâminas fixas de uma turbina são denominadas “stators” e as lâminas móveis de “rotors”. É geometria variável das rotors que proporcionam uma variação de velocidade do navio a uma pressão constante nas turbinas.
[67] As turbinas de modelo Rateau e Curtis aparentam um funcionamento de um moinho de água, uma vez que é a projecção do vapor em alta pressão sobre as lâminas que faz girar o rotor. Estas são normalmente denominadas como turbinas de impulsão. As turbinas de modelo Parsons funcionam como um pião que gira por saída do vapor em alta pressão, em que este choca sobre lâminas fixas. Estas são normalmente denominadas como turbinas de reacção.
[68] ACM - Arquivo Central da Marinha, Núcleo 75, CX51, 6/XI/8/2, Documentação Avulsa "Guadiana"
[69] Marinha(2002), "Setenta e Cinco anos no Mar (1910-1985), Draga-minas, Caça-minas e Lança-minas", 12º Volume, Lisboa, Edição da Comissão Cultural da Marinha", p. 275
[70] O outro navio era o NPR Douro
Bibliografia
Biblioteca Central da Marinha – Arquivo Histórico
Documentação avulsa contratorpedeiro NRP Guadiana 1914-1931, BCM/AH, 1396/A
Relatório do Capitão-de-fragata Sarmento Saavedra, de 01/07/1918, BCM/AH, F75, N51
Relatório do Capitão-de-fragata Sarmento Saavedra, de 08/06/1918, BCM/AH, F75, N51
Relatório do Capitão-de-fragata Sarmento Saavedra, de 22/03/1918, BCM/AH, F75, N51
Relatório do Capitão-tenente Dias Newton, de 06/08/1917, BCM/AH, F320,N107
Relatório do Capitão-tenente Júlio Cerqueira, de 19/03/1917, BCM/AH, F75,51
Relatório do Capitão-tenente Manuel dos Santos Fradique, de 13/08/1917, BCM/AH, F320,N107
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Construção do NRP Guadiana e reparações 1914/22, BCM/AH, Arquivo 6515, XXXVI-10-1
Publicações
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